Foi muito tempo sem música nova de Gonçalo Serras, aka Fritz Kahn e do seu projeto The
Miracles. Mas a espera valeu a pena, porque Jonah, The Whale, o seu novo
trabalho surge carregado de uma classe e subtileza que não é muito vulgar na
canção nacional. Um conjunto de canções que são, para o artista, mais uma
interrogação do que uma afirmação. E que mostram claramente uma expressão
artística pessoal e introspetiva. Fiquem com as considerações do artista a
respeito da sua criação.
Olá, Gonçalo, tudo bem? Antes de
mais, em que consiste este projeto intitulado Fritz Kahn And The Miracles?
Este é um projeto de crescimento
pessoal, através da música. Todas as músicas representam situações, ou
momentos, de conflito interno e a forma de as ultrapassar. Em última análise,
diria que este projeto consiste em esperança: Esperança de sermos melhores,
esperança de conseguirmos resistir, esperança até que possamos viver para
sempre.
Já
agora, esclarece a minha curiosidade: o porquê de utilizares o nome de um
ginecologista judeu alemão como nome do projeto?
O Dr. Fritz Kahn via o corpo como uma
máquina, inclusivamente a nível dos afetos. Por isso mesmo acreditava que tudo
podia ser explicado, medido e analisado. Utilizar o nome dele para este projeto
é uma ironia, na medida em que nunca poderemos explicar os milagres. E sim, eu
acredito em milagres. Daí o nome: Fritz Kahn and The Miracles. O nome exprime o
conflito eterno entre ciência e espiritualidade.
Esta
caminhada começou há vinte anos. Porque só agora um sucessor para o teu
trabalho de estreia? O que foste fazendo durante esse longo período?
Fui sofrendo, aprendendo, recomeçando,
sempre que as coisas correram mal. E correm muitas vezes mal. Só muito tarde me
apercebi que a música é de facto um veículo de salvação, espiritual e
emocional. Interrompi as composições durante tanto tempo, porque na verdade,
não havia muito a ser dito, mas havia muito a ser vivido. Mas este é o momento
da expressão artística, momento que não escolhemos, simplesmente acontece.
Todavia,
todas estas canções que compõem este disco são criações recentes, estou certo?
Sim, está correto.
Quando
e porque decidiste que estava na altura de voltar às gravações?
Penso que cheguei a essa conclusão,
quando percebi que o melhor que tinha para dar ao mundo eram as minhas
composições musicais, e as minhas histórias. Como crente que sou, acredito que
todos temos dons, que devemos explorar ao máximo, pois são uma bênção de Deus.
No meu caso, os meus maiores dons serão certamente a capacidade de cantar e
compor músicas, assim como de escrever.
Como
foi a escolha dos músicos que te acompanham nesta proposta?
Tudo aconteceu graças ao Tiago
Machado, que tive o prazer de conhecer há cerca de três anos atrás. Ele é o
meu produtor, pianista, arranjador. Para além disso, um querido amigo. Ele
esteve na base da escolha dos músicos que me acompanharam neste projeto, entre
os quais o Mário Delgado, a Patrícia Silveira, o António TC
Cruz, ou a Patrícia Antunes.
E
de que forma surge a referência bíblica de Jonas e da Baleia nesta criação?
Tem a ver com ver a música como um
veículo de salvação emocional e espiritual. A Baleia é a metáfora da música,
enquanto suporte de vida.
Será
por isso que podemos perceber algumas referências religiosas num tema como Confession
ou alguns elementos de gospel espalhados pelo álbum?
Será certamente por isso.
Já
que falamos de algumas caraterísticas das músicas, podes descrever um pouco a
tua visão desta criação musical?
É a eterna busca da perfeição,
reconhecendo que tal é impossível.
De
alguma forma, este trabalho pode ser considerado o resultado da pandemia ou
não?
Excetuando o tema Til The End,
todos os temas se referem a outras situações e vivências da minha vida. A
pandemia teve muita influência possivelmente porque nos obrigou a olhar para
dentro e a sermos corajosos. Algo que este trabalho procura traduzir.
É
também um álbum pessoal ou mesmo autobiográfico? Em que sentido?
O álbum é autobiográfico, sim. Não podia
deixar de ser. Está lá o falecimento da minha irmã. Está lá a Rita, uma
miúda por quem me apaixonei. Existe alguma expressão artística que não seja
pessoal?
Toda
a criação musical, lírica e de conceito está centrada em ti? Sentes-te
confortável nessa situação?
Pergunta difícil, uma vez que presunção
e água benta cada um toma a que tem… todas as minhas músicas são um conjunto de
influências muito grande, tanto que não posso especificar concretamente nenhuma
influência. Donde vem o gospel? Donde vem o soul? Donde vêm as
minhas músicas? De onde venho eu? As minhas músicas são mais uma interrogação
do que uma afirmação.
Podes
falar dos vídeos que foram feitos a partir dos temas de Jonah
The Whale?
Sim, os vídeos foram realizados pelo Bruno
Fonseca e Pedro Dionísio. São vídeos simples, mas que exprimem a
intensidade do labor que se viveu em estúdio.
Muito
obrigado! Queres acrescentar algo mais ao que foi abordado?
Gostaria de convidar as pessoas a
escutarem os temas, e se de alguma forma se revirem neles, a partilharem com os
seus amigos.
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