Reviews: Fernanda Paulo; Tiroliro & Vladimir; Karney; Choclat Frog; Lefty

 

Tábua Rasa (FERNANDA PAULO)

(2022, Independente)

Tábua Rasa é mais um daqueles projetos que mostra o nível a que atingiu o panorama musical nacional. Fernanda Paulo é atriz e este conjunto de 11 temas estão divididos entre a canção (com forte destaque para o fado, embora nem sempre de uma forma objetiva) e a encenação. São 11 histórias musicadas, que respiram representação,  teatralidade e cinematografia por todos os poros e que passam por diversos estados de espírito. Muitos desses com um raro sentido de humor, fruto de uma capacidade lírica assinalável. Musicalmente, a guitarra portuguesa divide o protagonismo com um acordeão que transmite uma vibe parisiense. Uma junção Paris-Lisboa, já tantas vezes cantada, e que aqui se reflete em tons de uma sublime emotividade, acentuada por suaves linhas de piano. [85%]



 

Os Imparáveis (TIROLIRO & VLADIMIR)

(2022, Independente)

A revolução tinha acontecido há pouco tempo e havia vontade de se criar algo que fosse inovador. O duo Gimba e Jorge Galvão (mais tarde transformados nos Afonsinhos do Condado com a entrada de Nuno Faria, em 1986) andavam na escola António Arroio e lá começaram a dar os primeiros acordes e a compor as primeiras canções. As mesmas que agora a dupla decidiu reunir com a curiosidade de ter sido tudo de memória pois, aparentemente, já não havia registos escritos ou gravados destes momentos musicais. Do conjunto de 18 faixas, apenas uma já era pública, trata-se de Hoje é o Dia pois apareceu no disco Açúcar dos Afonsinhos do Condado. Todas as outras são completas novidades, sendo certo que alguns dos momentos não passam de meros esboços musicais que nunca chegaram a ser devidamente desenvolvidos. Entre o jazz e a música popular, sempre com letras bem-humoradas e jogos de palavras (tão ao jeito de Gimba!), e com o registo acústico em enorme destaque, esta coleção marca um período único na música portuguesa e apresenta o passado de uma das mais emblemáticas figuras do nosso cancioneiro. [79%]



 

Gonna Be Beautiful (KARNEY)

(2022, Independente)

À semelhança do que havia feito com No Mercy, em 2018, Anna Karney e a sua banda, Karney, volta a lançar um EP onde apresenta uma mescla de novos temas com novas roupagens de outros mais antigos. Michael Rosen, que trabalhou com Rancid e Tesla, surge neste EP como engenheiro e produtor e, sem conhecer a sua efetiva influência, diremos que Gonna Be Beautiful é, e facto, uma belíssima coleção de temas eletroacústicos, sendo o próprio tema-título um dos melhores exemplos. Outro momento alto deste EP de cinco temas, é Heart Of Gold, encerramento com um clássico de Neil Young, onde o trompete (cortesia de Bill Ortiz) ajuda a elevar o tema a outro nível de interesse. Naturalmente o interesse comercial de Gonna Be Bautiful desvanece-se um pouco por ser um EP e com algumas versões, mas artisticamente o que aqui está incluído é muito interessante. [85%]



 

Snapshot (CHOCLAT FROG)

(2021, Independente)

Tim e Rainer Ludwig (sogro e genro) são os dois alemães que têm vindo a trabalhar no seu projeto Choclat Frog desde 2003. Ocasionalmente, durante este trajeto ainda estiveram como trio, com a inclusão de Christof Engel, mas, para Snapshot, voltam ao seu formato tradicional. Este é um disco onde 60 minutos não são demasiado para explorar todas as complexas estruturas criadas pelo duo com pontuais ajudas de convidados, essencialmente para os solos de guitarra. A música de Snapshot é profundamente elaborada, situando-se num limbo entre o prog rock e o jazz de fusão. E também é composta por guitarras pesadas alternando com teclados trabalhados, tudo envolvido em arranjos altamente experimentais. O momento alto (e de todo inesperado!) surge na faixa Part IV onde podemos ouvir excertos de Os Lusíadas, recitados no melhor português que um alemão pode falar! A prova fundamental de que para este projeto não há limites nem na parte instrumental nem na linguística! [85%]




Andrómeda (LEFTY)

(2021, Sony Music)

Sempre em português com letras com profundidade, inclusive apresentadas como autobiográficas por parte da letrista e vocalista Leonor Andrade, e um enredo que se vai acompanhando ao longo dos 10 temas que compõem Andrómeda. É isso que os Lefty, nova banda nacional composta por gente com créditos firmados no meio, nos propõem num álbum de estreia marcado pela crueza do rock e pelo equilíbrio estético de canções fortes, compactas e poderosas. Um som cru e direto que, nesse particular, se pode aproximar do punk, também fruto de uma distorção agreste qb. A banda afirma que pretende aproximar-se das bandas de garagem do século passado e bem se pode dizer que, mesmo levando em linha de conta a produção clara e forte, esse objetivo foi atingido. [80%]


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