Reviews VN2000: FERNANDO FERREIRA; FRAN ASHCROFT; EX NORWEGIAN; MY SPECTRAL GUISE; CONFRARIA ROCK TUGA
Tempo (FERNANDO FERREIRA)
(2024, AVM Music)
Fernando Ferreira regressa aos discos refletindo profundamente
sobre a noção de tempo enquanto força que molda a nossa existência. E, nos 10
temas que fazem parte deste registo, explora temas como o tempo ritualístico,
existencial e ontológico, ao mesmo tempo que aborda questões sociais e pessoais.
Claramente em melhor forma que no álbum anterior, Tempo vive, ainda
assim, da boa escolha das canções para fazer versões (Oração ao Tempo,
original de Caetano Veloso; Eternamente Tu, de Jorge Palma;
e Um Tempo Que Passou, escrita originalmente por Sérgio Godinho e
Chico Buarque). Sonoramente, Tempo apresenta uma base lusófona
marcada pela palavra e pela voz contida, mas segura e madura, a que Ferreira já
habituou o seu público. No entanto, o álbum também arrisca novas sonoridades,
incorporando beats, programações e elementos urbanos que trazem frescura
ao trabalho e se cruzam com um maior tradicionalismo como o bom trabalho
rítmico-percussivo e a espetacular morna Duzinha. E se nos lembramos que
o álbum Mantenhas já tinha incluído Mindjeris De Pano Preto, e
que este Tempo ainda inclui Consolado, outra faixa em crioulo, parece
evidente ser este o campo onde Fernando Ferreira se sente mais à-vontade
e que deveria explorar com maior profundidade. [75%]
The Songs That Never Were (FRAN ASHCROFT)
(2024, Think
Like A Key Music)
Monos era a moda powerpop que provou que os
britânicos podiam fazer mais do que apenas beber chá e queixar-se do tempo. Mas
para Fran Ashcroft, este foi apenas o ato de abertura. Isto porque os
seus créditos de produção aparecem em Damon Albarn, dos Blur, Abbey
Road Studios e Thunderbirds. Da PRT Records aos Spin
Jupiter Spin, de Big Fish Music no Japão até Darling Nikkie
dos Lords Of Acid, Ashcroft tem espalhado o seu talento um pouco por
todo o lado. Até que a Think Like A Key Music decidiu que já
estava na altura de Fran estar no centro das atenções. Em 2023, lançou A
Tour Of British Duck Ponds, uma extravagância de uma one-man-band e,
um ano volvido, chega The Songs That Never Were, que não é apenas um
álbum, mas uma ressurreição de faixas perdidas que viajaram no tempo e que foram
alimentadas por IA. Uma ponte sonora que abrange meio século de música com
vibrações vintage a encontrarem uma produção moderna. Tudo feito com
base algoritmo de IA arrasador e uma máquina do tempo, levando o produtor
britânico a apresentar um musical de Marty McFly, tocando a sua versão
mais jovem ao longo de cinco décadas. Dos agitados anos 60 aos agitados anos
2020, Fran Ashcroft prova que a música transcende o tempo. The Songs
That Never Were não é apenas um álbum – é um paradoxo envolto numa melodia,
servido com um lado da sagacidade britânica. Embora, raramente seja
convincente. [66%]
House Music (EX NORWEGIAN)
(2024, Think
Like A Key Music)
Na sequência da reedição de Sketch, a Think
Like A Key Music, junta outra reedição dos Ex Norwegian: House
Music. Originalmente lançado em 2012 pela Dying Van Gogh Records, é
o terceiro álbum da banda de Roger Houdaille que aqui surge acompanhado
por Michelle Grand, Lucas Queiroz, Alex Ibanez, Eric Hernandez,
Derek Cintron e Fernando Perdomo, embora estes dois últimos
apenas na faixa de abertura Ginger, Baby. E é aqui, neste House Music,
que estão duas das maiores pérolas dos Ex Norwegian: Original Copy
e Initiative Rock. Mas não são apenas estes dois temas. House Music
é o melhor disco da banda da Florida e aquele onde melhor consegue conciliar a
sua forte influência indie com um rock mais musculado. À
semelhança de Sketch, também House Music foi cuidadosamente remasterizado
pelo Prof. Stoned. Esta nova prensagem inclui o tema Ebenezer Beaver,
que não tinha sido incluído no álbum, bem como a performance completa do concerto
de lançamento de 2012, realizado na Tobacco Road, em Miami. [81%]
Circle Of The Kaleidoscope (MY SPECTRAL GUISE)
(2024, Independente)
Os My Spectral Guise são originários de
Alcobaça e Porto e constituem uma presença enigmática e cativante no panorama
da música alternativa portuguesa. A sua sonoridade é rica e complexa e é capaz
de tecer uma malha que funde as melodias sombrias do rock gótico com os
ritmos introspetivos do pós-punk e as atmosferas etéreas do darkwave.
Isto num formato de uma banda sonora instrumental, altamente cinematográfico e,
por vezes, sinistro, onde se desenvolvem melodias evocativas e paisagens sonoras
atmosféricas capazes de transportar os ouvintes para um espaço onde as sombras
dançam e as emoções se entrelaçam. As referências são todas das melhores (Bauhaus,
Joy Division, Sisters Of Mercy) e os My Spectral Guise
mostram ser capazes de desenhar belas paisagens sonoras. Apenas se pedia que
fossem um pouco mais arrojados, porque seis temas em 13 minutos é
manifestamente pouco, deixando sempre no ar aquela ideia que os temas acabam
demasiado cedo, não dando tempo para crescerem e se desenvolverem. [81%]
Confraria Rock Tuga – A Coletânea (V/A)
(2024,
Confraria do Rock)
A Confraria do Rock Tuga é uma compilação marcante que reúne 17 faixas de bandas portuguesas de rock, destacando a diversidade e vitalidade deste movimento no nosso país. Lançada a 1 de outubro, esta coletânea inclui nomes mais ou menos conhecidos com trabalhos dos anos mais recentes, refletindo um conjunto de projetos com identidade própria, originalidade e que abrange as múltiplas vertentes do rock. Nesse sentido, destacamos os Ex Votos, por exemplo, que trazem um folk intenso, enquanto Peter Strange mescla sonoridades funk com influências de Ornatos Violeta; Duda Spínola abarca o blues rock e Christina Quest mostra porque é a pioneira da guitarra a solo em Portugal, enquanto os Lustro põem o convidado Paulo de Carvalho a cantar rock. Alguns destes nomes já se cruzaram connosco nestas páginas; outros é o primeiro contacto. Mas, em todos eles se se nota uma excitante fusão de estilos diversos, desde o rock musculado ao punk evolutivo, que marcam o trabalho de várias bandas envolvidas e o panorama rockeiro nacional. Importante destacar é o recorrente uso da língua portuguesa: dos 17 projetos, 15 usam a língua de Camões! Agora, gostaríamos é que todos estes coletivos pudessem ter a visibilidade mediática que verdadeiramente merecem. [93%]
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