Entrevista com Bizarra Locomotiva

Após 15 anos de carreira, que diferenças existem entre os Bizarra Locomotiva de agora e o seu passado?
Em quinze anos as coisas evoluíram muito... em termos de tecnologia as máquinas que usamos hoje para compor e criar os sons estão muito mais evoluídas que em 1993 quando começámos esta viagem. Logo, é lógico que isso tenha tido muita influência no som da banda e na maneira como se faz música hoje em dia. Não só para nós mas para a indústria musical em geral. Ao ouvir todas as nossas edições discográficas nota-se perfeitamente essa evolução, que temos vindo a acompanhar, e reflecte-se na nossa maneira de trabalhar, criar e compor. A entrada de novos elementos na banda também teve a sua influência. Já tocamos há uns bons anos juntos e cada vez mais, se nota esse entrosamento. Quinze anos é uma longa viagem que nos mudou muito como pessoas mas não nos levou a mudar o que realmente gostamos que é sermos parte integrante desta locomotiva.


Porque tão grande hiato (5 anos) entre Ódio e Álbum Negro?
Foi apenas uma questão burocrática de mudança de editora e management, isto porque já tinhamos o Álbum Negro pronto acerca de dois anos, o que resultou neste gap tão grande entre edições. Mas acabou por ser benéfico pois deu-nos mais tempo para trabalhar no novo disco.


Vocês continuam a exprimir-se em português, o que é raro em Portugal. Há algum motivo especial?
É a nossa língua mãe e foi assim que nos começámos a exprimir musicalmente e a escrever como Bizarra Locomotiva. Mais tarde houve uma tentativa, por parte da nossa editora na altura, de explorar o mercado internacional e editámos algumas músicas em inglês no nosso segundo disco, Mas não nos sentimos bem nesse registo e depressa voltámos a escrever em Português. Existem poucas bandas a fazê-lo por cá sim. Talvez porque a língua Portuguesa seja muito rica gramaticalmente e foneticamente difícil de musicar e cantar, uma vez que temos as vogais muito fechadas. Mas na sonoridade da Bizarra Locomotiva acaba por soar bem e estamos confortáveis com isso.


Este álbum marca a estreia para a Raging Planet. Como chegaram até eles e como se tem sentido no seio da vossa nova família?
Já conhecia-mos a Raging Planet de longa data e já tinhamos tido vários contactos, pois fizémos inclusivamente em 2005 uma remistura de um tema para os nossos agora colegas de editora F.E.V.E.R.. Foi uma das várias hipóteses que considerámos e que acabámos por nos vincular.


Este é, realmente, o vosso momento mais negro em termos de emoções e sentimentos, de tal forma que a densidade do álbum fosse tão… negra?
Digamos que esse é um sentimento generalizado por todo o planeta, basta olharmos à nossa volta...não se passa só connosco... O sistema em que vivemos está completamente falido, seja a nível social, seja a nível ambiental, seja a nível económico... e não se avizinham boas perspectivas futuras... Estamos a passar por tempos difíceis e o que escrevemos para este disco pode reflectir isso mesmo. Mas o conceito do Álbum Negro foi inspirado num antigo livro da idade média chamado Hypnerotomachia Poliphili que explorou a fase hipnagógica do sono que todos temos, que conta algumas histórias mais carnais com os seus personagens e ilustrando-as com iluminuras da época, remontando aos tempos da santa inquisição e das magníficas pinturas de Bosch e em que essa fase hipnagógica do sono acabou por se tornar por acaso no processo criativo de alguns dos temas do Álbum Negro. Foi assim que alguns deles surgiram e por fim resultaram no conceito geral do disco, liricamente, musicalmente e graficamente. Podendo dizer assim que se trata de um disco conceptual e não querendo ser interventivos em qualquer movimento, religião ou credo, mas em termos líricos, estamos conscientes que são os nossos mais densos e bem conseguidos textos até á data.


De que forma se processou o contacto com Fernando Ribeiro?
O Fernando Ribeiro já é nosso amigo e viajante da locomotiva de longa data. Tem direito a bilhete inexpirável e ao camarote presidencial no nosso vagão de passageiros. Pertencemos à mesma geração de músicos que surgiram por cá... e a empatia já era comum... surgiu esta oportunidade de uma participação dele no nosso novo registo aquando esteve em cena a Ópera Extravagante (Produção do grupo de teatro O Bando) com o Rui Sidónio e o Fernando, e ficou essa ideia. Mais tarde quando estivemos a misturar o Álbum Negro o Fernando escolheu participar no tema O Anjo Exilado que achámos perfeito para o seu registo vocal assim como a temática da letra. Também já houve algumas participações de sua parte ao vivo nas estações da Bizarra Locomotiva e que resultaram bastante bem também.


Como tem sido as reacções de imprensa e fãs a respeito do Álbum Negro?
Têm sido óptimas. Isso reflectiu-se na festa de lançamento do novo disco. A sala esgotou por completo chegando a ficar muitas pessoas de fora que não conseguiram entrar e a reacção foi excelente, mesmo!. Foram vendidos cerca de 300 Álbuns Negros nesse dia, o que é mesmo muito bom sinal. Estamos ainda a promover o novo trabalho e esperamos ter muitas estações pela frente nesta viagem.


O que está a ser preparado em termos de espectáculos ao vivo?
Vamos tentar representar o Álbum Negro ao vivo praticamente todo, indo alternando alguns temas de estação para estação pois já temos 9 discos e temos de repartir os set lists um pouco por todo o universo da Bizarra Locomotiva. Os novos temas foram compostos para isso mesmo. Este novo registo é perfeitamente executável na íntegra ao vivo. E pode-se esperar como sempre a nossa entrega total de corpo e alma quando subimos ao palco.

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