Se Damn
Sessions deixou no ar um cheirinho a uma qualidade superior, o seu sucessor
leva a banda lisboeta para caminhos sul americanos. El Impostor teve
como génese um tema que foi crescendo e deu origem a seis capítulos. Uma magistral
captação de sonoridades negras do rock cruzadas com o tango e enriquecida
pelo uso de três idiomas distintos. Numa altura em que a banda já prepara um
novo álbum, Pedro Pereira explica toda a envolvência deste trabalho.
Olá, Pedro, tudo bem? O que tens feito desde a
última vez que conversámos? Os Damn Sessions estão de regresso com um trabalho
que múltiplas perceções. Foi essa a vossa intenção quando partiram para a
composição de El Impostor?
Boas
Pedro, tudo bem? A nível pessoal, pouca coisa, mas sempre que tenho
oportunidade assisto (aos poucos) concertos no meio underground. Com Damn
Sessions o ano de 2022 foi bom. Tocámos dez concertos e tivemos o primeiro
concerto fora da região de Lisboa, no festival Provart, na Sertã, lugar
que tanto me diz. Terminámos o ano no evento Raging Xmas, promovido pela
Raging Planet e a nossa agência D.AgenC, onde tivemos o prazer de abrir para os The
Quartet of Woah! (que espero um dia rever, a meu ver uma das grandes bandas
nacionais). Se o ano terminou bem, não poderia ter começado melhor. A convite
da Ride The Snake, da nossa querida Eliana Berto, tivemos a
oportunidade de fazer a primeira parte de Nick Oliveri. Uma noite mágica
que ficou bem gravada na nossa memória. Nessa mesma noite, desvendámos dois
temas do El Impostor. Muito embora a composição deste álbum não tenha
sido pensada em atingir essas múltiplas perceções, a verdade é que já não és a
primeira pessoa que aborda essa questão, talvez devido a uma narrativa
desdobrada em três idiomas... a verdade é que El impostor é um disco que
cresceu em tempo real. Aquando das gravações de uma única música que pensámos
lançar em forma de single. Deste tema foram surgindo um e outro até
chegarmos aos seis, com o desafio de ser baseado nas mesmas progressões
harmónicas. A ideia foi fazer crescer, não várias, mas uma só história para
compor um disco.
Para começar, de onde surge essa influência e
inspiração mexicana?
De
longe é essa a inspiração. Quando muito uma aproximação parca a uma boémia
Buenos Aires dos anos 30 do século passado. Essa surge quando o Gê afirma: há
muito tempo que quero fazer um tango!! O Chapter 4 vai nascendo
com sabor a Tango... Um tango com o cunho Damn Sessions.
O álbum tem uma narrativa conceptual. Mas porque a
opção de intitulares as canções como capítulos?
O
álbum é realmente composto a partir de uma só música, há melodias, harmonias, riffs
e mensagens que estão presentes em todas as faixas. Por exemplo, a melodia de
guitarra da faixa 2 vem da melodia da voz da faixa 1, o riff final da
faixa 2 repete-se na 3 e na 3.1, a progressão de acordes da 3 vai ecoar na 4 e
na 5... Uma viagem dentro da viagem... Assim sendo, não fazia sentido intitular
as faixas como músicas independentes umas das outras.
E já agora, o porque daquela mudança a meio do Chapter 3 que nos leva para o Chapter 3.1?
Quando
percebemos que o nosso single afinal se desdobrou em 6 partes, e que em
vez de sair apenas em versão digital, afinal ia sair em vinil, pensámos que
seria crucial ligar o Lado A ao Lado B. É essa a razão, para que ninguém ouça o
Lado B sem ter a consciência que está a começar a ver um filme a meio.
De uma forma genérica, podes contar-nos o que se
passa nestes seis capítulos?
Durante
estes seis capítulos, damos lugar a uma estória bem comum a quem partilha connosco
a meia-idade. É sobre alguém que se enfrenta ao espelho, que se sente
envelhecer, que duvida, que se questiona. Que chora e que ri. Uma viagem ao
nosso interior. A luta constante entre o certo e o errado, mas com uma única
certeza, a de que o caminho se faz caminhando.
O uso de três línguas diferentes (português, inglês
e castelhano) foi um desafio?
Escrever
em Português é e será sempre um desafio. As palavras ganham peso, sentem-se mais.
Pessoalmente penso que os idiomas escolhidos para cada parte dos capítulos surgiram
naturalmente, e fazem sentido surgirem onde estão. Uma espécie de frenesim que
acrescenta, para mim, emoção à narrativa. Com o tango (4) fez-nos
sentido ser escrito em castelhano, apesar de igualmente difícil, tinha de ser castelhano,
para reforçar a ideia que era mesmo um tango.
Em termos de formação da banda notam-se diferenças
ao nível das guitarras. Mário é novo na banda, certo? Desde quando está ele a
bordo?
Sim,
com a saída do ex-guitarrista, Pedro Coelho, ainda assumimos o projeto
apenas com bateria, baixo, voz e uma guitarra (Gê), mas depois fomos
sentindo falta de uma segunda guitarra e em finais de 2021, inícios de 22, o
Mário, que nos ajudava como roadie, e após vários convites nossos,
reconsiderou essa hipótese e de repente estava a gravar o novo disco connosco.
Hoje em dia é parte fundamental dos Damn Sessions, dá ao nosso som a coloração
que faltava e a atitude que nos completa.
Quanto ao Mário Pereira, já não é propriamente um
elemento novo, uma vez que foi o primeiro vocalista da banda. Como se
proporcionou esse regresso?
O
Mário é um amigo de longa data, principalmente do Gê, o fundador da banda, antes
de eu entrar eles já tinham tocado juntos e na verdade foi ele que tentou as
primeiras vozes no projeto. Mas a título de experiência e nunca passou muito
daí. O primeiro a dar voz (que eu saiba) ao primeiro tema do nosso primeiro álbum,
my name is (...). Anteriormente conhecido como John Dope. Mário
é, foi e será sempre uma escolha acertada. Conhece e gosta do projeto. Foi
quase fácil de convencer. Colaborou connosco antes de se juntar. Foi roadie,
fã número um. Sabe todas as músicas de cor.
E já teve a oportunidade de contribuir para o
processo criativo?
O
Mário entrou com o disco a ser gravado. A pés juntos. Criou harmonias e várias
melodias, em todos os temas. Criou os solos da 1 e da 4. E logo da 5. Malhão!
É certo que em Damn Sessions já se socorriam de duas
guitarras, mas um dos elementos era convidado. Agora contam com duas guitarras
na formação. Foram as músicas entretanto criadas que pediram uma segunda
guitarra ou foi a entrada de uma segunda guitarra que deu outra orientação aos
temas?
Certamente
um misto das duas situações. As guitarras de um membro novo levam sempre a uma
nova orientação musical e o próprio projeto pedia uma segunda guitarra... mas
tinha que ser uma pessoa com quem houvesse a química certa... o Mário, claro! Neste
álbum o Gê teve a oportunidade de fazer o gosto ao dedo e tocar uma guitarra barítono,
instrumento que cada vez mais vai definindo a nossa sonoridade. Com o baixo do
Rui, as guitarras do Mário, guitarras e barítono do Gê, fica completo o naipe
de cordas da banda.
Já que falamos de instrumentistas, voltam a ter
convidados com instrumentos que, à partida, não seriam expectáveis. Queres apresentá-los
e falar um pouco do seu contributo para os temas?
Pessoalmente,
o saxofone é um instrumento que já há muito que gostava de ter no projeto. Creio
que ajuda a crescer a sonoridade. O Rogério, por sua parte, há muitos anos que gostaria
de fazer um tango, chegou a hora e o acordeão tinha de estar presente. Temos
a sorte de contar com amigos talentosos e com uma disponibilidade incrível. Convidámos o Diogo Santos [teclista de
(entre outros) Miguel Araújo, Luís Varatojo] para o acordeão e o Jorge
Marques (Flor de Lis, Jorge, o Artista) para o
saxofone. Não esquecendo ainda, Alzira, a nossa Madame Zizi, nas
vozes. E eles aceitaram perder algumas horas das suas vidas para enriquecerem
as nossas músicas! Foram fundamentais para a sonoridade pretendida. Obrigado,
Diogo, obrigado Jorge, obrigado Alzira.
Dentro deste leque de convidados volta a surgir Fred
Gracias. E ele é como um elemento extra da banda?
Há
pouco a dizer. Que é muito. O Fred foi o primeiro baterista do projeto,
entretanto foi substituído pelo Marco Diogo, mas nunca deixou de ser
pedra fundamental nos Damn Sessions. É o nosso produtor, técnico de som
ao vivo (em conjunto com o João Carvalho). É quem capta com muita paciência e
positividade as gravações no estúdio, e faz magia. Consegue sempre tempo para nos ajudar nas composições.
Seja na bateria, na guitarra ou nos teclados. Gostava ainda de lembrar que o
tema Laura, do nosso primeiro trabalho, que a composição é sua, tendo
sofrido alguns arranjos. O Fred é definitivamente o sexto elemento.
Têm tido a oportunidade de apresentar este álbum ao
vivo? E o que têm planeado para o futuro próximo?
Sim,
ainda que escassa, e tendo em conta o panorama nacional, com este álbum fizemos
seis concertos em 2023, ainda que só tenha sido lançado oficialmente em novembro
no Café teatro do Teatro da Comuna, em Lisboa. Uma produção nossa e da nossa
agência, num concerto intimista como eu gosto, que com a ajuda de alguns amigos
conseguimos realizar. Outros, em bares como o Village Underground, a Burguesa
do Castelo, o Woodstock 69 no Porto em mais uma edição do Raging
Xmas da Raging Planet com os It Was The Elf e fechámos o ano
em Esmoriz no Uncle Joe´s. Para o futuro próximo, temos músicas prontas
a ir a estúdio, e temos vontade de as parir.
Muito obrigado, Pedro, mais uma vez! Queres
acrescentar mais alguma coisa?
Obrigado,
nós pelo convite. Temos tido boas reações em relação ao projeto e ao último
trabalho, e seguramente é também fruto do vosso trabalho. Obrigado pelo apoio
da Via Nocturna 2000. Algo de certo está mesmo certo! Keep up the
good work! Obrigado à Daniela Contreras, ao Nuno Mota, sem
eles esta aventura não era possível. Obrigado, ainda ao João Martins,
que nos ajudou na captação das vozes, no seu estúdio, o Ponto Zurca.
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