Entrevista: Vandroya

Depois de One os Vandroya regressam aos discos com Beyond The Human Mind. Passaram quatro anos, a banda manteve o mesmo line-up, consolidou a sua consistência, ganhou estabilidade e maturidade e arriscou sair da sua zona de conforto. Por isso o novo disco é um passo em frente no trajeto que a banda brasileira vinha desenvolvendo. A simpática Daísa Munhoz fez-nos uma visita guiada pelo trajeto da banda entre álbuns e por toda a envolvente lirica, criativa e musical desta nova proposta.

Olá Daísa, tudo bem? A última vez que conversamos foi há quatro anos a respeito de One. Pergunto-te como passou o tempo pelos Vandroya? Com o que estiveram ocupados?
Olá, Pedro. É um prazer falar contigo novamente. Trabalhamos bastante da divulgação de nosso primeiro disco e fizemos alguns bons shows por aqui. Depois disso, fizemos uma pausa para dar andamento a projetos pessoais antes de começarmos de facto a trabalhar no Beyond the Human Mind

Foram quatro anos desde One e doze anos para o EP Within Shadows. Porque demoram sempre tanto tempo entre lançamentos?
Quanto ao EP, o tempo justifica-se pelo nosso histórico. Quando montamos a banda, não tínhamos nenhuma intenção de compor (nem sabíamos que tínhamos essa capacidade). Éramos somente uma banda de amigos que se juntava para tocar alguns covers. Com o tempo, fomos ganhando nome e a vontade de fazer música apareceu naturalmente. Então, juntamos dinheiro e conseguimos gravar o EP Within Shadows. Ficamos extremamente animados, pois o EP foi muito divulgado aqui no Brasil, o que nos deixou bastante surpresos. Porém, nessa época, a banda passou por alguns problemas e tivemos muita mudança no nosso lineup, e cada vez que um integrante sai é como começar do zero. A Vandroya passou por inúmeros recomeços e isso desgasta bastante. Foi então que decidimos dar um tempo na banda e engavetar as nossas composições para quem sabe, um dia, voltarmos com mais força e gravarmos o nosso disco. Essa volta aconteceu no início de 2012 e no final de 2013 conseguimos lançar nosso tão sonhado disco. De lá para cá, só precisávamos manter aquilo que havíamos conquistado, e por isso não tivemos pressa para poro  nosso segundo disco no mercado. Fizemos tudo com calma de modo a não dar espaço para erros dos quais nos arrependeríamos depois.

Suponho que tiveram bastantes oportunidades de tocar ao vivo. Houve assim algum momento especial que recordem com especial carinho ou interesse?
Sempre que tocamos e estamos juntos na estrada temos grandes momentos. Em todas as ocasiões, tivemos momentos especiais e receções calorosas do público que são únicas em cada lugar em que tocamos. Mas houve um espetáculo na cidade de Jaú que foi especialmente emocionante ouvir todo o público cantando Why Should We Say Goodbye juntamente comigo. Isso não tem preço. O que espero é que possamos tocar cada vez mais, tento oportunidade de mostrar o nosso trabalho ao vivo para um público cada vez maior.

Com tanto tempo entre lançamentos, este novo disco tem alguma música mais antiga ou são todas desta fase de preparação do álbum?
Diferentemente de como aconteceu no One, dessa vez as músicas foram especialmente escritas para este disco. Em One, como disse, muitas das nossas composições estavam engavetadas há anos. 

E tiveram oportunidade de testar algumas destas músicas novas ao vivo? Como foram as reações?
Ainda não, mas já temos alguns bons shows marcados aqui no Brasil para descobrirmos isso. 

Durante este tempo mantiveram o mesmo lineup o que, certamente, vos proporcionou uma estabilidade adicional. De que forma isso se nota neste novo trabalho?
Estás certo. Esta estabilidade foi importante principalmente para que as composições se manifestassem de forma mais natural. Acredito que quando mantemos o mesmo lineup, podemos notar, de forma mais segura, a evolução da sonoridade da banda, já que cada trabalho reflete a evolução individual de cada membro. E foi o que aconteceu com Beyond the Human Mind. Mantivemos a nossa essência, que vem se desenvolvendo desde One, mas ao mesmo tempo, fizemos algumas coisas diferentes, como colocar mais elementos de progressivo nas músicas, algumas temáticas nas letras e em cada instrumento individual. Enfim, acredito que BTHM seja uma evolução de One, e estamos muito felizes com nosso novo trabalho e com a recetividade do público e da comunicação social.

Parece que a vossa tendência progressiva está um pouco mais saliente. Concordam?
Totalmente. Tanto o rock quanto o metal progressivo são grandes influências para nós. Bandas como Dream Theater, Symphony X entre outras são de cabeceira, e é natural que isso se reflita cada vez mais no nosso trabalho.

De qualquer forma, as linhas melódicas de excelência continuam a marcar forte presença. Consideram que atingiram o ponto de equilíbrio entre progressivo, virtuosismo, melodia e poder?
O nosso processo de composição costuma seguir esta ordem: primeiramente, Marco desenvolve toda estrutura harmónica da canção e já adiciona alguns arranjos, especialmente os das guitarras. Nessa faze, o resto da banda contribui com os seus arranjos ainda de forma experimental, e dessa forma eles vão lapidando os seus arranjos até chegar ao resultado desejado. Em seguida, Marco entrega-me essas bases e eu trabalho em cima das linhas melódicas. A melodia é muito importante para mim e eu preciso que elas se encaixem perfeitamente no meu timbre de voz, bem como em como eu quero que determinada parte da música soe. Somente com as melodias prontas escrevo as letras, ou adapto para as melodias alguma ideia de letra que já tenha pensado antes. Às vezes, eles já entram em estúdio para gravar as bases e os arranjos mesmo sem melodia e letra estarem prontas. Não é nosso costume pré-produzir os nossos álbuns utilizando gravações “ao vivo” com a música basicamente pronta. Este disco soa muito mais maduro do que o nosso primeiro e isso definitivamente mostra que estamos a evoluir e a conseguir imprimir a nossa personalidade cada vez mais. 

Sendo que One tinha sido tão bem recebido tiveram algum cuidado especial na criação de Beyond The Human Mind? Sentiram algum tipo de pressão quando partiram para este disco ou não?,
Sim, definitivamente. Uma certa pressão, de facto, com uma sensação de estar competindo contigo próprio, entendes? Deixamos as composições fluírem de certa forma, porém tivemos mais cuidado com os arranjos e as melodias justamente pelo fato de One ter sido muito bem aceite e não queríamos de forma alguma deixar a desejar nesse quesito. Outra coisa que nos deixou um pouco apreensivos foi o facto que dessa vez não misturamos nem masterizamos com nenhum nome famoso: toda a produção do disco, bem como a mixtura e masterização foram feitas por Marco Lambert, pois confiamos muito no seu bom gosto e sabíamos que ele não dececionaria. No fim das contas, as reações tanto da imprensa especializada como do público foram excelentes e agora respiramos aliviados e felizes com o resultado. 

Existe algum conceito subjacente a este disco? Que temática é abordada?
A princípio, não tínhamos a intenção de este ser um disco temático, mas a partir do momento em que demos nome ao disco, senti que estava na altura de falar sobre algo que as minhas atuais leituras me têm despertado. Eu queria falar sobre o “despertar”, sobre o “verdadeiro Eu” que a nossa sociedade atual insiste em suprimir. Dessa forma, Otavio e eu fomos construindo as letras. O conceito do álbum é essa busca pelo "eu", a fim de escapar da mente. Se assumirmos que a mente é parte imaginação e parte memória, podemos dizer que não vivemos a realidade, uma vez que tanto a memória como a imaginação realmente não existem. Portanto, se estás perdido na tua imaginação, ou preso nas tuas memórias, abres espaço para o medo, ansiedade, depressão ou qualquer outra condição deste tipo. As letras neste álbum seguem um crescendo: inicialmente mostram uma pessoa atormentada que vai gradualmente entendendo a conceção de ilusão e realidade em toda a sua existência na terra. Uma perceção irrealista da vida é a raiz do nosso medo. Não vivemos sempre a vida como poderíamos, vivemo-la na nossa mente. Estamos sempre a sofrer pelo que aconteceu no passado ou pelo que pode acontecer no futuro, ou seja, vivemos baseados em algo que não existe, porque não estamos enraizados na realidade, mas escondidos nas nossas próprias mentes. Portanto, o disco trata dessa questão de maneira a identificar o que é real e o que é criado por nós para que surja uma compreensão do que é viver aqui e agora.

Quais são as vossas expetativas, sabendo que têm um fortíssimo disco em mãos?
Estamos muito felizes com esse trabalho, que é uma conquista e uma superação para todos nós. Tivemos uma recepção incrível ao One, tanto no Brasil quanto fora, e estamos na torcida para que tenhamos um resultado ainda melhor. Porque tão incrível quanto sentir orgulho do que fizemos, é saber que também agradamos aos nossos fãs, que são uma inspiração para nós, dão-nos tanto suporte e estão sempre tão presentes.

Obrigado, Daísa! Queres acrescentar mais alguma coisa?
Sim, gostaria de agradecer a vocês e aos leitores do Via Nocturna pelo apoio desde o nosso primeiro disco, e que temos muita vontade de tocar em Portugal. Espero que muito em breve isso se torne realidade. Um grande beijo.

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