A ideia partiu do Cineclube Fila K. O projeto era
musicar duas curtas de Charlie Chaplin. O convite foi endereçado a John Mercy e
Pedro Renato. E como o duo já vinha a trabalhar em bons planos de assaltos a
comboios, a ideia tinha tudo para dar certo. E deu! O duo acabaria por chamar
Raquel Ralha para os vocais, aos quais adicionou Ruby Ann numa música. O
resultado é The Immigrant & The Vagabond que nos levou à conversa com
John Mercy e Pedro Renato
Olá, pessoal, tudo bem? Antes de mais, obrigado pela
disponibilidade para nos falarem deste novo projeto. Antes demais, gostaria que
explicassem em que consiste este projeto, quando e de quem surgiu esta ideia de
fazer bandas sonoras de filmes e porquê, especificamente, Charlie Chaplin e
estas duas curtas?
Olá, Pedro! É
sempre um prazer juntarmo-nos contigo para nos alongarmos numa conversa acerca
de um assunto que nos é tão querido. Ora, então estas três primeiras perguntas
estão todas interligadas. Isto porque este projeto nasce de um convite muito direto
do Gonçalo do Cineclube Fila K para musicar curtas do Chaplin, Buster
Keaton entre outros. Foi um pouco antes da pandemia e a ideia da Fila K era
juntar músicos que não tinham ligações óbvias, como se fossem encontros
inesperados, para musicar alguns destes filmes clássicos do cinema mudo. E um
dos duos que eles decidiram convidar foi John Mercy e Pedro Renato.
No entanto, apesar de não ser tão óbvia a minha ligação com o Pedro Renato,
a verdade é que nos bastidores já estávamos a trabalhar há uns bons anos juntos
como um bom par de bandidos a planear assaltos a comboios. Desde o projecto Pedro
Renato e Raquel Ralha, à produção e gravação do projeto The
Millions do Sérgio Costa (Belle Chase Hotel), bandas sonoras
e entre outros tantos. A verdade é que para nós os dois, este trabalho em
conjunto em torno de canções seria mais um dia no estúdio. Não há semana que
não estejamos juntos a gravar ou a produzir ou a preparar alguma coisa.
Portanto quando surge o convite do Gonçalo foi perceber que algum desse tempo
seria então para preparar a banda sonora destas duas curtas com as quais nos
desafiaram. A escolha destes dois feature films da mutual foram da parte
do Gonçalo, portanto apenas nos deparamos com uma escolha feita.
João, já tinhas musicado livros, mas filmes é a tua primeira
experiência?
Em verdade não é
a primeira experiência a musicar filmes porque dentro dos a Jigsaw já
tínhamos levado a palco alguns concertos em que musicávamos filmes,
nomeadamente o Respirar Debaixo de Água do Antonio Ferreira, que,
coincidentemente a sua banda sonora original é da autoria do Pedro Renato.
Contudo, assumir realmente a criação de uma banda sonora original do nada para
um filme com o grau de envolvência deste, então sim é a primeira vez. E apenas
o aceitei fazer na premissa de que seria algo que sobrevivesse a esta
experiência e não se bastasse no improviso imediato.
E quanto a ti Pedro, como tem sido a tua experiência neste campo
de musical outras artes?
As bandas sonoras
já fazem parte do meu “legado” musical, tal como no caso do Esquece Tudo o Que Te
Disse, ou o Respirar Debaixo de Água, entre outros. É sempre uma oportunidade
para usar a música como motor emocional das imagens.
Depois do convite feito e aceite, quais foram as diretrizes que
traçaram para vocês próprios em termos de composição?
O convite para
ser aceite, ainda teve de ser discutido, porque uma das condições para o
fazermos seria o de criar realmente algo que pudesse resistir ao tempo e que
sobrevivesse para além dos filmes. Que pudesse ser materializado num álbum e
não fosse apenas um improviso fruto do encontro de dois músicos em palco com
imagens de fundo. O que levou a que nada estivesse ao acaso. Nem um único
segundo.
Depois, já na fase criativa mais profunda, quais foram as vossas
principais preocupações? Isto é, como conseguir o equilíbrio e a conexão entre o
que se ouve e o que se vê?
Para podermos
criar estas bandas sonoras de cada um dos filmes tivemos de criar divisões
entre cenas que seriam os limites de cada um dos temas. E o facto de ser cinema
mudo e não haver sequer uma banda sonora em pauta escrita como no caso de
alguns outros, tivemos a liberdade total para tratar o silêncio como nosso.
Assim, em estúdio colocamos filme dentro de uma sessão e começamos a compor as
músicas em função das imagens e sempre com o cuidado de as interligar. Há
momentos em que agimos como narradores e outros em que assumimos as
personagens. Daí que tenhamos colocado as letras como legendas nos vídeos que
acompanham as canções que têm sido lançados todos os meses pela Lux Records.
Porque acaba por ser a nossa interpretação muito pessoal de ambos os filmes e
acrescenta-lhe outra dimensão.
Como se sentirem neste contexto? Confortáveis ou receosos? Ou
qualquer outro sentimento?
Neste contexto
foi uma experiência magnífica. A composição das canções foi feita a uma
velocidade incrível. Mas, à medida que íamos progredindo e percebendo o quão
intrincadas se estavam a tornar as músicas, também compreendemos que seria algo
complicado de levar ao palco apenas entre nós os dois. Apesar de termos gravado
tudo sozinhos, percebemos que íamos precisar de pelo menos mais 7 músicos
(idealmente), mas pelo menos mais uns 3 para conseguir colocar isto ao vivo
como devia ser para fazermos jus às canções, o que nos foi afastando um pouco
da tal ideia do duo para musicar as curtas.
Creio que levamos o projeto bem mais longe do que era a ideia original.
Em que fase surgem as duas vozes femininas?
Como a Raquel Ralha
é uma das presenças em estúdio connosco, tanto nos meus álbuns (John Mercy)
como com o Pedro Renato e dado que, em ambos os filmes, a narrativa
envolve sempre uma personagem feminina forte, logo de imediato concordávamos
que a Raquel tinha de entrar neste álbum. Não tinha de entrar em todas as
canções é certo, mas quando se pode ter a voz da Raquel, como é que se pode
negar tamanho voodoo? Entrou em todas. No caso da Ruby Ann,
achamos que a voz ficaria perfeita na canção Those Cruel Words porque
está muito próxima do seu corpo de trabalho e um telefonema foi quanto bastou
porque a Ruby também é fã de planear um bom assalto.
Quem vos acompanhou em todo este processo?
O Charlie
Chaplin claro!
Há projetos para levar este conceito para a estrada? O que nos
podem adiantar desde já?
Para já temos uma
data mais ou menos planeada que será ou 5 de outubro ou ali perto no TAGV em
Coimbra, mas a esta distância ainda se pode alterar. Vamos levar então alguns
músicos para nos acompanhar e ajudar a levar estas canções ao palco para
apresentar a nossa versão destes dois maravilhosos filmes do mestre!
Obrigado, pessoal! Querem acrescentar mais alguma coisa para os
nossos leitores?
Nesta altura
seria apenas para que se mantenham atentos que todos os meses vamos lançar uma
música do álbum com o vídeo respetivo e essa distância temporal entre o
lançamento de cada uma permite que se possa investir o tempo necessário em cada
uma e perceber os pequenos truques que elas encerram. E mais uma vez obrigado
por este grande espaço de discussão!
Comentários
Enviar um comentário