Bleeding The Stars
foi um sucesso. E, sem pressão nem receios, os Lacrimas Profundere apresentam How
To Shroud Yourself With Night, o seu irmão malvado. Um disco feito para
surpreender, para incomodar e que ultrapassa todas as expetativas. Para
conversarmos sobre esta nova e impressionante obra do coletivo germânico,
tivemos uma agradável conversa com o simpático guitarrista Oliver Nikolas Schmid.
Olá,
Oliver, tudo bem? Há três anos atrás, Bleeding The Stars
foi um enorme sucesso. Quando começaram a trabalhar neste novo álbum, sentiram
mais motivação ou pressão?
Em primeiro lugar, quero agradecer muito
pela oportunidade e pelo interesse no nosso novo álbum. Começamos a tentar
escrever coisas novas em meados de 2019, mas, efetivamente, nessa altura, a
pressão impediu-me. Isso tirou-me um pouco o sono. Finalmente, voltámos aos
trilhos e capazes de construir sobre velhos sucessos e de repente lá estava, a
pergunta diária: hoje é dia de escrever algo especial? No entanto, não podes
forçar e acabar no perfeccionismo e a pensar demais nas coisas. Qualquer artista
tem que travar esta batalha. À medida que alguém se torna mais bem-sucedido, o
sucesso torna-se um predador. Tem um lado bom – tocar em salas cheios, bons
pagamentos, patrocinadores felizes, mas também te pressiona. Às vezes tens que te
esforçar para não perder a diversão ou perguntar por que estás a colocar todo
esse stress em ti próprio. Quase fui devorado por isso, mas lembrei-me
de como comecei esta banda por amor aos doomers do Reino Unido, Paradise
Lost. Lembrei-me da altura em que os descobri e pensei nos dias em que andámos
juntos em tournée e nos encontrávamos em festivais. Foi quando os
primeiros riffs de Wall Of Gloom foram escritos. Algumas músicas são
algo como uma homenagem à banda e aos nossos primórdios. De repente, tive um
motivo para me levantar de manhã. No dia seguinte as minhas influências foram Arch
Enemy, Anathema, Sisters of Mercy, Primordial ou The
Cult. Literalmente floresci. Tu não classificas os sentimentos em cem géneros,
porque fazer isso com a música? Bem, posso apresentar: o irmão malvado de Bleeding
The Stars.
Qual
foi o caminho que definiste a ser seguido no novo álbum? Como se depreende, não
procuraste recriar Bleeding The Stars?
Tenho uma família grande e uma casa
muito modesta. E tive que limpar a minha sala de gravação para a criança n.º 3
e o único lugar para eu descansar era na casa de banho, em frente à banheira. Tranquei-me
lá e agachei-me com o meu iPad e guitarra. Espero que esta informação
não seja a minha ruína na tua review (risos)! Alguns meses depois de
começar o processo de composição, eu já tinha muitas ideias de músicas prontas
que seriam uma aposta segura e eu não teria arriscado assustar nem mesmo um
comprador. Mas eu não queria um álbum que não surpreendesse ninguém, que não
correspondesse completamente às expetativas e não incomodasse ninguém. A minha
ideia do disco era exatamente o oposto, deveria surpreender, deveria perturbar,
deveria emocionar. Porque é arte e a arte é corajosa! Foi esse o caminho. Todas
as mudanças precisam de coragem, acho eu. Seja largar o emprego para te encontrares,
ir para o estrangeiro por um ano, fazer uma tatuagem de corpo inteiro, saltar
pela primeira vez do trampolim de 10 m ou apenas visitar o Penis Museum na
Islândia (risos)! Portanto, quando juntas tudo isso, tens uma sensação de como
nos sentimos no estúdio quando o quebra-cabeça lentamente se juntou e se
desenvolveu numa obra de arte total (risos)!
Nesse sentido, como
definirias How To Shroud Yourself With Night?
Esta é difícil! Eu diria que desta vez
cruzamos as fronteiras de géneros. O GothCore já nasceu? Caso contrário,
algumas faixas podem ser o modelo. Uma tempestade de emoções, a porta para
outro mundo. Lembro-me de ler comentários no YouTube a respeito dos primeiros
singles como "eu sinto que a música agarra na minha mão e diz que
está tudo bem, eu vou guiar-te" ou "isto é vida" ou "se
algo pudesse atingir o coração, só poderia ser assim “! O álbum é a prova de
que ainda se pode inventar algo novo, surpreendente e diferente. O que foi
criado aqui é algo muito especial, incomparável para nós. Ele chama atenção. É
uma montanha-russa de sentimentos. É construir uma ponte entre Lacrimas e o
futuro. Deixamo-nos à deriva e posso dizer com orgulho que não fizemos as coisas
porque eram fáceis - mas sim, porque eram difíceis. É como aproveitar a chuva.
Há pessoas que sentem a chuva e outros só se molham. Este disco é para os que
têm sentimentos!
Tiveste
a oportunidade de experimentar alguns novos elementos nas tuas músicas?
Sim, por tentativa e erro. Fiz muitas
coisas com o EBow para obter feedback ou tentei guitarras com
captadores sustainiac. E ouvimos as músicas. O que a música queria. Eu
nunca vou esquecer a Curtain Of White Silence! Eu tinha preparado um
solo de guitarra muito longo para a música ao estilo da obra-prima Gaia
de Wildhoney dos Tiamat. Estive constantemente a tocar guitarra, a
praticar, a escrever e passei dias após dias até ficar satisfeito com o
resultado. Ficou extenso e muito longo e acabou por destruir a atmosfera da
música. Simplesmente não se encaixou no desenvolvimento da música e eu estaria a
mentir se dissesse que foi fácil apagar as faixas de guitarra que já estavam
gravadas. Mas essa música significava fazer concessões e recuperar o teu próprio
ego, apenas dando tudo pela música, submetendo-se a ela, ouvindo o que ela te
queria dizer. O mesmo aconteceu com os vocais: apenas um dia antes das
gravações dos vocais, Julian e eu estávamos a tocar no estúdio e de repente lá
estava, o refrão que nos surpreendeu, os nossos rostos estavam radiantes, é difícil
descrever o momento, mas como que nos agarrou. Sim, algo muito especial,
incomparável para nós, foi criado aqui e tenho a certeza de que também sentirás
isso ao ouvir a música.
Afirmaste
que How To Shroud Yourself With Night se
tornou, de longe, o vosso trabalho mais espirituoso. Em que sentido?
Sim, não somos a banda que queres ouvir
se tiveres momentos engraçados ou beberes bebidas com guarda-chuva num bar de
praia. Nós somos o tipo de banda que deverias tocar quando a tua namorada te
deixa e odeia a tua vida (risos)! Para ser honesto, não queríamos um álbum que
não surpreendesse ninguém, que não correspondesse completamente às expetativas
e não incomodasse ninguém. Queríamos exatamente o contrário, deveria
surpreender, deveria perturbar, deveria emocionar. Era como se estivéssemos
sentados no mesmo jardim de cerveja há décadas e agora tentávamos o pub
do outro lado da rua.
A
escrita e a composição estiveram apenas sob a tua responsabilidade e do teu
irmão ou foi um esforço mais coletivo?
Novamente, Christopher fez muito. Ele surgiu
com o título e o tema do álbum. Julian também trouxe muitas coisas para a mesa.
Julian sente-se mais em casa no metal moderno e Chris é a pessoa da velha
escola Sisters Of Mercy e The Cult. Essa combinação é diferente
das outras bandas por aí, diria eu.
Este
é o segundo álbum com Julian nos vocais. Encontraste o frontman
certo para LP?
Absolutamente sim! Julian é como um
animal em palco. Ele soprou uma nova vida em nós. Ele é como o Homem-Aranha. Espera…
não, Venom por causa das suas lentes brancas que ele usa sempre ao vivo, portanto
provavelmente encaixa-se melhor (risos)! Ele salta as barreiras diretamente
para a plateia, começa um mosh pit onde ele está no meio dele e recebe
arranhões e cortes, sobe nas treliças e é simplesmente um cantor e uma pessoa
maravilhosa. Mas tudo começou durante as sessões do álbum Bleeding The Stars
em 2018. Lá, ouvi o que Julian pode fazer com a sua voz. Fiquei espantado
porque ele pode simplesmente cantar qualquer coisa. Alto, profundo, áspero,
gutural. Essa oportunidade deu-me a liberdade de escrever como sentia na minha
cabeça, sem pensar se o cantor aguentaria ou não.
A
respeito de Ilker – é a primeira gravação dele convosco?
Sim, é. Ele foi membro de longa data dos
Freedom Call. Ele tem o seu próprio estúdio e gravou todo o material de
baixo lá mesmo. Mas funcionamos juntos, Jules, Ilker, Domi e eu. Eu sinto que isto
não é apenas uma banda ou trabalho – é como uma família. A química é ótima e
essa faísca transfere-se para as pessoas nos espetáculos ao vivo ou quando
assistem aos nossos vídeos. Nós gostamos uns dos outros. Nós agarramos no que
imaginamos ser a música moderna e fizemos um híbrido de quem éramos, quem somos
e quem queremos ser e parece que todos estão a trabalhar para o mesmo objetivo:
LACRIMAS PROFUNDERE e o seu novo álbum.
O artwork
é incrível. Quem foi o responsável por isso?
Por acaso, deparei-me com Bahrull
e a sua arte inspiradora quando estava a navegar pelo Facebook e algumas
fotos chamaram a minha atenção. Mas havia uma foto que me atraiu imediatamente
e consegui garantir os direitos para ela. Bahrull é uma pessoa muito
fixe e espero que também possamos trabalhar juntos em lançamentos futuros.
Liricamente,
que questões trazem para a mesa desta vez?
Em primeiro lugar, surgiu o título.
Quando Christopher surgiu com ele, fiquei simplesmente deslumbrado. Ficar
envolto pela noite é uma ideia muito sombria e também funcionou muito bem com as
minhas demos de músicas, que na maioria das vezes eram muito sombrias.
Quando a escuridão te cerca por muito tempo, torna-se uma caraterística tua,
não é mais o desconhecido, mas parte de quem és. Quando se vê a noite como
beleza, o medo também desaparece. O verdadeiro tema do álbum é o desejo de
simplesmente desaparecer, de ser invisível e não ter que lidar mais consigo próprio
nem com o mundo exterior. É sobre sombras, sobre escuridão e objetos místicos
que combinam o poder único do nada.
Como
foi trabalhar novamente com o produtor Kristian Kohlmannslehner? Decorreu tudo
como planeado?
Sabes como é, cada música que compões e fazes
uma demo é como um dos teus bebés. Vês como ele cresce, mas haverá o
momento em que terás que lhe dizer adeus e entregá-lo a outras mãos no jardim
de infância. Isso pode descrever um pouco a sensação de quando entregas as tuas
ideias nas mãos dos produtores, mas depois de dois anos a escrever músicas estás
numa uma espécie de túnel e é bom que haja outra pessoa que tenha uma lanterna
para iluminar o túnel (risos)!
Em
setembro começarão uma tour alemã (com uma
data na Áustria, suponho). Como está a ser a preparação?
Queremos fazer uma tour sem
bandas de apoio. Só nós e um set de duas horas e meia incluindo músicas
antigas, atuais e novas. Algo para todos. Vamos ensaiar um dia num clube para
obter a atmosfera ao vivo e há planos de transmitir o ensaio completo na nossa
conta do Instagram. Em outubro provavelmente iremos para Bucareste e
Istambul e a partir de novembro temo que os regulamentos do covid se tornem
mais rígidos novamente e é por isso que não planeamos nada para esses meses.
Os
vossos fãs portugueses podem esperar outra visita vossa?
Efetivamente nós gostaríamos de voltar
para um festival ou algo assim. Portanto, promotores por aí, enviem-nos uma
oferta. E em 2023 lançaremos um EP para comemorar os 30 anos da banda. Merda,
eu preciso voltar a começar a escrever músicas, espero que a casa de banho não
esteja ocupada.
Muito
obrigado, Oliver, mais uma vez. Foi um gosto! Queres enviar alguma mensagem
para os vossos fãs portugueses?
Muito obrigado pelas ótimas perguntas.
Adoramos os nossos amigos em Portugal! Obrigado por nos ouvirem, vocês estão
entre os nossos 20 melhores ouvintes de todos os tempos no Spotify, portanto
espero ver-vos a todos por aí, fiquem seguros, abraços.
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