Da união entre os cinco
herdeiros de José Afonso e a editora Lusitanian Music surge a Mais 5
responsável pela reedição da obra do seminal artista nacional. A primeira fase
está concluída, e nela se incluem 11 redições de toda a discografia de Zeca do
período da Orfeu, ou seja, entre 1968 e 1981. Por isso, eram muitos os motivos
para irmos conversar com Nuno Saraiva da Mais 5 sobre estas importantes
reedições. Um trabalho que não está concluído, como nos refere o próprio.
Olá, Nuno, tudo bem?
Antes de mais deixa-me dar-te os parabéns pelo trabalho que a
Mais 5 tem vindo a realizar. Mas, antes da editora, podemos começar pelo seu
mentor – o que te motivou a levar a termo este projeto?
Boa noite, Via Nocturna! Muito
obrigado. O projeto da Mais 5 nasceu através de um desafio de Pedro
Afonso, filho de José Afonso, através do qual tive o prazer de
conhecer melhor os restantes elementos da família. Na verdade, não foi
motivação própria, ou seja, não foi uma iniciativa minha. A família veio ter
comigo e eu não pude dizer que não; apresentei então uma proposta e foi aceite,
entre as muitas outras que tinham em cima da mesa. Tem sido uma honra ímpar
colaborar com eles neste projeto da Mais 5 e também um grande desafio -
é preciso um sentido de missão como só o próprio José Afonso poderia
inspirar.
Agora que está concluído, e olhando para trás, qual o momento mais excitante e o mais
problemático deste trajeto?
Bem… não está, na verdade concluído…
é a intenção da família reunir e editar toda a obra… mas pronto, por agora já
editámos 11 álbuns, de 1968 a 1981, e de facto é uma grande sensação de missão
cumprida. Momentos excitantes ouve muitos… como o Rui Pato em direto na Antena
1 a dizer que nesta masterização consegue ouvir coisas que se lembra de ter
gravado, mas já não ouvia há décadas… e depois ter três discos chegar ao número
um do Top de Vendas em 2022 (Cantigas do Maio, Venham Mais
Cinco, Coro dos Tribunais), é incrível fazer com que a música de José
Afonso chegue a novos públicos, com a qualidade de som que merece. O mais
problemático foi mesmo os prazos de fabricos e entrega do vinil… e talvez
também os custos de manufatura a subir durante este último ano. Mas tudo se
resolve com boa vontade.
Quanto à editora Mais 5, o seu nome surge a partir da canção Venham Mais Cinco,
estou certo?
Sim e não… na verdade o nome completo
da editora é Lusitanian +5: ou seja, na minha idealização do projeto a Mais
5 somos eu mais os 5 herdeiros: a Zélia, Lena, Monique, Joana e Pedro. Mas
sim, claro que também faz a ponte com esse grande disco que faz agora 50 anos!
Vem daí a inspiração…
O seu nascimento
aconteceu apenas com o objetivo de reeditar a obra de José Afonso?
Exatamente.
No total quantas e
quais as obras reeditadas? E ao longo de quanto tempo?
Foram 11 álbuns até agora, desde setembro
de 2021 até ao momento atual: Cantares do Andarilho (1968), Contos
Velhos Rumos Novos (1969), Traz Outro Amigo Também (1970), Cantigas
do Maio (1971), Eu Vou Ser Como a Toupeira (1972), Venham Mais
Cinco (1973 - faz agora este mês 50 anos!), Coro dos Tribunais
(1974), Com as Minhas Tamanquinhas (1976), Enquanto Há Força
(1978), Fura Fura (1979) e Fados de Coimbra e Outras Canções
(1981).
Houve algum trabalho adicional a estas obras tanto no aspeto
gráfico, quanto ao nível da produção dos temas?
Sim. A partir dos arquivos da família,
todos os masters ou discos foram masterizados pelo Florian Siller,
no Soundgarden Tonstudios, em Hamburgo, tendo o formato vinil LP como
ponto de partida. A partir desse novo master, mais dinâmico, declinou-se
então os formatos CD e digital e foram editados também alguns singles
digitais com novas capas. Todo o design visual foi ao encontro do
intuito original dos designers originais, com quem o nosso designer João
Morais (aka O Gajo) colaborou de forma estreita. Ou seja,
tivemos a honra de trabalhar diretamente com José Santa-Bárbara (9
capas) e José Brandão (Coro dos Tribunais), por exemplo.
Se sim, quais foram os
pormenores aos quais dedicaram mais atenção?
Todos! Desde o tratamento do som à reconstrução
dos designs originais. Claro que passam sempre gralhas, mas fomos à
descoberta de algumas gaffes históricas também, como por exemplo o facto
do alinhamento original do Cantigas do Maio não bater certo entre o
alinhamento na contra capa e o que se ouve no disco. Noutras situações faltavam
alguns créditos de fotografias, por exemplo… tentámos dar atenção a tudo isso
enquanto também cometemos, inevitavelmente, algumas gralhas nossas - que vamos
corrigindo e melhorando com cada novo fabrico.
Estas foram as obras
que originalmente trouxeram o selo Orfeu, estou certo? Há mais algum álbum que
não tivesse sido incluído?
Estes são efetivamente esses 11
álbuns que editamos entre 2021 e 2023 que originalmente foram editados pela Orfeu.
Depois da Orfeu, cronologicamente, há mais 3 a seguir, o concerto do
Coliseu ao vivo em 1983 e o Como Se Fora Seu Filho e Galinhas do Mato,
já dos anos 80. É a intenção da família também os editar, pois a obra de José
Afonso não termina com o Fados de Coimbra e Outras Canções.
Esperamos trazer boas novas em 2024.
Todas estas edições
foram consertadas e tiveram o aval dos herdeiros do José Afonso, não é verdade?
Absolutamente, a iniciativa partiu
deles. Tenho reuniões regulares, no mínimo quinzenais, com a família e tudo o
que a Mais 5 faz é com o aval da família, se não mesmo para dizer, por
iniciativa e vontade dos mesmos. É um prazer trabalhar com todos eles.
Nesse sentido, em que pé está aquela situação da Movieplay ter interposto uma providência
cautelar para impedir estas reedições (que, pelos vistos, não conseguiu!)?
Não existiu nenhuma providência
cautelar. É uma “não-situação” que só chegou à imprensa pela péssima qualidade atual
do jornalismo de quem publicou essas pseudo “notícias” em 2021.
Com a conclusão deste
ciclo de reedições, qual será a próxima aposta da Mais 5?
Lá está… quem falou em “conclusão”…?
Só se for o fechar do ciclo da Orfeu… mas a obra de José Afonso
não termina aí…
Quem quiser adquirir
estas obras, onde o poderá fazer?
Neste momento, em qualquer boa loja
do nosso país que venda LPs e CDs de qualidade, desde a FNAC à Restart
na Amadora, por exemplo. Também podem ser adquiridos fora de portas, estão
distribuídos às lojas em Espanha, França, Alemanha, Suíça, Áustria e EUA. E
claro, no formato digital por todo o mundo em todas as boas plataformas de streaming
e downloads. Se tudo isso não chegar, a Mais 5 também aceita
encomendas diretas e vai abrir uma nova loja online em 2024. Basta
escrever para label@mais5.net
Muito obrigado, Nuno!
Queres acrescentar mais alguma coisa?
Obrigado, eu! Sim, gostava de
acrescentar que a Mais 5 e a Lusitanian editaram a semana passada
o livro Santa-Bárbara, Capista de Zeca, de Abel Soares da Rosa,
uma excelente crónica do grande trabalho - pioneiro - do design das
capas de José Afonso por parte de José Santa-Bárbara. É um livro
que vale a pena, e o melhor presente de Natal em Portugal este ano.
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