Entrevista: Paula Teles

 

Entre o fado e o metal, Paula Teles tem trilhado um percurso artístico singular. Depois do impacto de Desencanto, o seu álbum de estreia, a artista regressa com Entreparedes, um trabalho que homenageia Carlos Paredes e aprofunda a fusão entre a melancolia do fado e a intensidade do metal. Nesta entrevista, Paula Teles fala-nos sobre o processo criativo por detrás do novo disco, numa conversa íntima e reveladora com uma artista que faz da emoção e da autenticidade as suas maiores armas.

 

Olá, Paula, tudo bem? Como tens passado?

Olá! Estou bem, obrigada. Espero que desse lado também esteja tudo bem.

 

Depois de um Desencanto que foi tão bem-recebido, sentiste algum tipo de pressão quando começaste a compor para este novo trabalho?

Estaria a mentir se dissesse que não. Tentamos manter sempre presente que o mais importante é o que queremos fazer com a nossa arte, independentemente de opiniões/pressões externas. No entanto, é bastante mais agradável e gratificante saber que o nosso trabalho foi compreendido e aceite. Na reta final da fase de composição do álbum, enquanto ouvia as músicas vezes sem conta, senti o peso do Desencanto e duvidei se o EntreParedes iria conseguir tocar as pessoas.

 

Foi mais fácil ou difícil partires para esta composição que mescla o fado e o metal, depois da primeira experiência?

Tanto eu como o Jorge sentimos que foi mais difícil. Desencanto foi uma experiência ingénua, que não tinha anexada a si qualquer tipo de expetativa. Tentamos seguir as pegadas deixadas pelo trabalho anterior e isso acaba sempre por limitar a criatividade.

 

Em entrevistas anteriores, mencionaste a influência de artistas como Amália Rodrigues e Carlos Paredes na tua formação musical. Essas influências voltam a manifestar-se neste novo trabalho?

Sem dúvida. São influências que estarão sempre presentes, de forma consciente ou inconsciente. Nem sempre damos conta, mas o nosso trabalho resulta precisamente disso, do conjunto das influências que nos foram moldando.

 

Aliás, o título deste teu novo trabalho, Entreparedes, remete-nos, precisamente para o mestre da guitarra portuguesa. Existe, efetivamente, alguma ligação ou homenagem ao Carlos Paredes?

Existe. Este ano celebra-se o centenário do Carlos Paredes e quisemos deixar a efeméride marcada e destacada; não só do ponto de vista musical, mas todo o texto deste álbum remete para uma determinada época histórica da qual fizeram parte diversos músicos, entre eles Carlos Paredes.

 

A guitarra portuguesa desempenha um papel central em Entreparedes. Desta vez, como foi o processo de integração deste instrumento tradicional num contexto de metal que, agora, se afigura mais pesado e complexo?

Com Desencanto sentimos que a guitarra portuguesa entrava, de certa forma, em conflito com outros instrumentos (incluindo a voz) sempre que tentávamos arriscar nas linhas de composição. Para ultrapassar estas limitações, o Jorge construiu, de raiz, do nada, uma guitarra portuguesa com certas caraterísticas que tornam o seu som mais “aveludado” e “cheio”, quando comparada com as guitarras portuguesas padrão. Isso contribuiu para que fosse possível explorarmos novos caminhos e marcar a diferença do ponto de vista sonoro.

 

Em termos instrumentais quem te acompanha nesta nova aventura musical? A mesma equipa?

A mesma equipa. Quando iniciamos um trabalho criativo tudo fica mais fácil se confiarmos na equipa que está connosco. Tenho todos os motivos para acreditar que, com outros músicos, o resultado não seria o mesmo.

 

À boa maneira do fado, as letras de Entreparedes exploram temas como a melancolia, o desencanto e a saudade. Podes falar-nos sobre o processo de escrita e as inspirações por trás destas composições?

Trabalho numa IPSS que acolhe idosas, muitas delas com demência. Todos os dias ouço histórias de infâncias difíceis, de vidas com muitas provações, histórias semelhantes às que sempre ouvi a minha mãe contar. São histórias que se vão perdendo, se não ficarem registadas; são essas histórias que me motivam a compor, a escrever. São letras rurais, vindas de um ambiente onde a música serve as alegrias e as tristezas com a mesma convicção.

 

Desencanto teve apenas edição digital em formato independente, mas Entreparedes tem o selo Ethereal Sound Works e também terá uma edição física. Primeiro, como se proporcionou essa ligação à ESW?

A ligação inicial foi proporcionada pelo Luís Câmara, que tem um projeto ligado à ESW. Depois disso, foi bastante fácil chegarmos a um diálogo com o Gonçalo que é uma pessoa bastante acessível e compreensiva.

 

Segundo, achas que continua a haver uma procura por material física para este tipo de sonoridade?

Eu acredito que muita gente, tal como eu, continua a comprar o formato físico; a sensação de termos algo palpável nunca vai ser substituída pelas plataformas de streaming.

 

Nesse sentido, alguma vez poderemos ver Desencannto em formato físico, seja ele CD ou vinil?

Gostaria muito que assim fosse. Espero que, um dia, a ESW acredite que vale a pena esse investimento.

 

Voltaste a conseguir convencer o Björn Strid a cantar em português, como tinha acontecido no Jogo do Silêncio?

No plano inicial, o álbum tinha somente 6 canções. Enviei o material pronto para o Bjorn ouvir e para dar a sua opinião; depois de ouvir foi imensamente simpático e disse que gostava de cantar neste álbum também. Conversei com o Jorge e achamos melhor compor uma nova música tendo em vista a parceria com o Bjorn. Foi assim que surgiu a (Re)Encarnado.

 

Sabemos que Lilith’s Revenge é um capítulo encerrado na tua história artística, mas quanto aos Waterland? Há novidades?

Sim. Mas só posso partilhar essas novidades quando tiver autorização da banda.

 

Após o lançamento de Entreparedes, quais são os planos que se seguem, nomeadamente em termos de palco ou outros?

O nosso desejo é levar este projeto para o palco. Contudo, é demasiado dispendioso alugar uma sala e os festivais não sentem confiança suficiente para apostar em nós, uma vez que, provavelmente, não terão o retorno desejado. O foco será sempre escrever música nova e tentar promover o nosso trabalho o melhor possível. Quanto ao resto...não depende apenas de nós.

 

Obrigado, Paula. Que mensagem gostarias de deixar aos vossos ouvintes e aos teus fãs?

Eu é que agradeço a oportunidade de falar sobre este projeto. Quero muito agradecer a toda a gente que nos ouve e que partilha a nossa música com quem ainda não a conhece. Esse apoio motiva-nos a continuar.

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