Reviews: Março (II)


New Knives (THE GUILT)
(2020, Heptown Records)
New Knives apresenta a segunda cortante proposta do explosivo duo de electropunk sueco The Guilt. Formados por Emma (vocais, manipulação sonora) e Tobias (vocais, manipulação sonora e guitarras), os The Guilt cruzam a música eletrónica de uns Depeche Mode com a agressividade e a energia vocal do punk, sendo que, pontualmente, as guitarras distorcidas também entram em cena. E, embora, em termos musicais o que aqui se apresenta seja algo básico, é percetível que a intenção do duo é sair da habitual zona de conforto musical e proporcionar aos ouvintes uma experiência que promova a sua movimentação. O uso de batidas eletrónicas ajuda muito a isso, nomeadamente em algumas faixas um pouco mais elaboradas e com ritmo contagioso (como surge num dos títulos), nomeadamente de You & I, I Have No Invitation e Beige And Contagious, isto sem esquecer um acentuado sentido de humor. [65%]


Axiom (KILTER)
(2020, Independente)
Axiom é o longa-duração de estreia do trio de Brooklyn Kilter, sucedendo ao EP homónimo lançado em 2018 e é deveras surpreendente. Os Kilter são compostos por Laurent David (fundador da editora Alter-nativ), Kenny Grohowski (Imperial Triumphant) e Edward Rosenberg III (Jerseyband, Heart of Barf), juntos na criação de uma forma única de avant-garde rock/metal de enorme espontaneidade e criatividade. Os maiores destaques vão para os temas longos onde é possível melhor perceber todo esse incrível arrojo criativo, sendo que esses momentos são entrecortados por alguns interlúdios que provocam quebras que se revelam contraproducentes. O exuberante saxofone de Ward Rosenberg III ajuda a elevar Axiom a patamares únicos de riqueza técnica e construtiva em estruturas muito complexas e claramente influenciadas pelo jazz. Os vocais surgem apenas a espaços, sempre na forma gutural e sempre bem enquadrados. Uma proposta para quem gosta de arriscar ouvir sonoridades diferenciadas e menos óbvias. [84%]


Connexion (PEPPINO D’AGOSTINO)
(2020, Independente)
O nosso primeiro contacto com Peppino D’Agostino foi com o álbum Penumbra, um disco onde o músico mostrava os seus dotes de guitarrista clássico, na linha de Paco de Lucia ou Al DiMeola, muito centrado no seu próprio desempenho sem preocupações estéticas musicais. Connexion é a mais recente proposta do italiano radicado nos EUA e sucede ao trabalho For The Beauty Of This Wicked World, de 2019, trazendo um conjunto de 10 novos temas originais onde se corrigem alguns erros do passado. Quer isto dizer que, mesmo nunca abdicando da sua capacidade técnica irrepreensível, Connexion mostra um D’Agostino mais orientado para peças mais acessíveis, melódicas, com mais musicalidade e com um sentido artístico mais focado. Adicionalmente, em alguns momentos, enriquecidas com uma guitarra elétrica que, em dueto, cria belíssimos momentos. Isso acontece, essencialmente, nos temas mais longos, sendo que os mais curtos ficam destinados às habituais experiências e demonstrações (diríamos nós, exageradas) de virtuosismo. [78%]


Depois da Tempestade (PEDRO E OS LOBOS)
(2020, Luckyman Records)
Depois da Tempestade, diz-nos Pedro e os Lobos, é tempo de união, de reconstrução, de solidariedade. E é tempo do coletivo nacional assumir as suas influências claramente americanas, sejam elas mais de um rock urbano, sejam mais orientadas para a ruralidade do southern rock. O que não é tempo é de os lobos voltarem a ser lobos. Porque muitas das paisagens sonoras criadas não são tradicionalmente habitats naturais de lobos e porque Depois da Tempestade, se assume mais como bonança que surge após a tormenta e menos como a agressividade que os lobos possam incutir. Isto para dizer que Dia Dourados abre este disco de forma muito orgânica – aliás, todo o álbum foi criado na garagem e tocado ao vivo em estúdio – e termina com uma beleza incrível em Se o Inverno Durar. Pelo meio há toda uma postura com contextos minimalistas e intimistas, com um Hammond subtil e letras por vezes autobiográficas, embora sempre longe do brilhantismo dos outros dois temas referidos. [70%]


Meltdown (EXISTENZ)
(2020, Heptown Records)
Quando uma banda apresenta num trabalho seu 10 temas em 25 minutos, ficamos logo a saber que por ali não pode haver grandes rigores técnicos nem arranjos sofisticados. Mas pode acontecer, ao invés, termos microdescargas de emoção incontrolada e atitude inflamável. É precisamente isso que acontece com o novo registo dos Existenz, uma banda há quase quatro décadas a semear o caos do seu punk/hardcore. Este novo trabalho intitula-se Meltdown e deverá ser o seu registo mais forte se sempre. Sem subterfúgios nem festinhas, Meltdown descarrega essas dez faixas de um punk direto, áspero e com atitude que em alguns momentos se apresenta metalizado. Meltdown tem, ainda, a capacidade de criar algumas harmonias – e isso acontece em temas como Madman II ou Dogs Of War – que acabam por tornar o disco menos homogéneo e com dinâmicas mais atrativas. [74%]

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