O
projeto La Chanson Noire já começou há quase vinte anos. E, no seu princípio,
era assim: piano e voz. Por isso, Missa
Negra, o novo álbum da criação de Charlos Sangnoir segue essa premissa de
revisitar toda a discografia do projeto, num formato despido. Objetivo:
perceber como soam as canções na sua forma mais íntima e celebrar todo este
trajeto. Palavras de Charles Sangnoir a propósito deste lançamento, na
entrevista que nos concedeu.
Olá, Charles! É,
novamente, um prazer falar contigo. Missa Negra é o teu novo álbum, onde
revisitas temas antigos, dando-lhe uma nova roupagem. O que te motivou a
revisitar e reinterpretar esses temas antigos? Sentiste que havia algo mais a
ser dito ou explorado nessas canções?
Viva, é um prazer estar de volta à conversa! Eu quis fazer
este disco como uma espécie de marco, ou de pesar da balança: faz quase vinte
anos que embarquei nesta viagem alucinante de La Chanson Noire, e quis
voltar às suas raízes: no início era só isto - o piano e a voz; nesse aspeto
propus-me revisitar toda a discografia de Chanson neste formato mais despido,
por um lado para perceber como soariam as canções na sua forma mais íntima, mas
também como uma celebração de todo este trajeto.
As versões em piano e
voz conferem uma nova dimensão às canções originais. Como foi o processo de
adaptação destes temas para este formato mais despido? Houve algum tema em
particular que tenha sido mais desafiante de transformar?
O processo foi muito simples, e de auto-eliminação, na
verdade: limito-me a sentar ao piano e tocar de rajada todos os temas que
escrevi, sem ensaios. Todo o processo foi feito sozinho: fechei-me no estúdio
da escola onde dou aulas, perto de Paris, escolhi um piano e os microfones que
mais me agradaram, e senti-me sete ou oito horas a tocar tudo, assim, de
rajada; houve temas que soaram melhor que outros (o que é natural, visto que há
temas que não tocava há mais de dez anos), e houve outros ainda que brilharam
como uma joia; esses foram os que encontraram caminho naturalmente para o
vinil.
Esta abordagem mais
minimalista alterou a tua perceção das canções em termos de significado ou
emoção? Sentes que elas transmitem algo diferente comparado com as versões
anteriores?
Os temas em si não se alteraram dramaticamente, mas há uma
diferença flagrante: a atenção vai imediatamente para a voz, e claro, para a
letra - quando despes uma canção de todos os artifícios ela tem de ter uma
força muito própria, tem que valer-se a si mesma, é quase como uma prova de
fogo: quando estás a nu, ou vai ou racha - ou vales alguma coisa ou não vales
nada!
Algumas destas canções
têm histórias associadas à sua versão original. Alguma delas assumiu um novo
significado pessoal para ti nesta nova interpretação?
Eu criei La Chanson Noire depois de dez anos a tocar
com bandas e a produzir discos e espetáculos, portanto embora não à prova de
bala, já vim para esta lide com uma ausência de ilusões e sonhos de grandeza
que são tópicos de projetos mais inocentes; assim sendo, revisitar estas
canções não foi tanto um tirar esqueletos do armário ou visitar uma época de
inocência; foi apenas como ir beber um copo com um velho amigo, não há
surpresas - mas há uma energia bela e grandiosa que transcende as palavras.
Quase todo o álbum Missa Negra é
composto apenas por ti, exceto a faixa-título onde Diogo Beleza contribui na
bateria. O que te levou a incluir este elemento de percussão especificamente
nesta faixa?
O Diogo acompanha-me quase em exclusividade nos espetáculos
de La Chanson Noire há mais de uma década, mais do que qualquer outro
músico era a pessoa que merecia esse espaço; ele soube talhá-lo com paciência e
profissionalismo e nunca, nunca me desapontou. Há uma fatia da canção que lhe
pertence e não consegui resistir a incluí-lo no disco!
Como foi trabalhar com ele
neste contexto? De que forma a bateria alterou a dinâmica da música Missa Negra em
comparação com as restantes faixas mais minimalistas?
Já tínhamos gravado uma versão anterior do Missa Negra
(o tema) muito mais violenta, portanto já sabíamos para onde apontar armas, foi
só uma questão de simplificar a coisa e pensar no que faríamos ao vivo, porque
a maior parte das vezes somos só os dois em palco!
Essa inclusão da
bateria em Missa Negra confere à faixa uma sensação de maior intensidade
e profundidade. Sentiste que essa adição era necessária para transmitir algo
diferente em relação ao resto do álbum?
Não, não foi por uma questão de necessidade, foi por uma
questão de cumplicidade: nunca convidei ninguém para gravar por ser preciso;
quando convido alguém é mais no intuito de ver o que dá; é como convidar alguém
para jantar - convidas porque gostas da pessoa, não para ver se ela gosta da
tua comida!
Em termos de
colaboração, como foi o processo de integrar a performance de Diogo Beleza numa
obra que é, de resto, tão pessoal e introspetiva?
Foi totalmente natural: uma retrospetiva de LCN sem o
Diogo não estaria completa.
Ao longo do álbum,
manténs uma abordagem a solo muito íntima. Consideraste incluir outros músicos
em mais faixas ou querias manter esse isolamento criativo quase total?
Não, este álbum quis fazer totalmente sozinho: sem músicos,
sem produtores, nem sequer engenheiro de som tive; fiz tudo sozinho, exceto o artwork
que foi da autoria do extraordinário Vasco Inglez, e da participação do
Diogo. Intimidade total: foi um meter do coração na balança, digamos; ainda
estou à espera do julgamento de Maat.
Planeias levar este
formato piano e voz para os concertos ao vivo, ou pretendes preservar esta
versão apenas para o registo de estúdio?
Sim, os próximos espetáculos (já agora, toco a 16 de novembro
no Bourbon Room, no Porto, e a 21 de dezembro no Turim, em
Lisboa) vão ter esse cariz mais intimista; é um regresso às origens.
Obrigado pela entrevista, Charles. Desejo-te muito sucesso com este novo álbum!
Muito obrigado pela oportunidade de tagarelar um pouco sobre esta pepita! um Abraço a ti e a todos os leitores!
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