Entrevista: Dave Kilminster

Guitarrista de eleição, chegou a ser galardoado com o prémio Guitarrista do Ano atribuído pela Guitar Magazine, Dave Kilminster tem construído uma carreira de grande reputação acompanhando diversos músicos, sendo o mais conhecido Roger Waters. O músico já se havia aventurado em gravações em nome próprio com um trabalho de guitarra clássica lançado há 17 anos, mas, este Scarlet – The Director’s Cut acaba por ser considerado como a sua estreia nos meandros do rock.
 
Viva Dave! Antes de mais, parabéns pelo teu excelente álbum e obrigado pelo teu tempo para Via Nocturna.
Obrigado ... é um prazer!
 
A primeira pergunta é: com o teu currículo, por que só agora gravares um álbum em próprio nome?
Hahaha ... essa é uma pergunta muito boa! Acho que tenho andado ocupado a ajudar as carreiras de outras pessoas! Não, a sério, eu sempre quis gravar a minha própria música, mas simplesmente nunca tive tempo. Mas agora estou a construir esse tempo…
 
Chegaste a afirmar que Scarlet – The Director’s Cut é o reflexo de toda a música com que cresceste. Podes citar alguns exemplos? Quem nomes mais admiras, que se refletem em Scarlet?
Acho que as minhas influências mais fortes na minha fase de crescimento vieram da rádio. Hoje temos programas de rádio especializados... Estações de rock, estações de jazz, estações de música de dança, estações de country. Mas antes só havia um tipo de estação e todos os estilos diferentes de música surgia juntos! Assim, durante uma tipica transmissão de três horas, ouviam-se bandas e artistas como Queen, Fleetwood Mac, Al Green, 10cc, Stevie Wonder, AC / DC, Bob Marley, Steely Dan, The Eagles, Wings, Black Sabbath, The Detroit Spinners, Billy Joel, Supertramp, Led Zeppelin, Joni Mitchell, George Benson, Bread, The O'Jays, The Carpenters, The Hollies, Free, David Bowie, ELO, The Jackson 5, Elton John, Deep Purple, Heatwave, Simon & Garfunkle, The Police, etc, etc, etc. Também passava horas a ouvir o meu tio Tony tocar piano e ele tocava qualquer coisa de Scott Joplin a Debussy... E eu gostava de tudo!! Para mim, era tudo simplesmente música e está tudo em algum lugar de Scarlet!
 
Quanto à escolha do termo Scarlet para o título, parece-me que não foi por acaso…
É apenas uma palavra que eu gosto... Eu sou um grande fã de Sherlock Holmes e a determinada altura estava para chamar o álbum de Um Estudo em Vermelho, um dos livros de Sir Arthur Conan Doyle. E também é uma cor muito sugestiva. Numa recente pesquisa, descobriram que a maioria dos homens, quando vê uma mulher vestida de vermelho/escarlate, acho que são ... ummm ... andam à procura de tempo bem passado e estão mais propensos a dormir com elas! Haha… E é também sinónimo de "perigo", mas acho que é muito quente e reconfortante. O que provavelmente será uma referência subconsciente do período uterino.
 
Como foi a escolha dos músicos que te acompanham neste álbum?
Isso foi muito fácil. Quando comecei a trabalhar em conjunto com Keith Emerson, ele disse-me "encontra o melhor baixista e baterista que conheces e vamos formar uma banda!". Então chamei imediatamente Pete Riley e Phil Williams. Já tinha tocado com os dois separadamente em diferentes projetos, embora eles nunca tenham tocado juntos nem se conhecessem. Na realidade esperava que eles trabalhassem bem juntos, mas superaram todas as minhas expectativas e acabou por ser uma secção rítmica incrível! Para além de serem as pessoas mais simpáticas que conheço. Portanto, quando chegou a altura de gravar o meu próprio álbum chamei-os logo!
 
Tens a colaboração da Lydian String Quartet em várias músicas. Deste-lhe instruções precisas de seriam as suas partes ou deste-lhe total liberdade para criarem as suas peças?
Escrevi todas as peças para eles... Mesmo o solo de violoncelo em Harkness. Realmente, nunca tinha trabalhado com cordas antes, mas foi uma grande emoção poder escrever o que ouvia na minha cabeça e tê-los a ler e reproduzir as peças na perfeição... Foi ainda melhor do que eu imaginei! E são definitivamente uma das minhas memórias favoritas do processo de gravação do álbum. Até estava na régie a dirigir com uma batuta imaginária!
 
Já que falamos de convidados tiveste ainda mais dois. A vocalista Anne-Marie Helder e o guitarrista Jamie Humphries. Qual foi o seu papel no álbum?
Bem, eu já tinha trabalhado com a Anne antes (gravei e fui o engenheiro no seu álbum a solo The Contact) e ela tem uma voz tão incrível, que eu sabia que a queria no álbum em algum lugar... Especialmente em Liar, que é uma história sobre um amor de ratos professando a sua inocência, e, obviamente, a resposta do coro precisava ser feito por uma voz feminina! Quanto a Jamie, na verdade só o contactei para ajudar com a mistura final... Mas realmente entrou no álbum, começou a sugerir ideias de produção e acabou por fazer algumas guitarras adicionais! Ele deu-me uma ideia, eu disse: "ok, isso soa bem… Podes gravar depois"! E ele fê-lo! Obviamente ele é um grande guitarrista... Embora no momento em que começámos a trabalhar juntos no álbum não houvesse muito espaço!
 
Podes falar-nos do processo de gravação? Parece que tiveste um monte de experiências novas…
Sim, houve uma certa quantidade de tentativa e erro. Na realidade fiz demos de todas as músicas, tocando-as nos teclados e gravando-as num Korg Triton. Depois mandei-as para o Pete que gravou a bateria e transmitiu as faixas para o Phil gravar o baixo. Mas durante esse tempo nós três também ensaiamos para alguns espetáculos europeus com Keith Emerson. De qualquer forma, começamos a ensaiar uma tarde e decidimos gravar. E, mais tarde, quando ouvi no meu carro pensei 'isto soa totalmente incrível’! Existe algo quando se grava música ao vivo, quando todos estão juntos numa sala. Uma faísca extra de energia que simplesmente não pode ser obtida de outra forma. Então apaguei tudo o que já tínhamos gravado (!), e começámos de novo, desde o início! E gravamos todos os ritmos ao vivo no estúdio!
 
Tu és mais conhecido como o guitarrista de Roger Waters. Este álbum é uma espécie de prova a ti próprio de que também podes criar e lançar boa música em teu nome próprio?
Bem eu gravei um álbum instrumental de guitarra clássica há 17 anos atrás chamado Playing With Fire (está no iTunes!). Mas eu sempre escrevi a minha própria música... É por isso que eu pego na guitarra em primeiro lugar! Mas esta foi a minha primeira oportunidade de gravar um álbum de rock.
 
Falando de Roger Waters, ainda tocas com ele, certo? Terás tempo para fazer uma tournée própria?
Sim, é claro que eu ainda toco com Roger. Temos mais alguns espetáculos de The Wall – Live no próximo ano na Europa (de julho a setembro, as datas estão todos em www.rogerwaters.com caso estejam interessados!), mas espero gravar outro álbum a solo com Pete e Phil antes. Em princípio irei gravar no início do ano, fazer os espetáculos com Roger no verão, e depois talvez sair em tournée em meu próprio nome no Outono... Quem sabe... Fazemos planos e Deus ri!
 
Com toda a experiência em tournées com grandes músicos, posso perguntar-te qual te deu mais prazer fazer?
Uau, isso é uma pergunta muito difícil de responder... Acho que realmente não posso compará-las, uma vez que foram radicalmente diferentes. Adoro as tournées que fiz com o Roger, são incríveis, um show alucinante... É quase como estarmos a fazer história e as pessoas continuam a dizer-me que é o maior espetáculo que já viram! Por isso, acho que estamos a fazer a coisa certa!! Em seguida, o outro extremo é quando saio e toco com o meu bom amigo Murray Hockridge, onde são apenas duas guitarras e duas vozes. Este é uma situação extremamente emocional, em que estás totalmente nu e exposto. Mas é a criação de uma música bem sincera e apaixonada. E depois, claro, as tournées que fiz com o meu bom amigo Guthrie Govan também foram totalmente incríveis. É realmente estar de volta ao básico, apenas um conjunto de pessoas numa carrinha a percorrer milhares de quilómetros em toda a Europa, criando a nossa própria engrenagem e tocando essa música ridiculamente complexa, mas muito emocional e cheia de vida, humor, interação e improvisação. Isto sem mencionar a tournée com um dos heróis da minha infância Keith Emerson, tocando e cantando a música que eu ouvi quando crescia. Na realidade, adorei todas as tournées em que participei, todas elas são muito especiais para mim e aprendi com cada situação.
 
Já foi há muito tempo atrás, que recebeste o galardão de Guitarrista do Ano da revista Guitar Magazine. Foi em 1991, certo? O que sentes agora, olhando para trás para tudo que construíste como músico e, em particular, para esse reconhecimento?
Olhando para trás, estou muito feliz e orgulhoso do que tenho feito até agora. E também sinto muita sorte em ter trabalhado com todos esses músicos incríveis. Mas, na verdade, não gosto de olhar para trás muitas vezes! Prefiro muito mais concentrar-me onde eu estou e para onde vou. E, de momento, estou realmente animado com a nova música que já estou a escrever para o meu próximo álbum! Também vou lançar um álbum acústico em CD que gravei com Murray Hockridge chamado Closer to Earth. Ele já está disponível no iTunes, mas estou a tentar fazer o lançamento em CD em fevereiro. É, sem dúvida, uma das melhores coisas que já fiz.
 
A terminar queres dizer algo mais aos nossos leitores?
Absolutamente! Realmente espero que vocês gostem de Scarlet… Estou esperançado em sair em tournée pela Europa em 2013. E, finalmente gostaria de desejar a todos um ano novo muito tranquilo.

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