Entre a Pedra e a Canção (CRISTINA MARIA)
(2025, Independente)
Entre
a Pedra e a Canção afirma-se como o trabalho mais pessoal de Cristina
Maria, unindo a escultura e a música num mesmo gesto criativo. Do ponto de
vista técnico e estrutural, este
álbum revela um rigor notável no equilíbrio entre tradição e
experimentação, apresentando uma diversidade estilística cuidadosamente
integrada. O disco abre com a intensa A
Alma e o Cinzel, espelho perfeito da relação entre matéria
e voz. Seguem-se tons cabo-verdianos próximos da morna, canções onde o
piano, o violoncelo e subtis elementos eletrónicos se cruzam com guitarras
tradicionais, regressos assumidos ao fado, explorações folk e até uma
faixa final construída a partir de narração e dos sons reais do atelier
da artista. A gravação destaca a clareza das guitarras (portuguesa e clássica),
bem como a voz de Cristina Maria que surge com grande definição e
emocionalmente expressiva. Entre a Pedra e a Canção
constitui o trabalho mais completo e artisticamente assumido da artista,
reforçando o caráter autobiográfico e multidisciplinar deste projeto. [80%]
As Melhoras ao País (SENHOR DOUTOR)
(2025, Independente)
Senhor
Doutor é o projeto mais recente de Jorge Ferreira, ex-The
Guys From The Caravan e Pinto Ferreira, com discos editados em 2008
(Iplay) e 2010 (Sony Music) e com participação no último disco
dos Rádio Macau. Jorge Ferreira é, agora, Senhor
Doutor, um Chico Esperto que vive deslumbrado com o poder de uma só sigla
(Sr. Dr.). E, depois de O Amor é Sempre a Mesma Coisa (2022), o Senhor
Doutor regressa com um EP que condensa ironia, sátira e lucidez em formato pop-rock
eletrónico. Melhoras ao País apresenta quatro temas onde o sarcasmo se
mistura com melodias cativantes e arranjos que evocam a leveza da pop de
autor e a acidez do rock alternativo. O tema-título, uma crítica mordaz
ao estado atual de Portugal, abre o disco com energia eletro-rock e uma
escrita que combina humor e desencanto. Seguem-se Chance ao Bom Humor e Graça
e Juventude, peças de ironia luminosa. O EP encerra com Farda Austera,
balada introspetiva com letra de Samuel Úria, que acrescenta densidade
poética. Melhoras ao País confirma o Senhor Doutor como um
observador arguto da realidade, capaz de transformar o quotidiano e as suas
contradições em canções de fino recorte melódico, lírico e sarcástico. [83%]
Suite Giacometti (CONJUNTO!EVITE)
(2025,
Independente)
Nascido
do desafio lançado pelo Festival Giacometti 2023, Suite Giacometti
apresenta-se como um dos trabalhos mais sólidos e intencionalmente conceptuais
dos Conjunto!Evite. O coletivo de Rio Maior assume aqui a sua identidade
progadélica fundindo rock progressivo, psicadélica e
ritmos do mundo, com uma clareza rara, utilizando-a como lente para
interpretar o Alentejo contemporâneo, um espaço onde a ancestralidade colide
com a mecanização agrícola. Musicalmente, este EP de 5 temas destaca-se pela
organicidade das gravações em live take.
As guitarras, distribuídas entre acidez psicadélica e texturas mais
abertas, marcam um tecido sonoro enriquecido com as contribuições de Ana
Santos (violino) e Paulo Ribeiro (voz). No conjunto, este EP mostra
os Conjunto!Evite no seu estado mais maduro. Curto na duração, mas amplo
na intenção, Suite Giacometti destaca-se como um dos trabalhos que
melhor traduz a ideia de música como espelho de uma identidade em mudança. [86%]
Live Quintet 2025 (ARNAUD QUEVEDO & FRIENDS)
(2025,
FTF Records)
Recuperando
parte do material dos seus três trabalhos anteriores (Electric Tales, Roan
e 2nd Life), Live Quintet 2025 apresenta Arnaud Quevedo &
Friends a oferecer um registo absolutamente arrebatador, digno de um ensemble
de topo. E apesar da opção por uma formação reduzida a quinteto, os arranjos
surgem aqui ainda mais majestosos, grandiosos e meticulosamente construídos,
revelando um domínio técnico e emocional assinalável. E todas as principais
caraterísticas do projeto francês, desde a narrativa musical envolvente até ao
sentido de aventura progressiva, através de uma superior capacidade de fundir jazz,
rock e elementos cinematográficos, surgem aqui mergulhadas num ambiente
de espontaneidade e comunhão com o público. Como tão bem fica documentado em Mushi’s
Forest, tema que só aparece na versão digital. Uma comunhão que assenta
numa reinvenção da própria banda, não só pela mudança de formato, mas também
pela forma como recria álbum dos seus mais emblemáticos momentos como 2nd
Life Part 2 – Journey e 2nd Life Part 4 – Hindsight’s. Mas é
impossível falar de Live Quintet 2025 sem destacar o trabalho
absolutamente soberbo de Julien Gomila nos saxofones. Seja no soprano ou
no barítono, a sua presença é magnética, preenchendo o espaço com linhas
melódicas luxuriantes, passagens improvisadas de grande fôlego e um
entendimento profundo da estética jazz-rock que define este coletivo.
[90%]
Mirror Songs – A Tribute To The Psychedelic Furs (V/A)
(2025, Lux Records)
A Lux Records apresenta Mirror Songs – A Tribute To The Psychedelic Furs, uma homenagem singular ao legado de uma das bandas mais influentes do pós-punk e da new wave britânica. Reconhecidos pelas atmosferas introspetivas, pela escrita poética de Richard Butler e por uma sonoridade simultaneamente melódica, sombria e elegante, os The Psychedelic Furs deixaram uma marca indelével na música alternativa desde o início dos anos 80. Mirror Songs celebra essa herança através de 11 recriações profundamente pessoais, reunindo alguns dos nomes mais respeitados e criativos da cena independente portuguesa. De Sister Europe por Paul Oak à sofisticada All That Money Wants por Raquel Ralha & Pedro Renato, o álbum percorre diferentes abordagens estéticas, onde se pode incluir a elegância minimalista dos Birds Are Indie à energia crua dos Atomic Vandals, passando pela luminosidade pop dos Manchesters, pela visão atmosférica dos Thee Automatics e pela expressividade vocal de Tracy Vandal, presente em dois momentos distintos, numa participação especial com os The Twist Connection e no já habitual dueto com John Mercy. Mirror Songs destaca-se pela diversidade criativa, pelo respeito às composições originais e pela capacidade de cada artista reinventar estes clássicos sem lhes retirar identidade. [73%]






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