Conhecido da cena alternativa de Viseu, Nuno Mendonça
tem sido uma presença constante e multifacetada na música portuguesa. Com presença
em projetos como Zurrapa e Tvmvlo e envolvimento em diversos coletivos
artísticos da cidade, traz agora à luz uma nova aventura sonora: os Spiral
Sputnik. A banda, formada recentemente, apresenta-se com uma energia crua e
descomprometida, com raízes no rock, mas ramos que se estendem por outras ambiências.
Em conversa com Via Nocturna, Nuno falou-nos sobre a génese do projeto, o
processo criativo do disco de estreia Noir Déluge, e a vontade de
devolver ao rock o seu lado mais visceral e autêntico.
Olá, Nuno, tudo bem? Obrigado pela disponibilidade. Para
começarmos, podes apresentar este projeto Spiral Sputnik – quando surgiu, com
que motivações e como tem sido o vosso trajeto até aqui?
Viva!!! Antes de mais, obrigado pelo apoio! Os Spiral
Sputnik surgiram como quase todas as bandas, de conversas um pouco a
brincar. A vontade de fazer rock, pura e simplesmente rock. Com
influências de tudo e mais alguma coisa do que ouvimos e do que já ouvimos. Sou
péssimo com datas e posso estar a dizer uma mentira, mas tenho ideia de que nos
começámos a juntar algures em 2023.... na pior das hipóteses no início de 2024.
O Coutinho (guitarrista) tinha umas malhas idealizadas e queria experimentá-las
com a Dani, mas não se queria envolver muito, nem queria tocar. Falou comigo e
fui "obrigado" a pegar na guitarra de verdade. Ainda só em conversas,
o Joca foi logo o baterista pensado e, daí a irmos fazer um ensaio, foi rápido.
Como foi o processo de formação da banda e a escolha do nome?
Tem algum significado especial ligado ao vosso som ou temática?
O nome, depois de algumas
voltas, foi sugerido pelo Coutinho e aceite por todos. A ideia vem do termo russo "sputnik"
que significa algo como "companheiro de viagem". Será talvez uma
espiral de experiências sonoras, uma viagem por tudo o que nos influenciou. Os
companheiros nessa viagem seremos todos nós, quem toca e quem ouve.
Quais são as vossas principais referências, tanto a nível
musical como temático, uma vez que a vossa sonoridade vai beber a distintas
influências?
As influências da banda
são muito diversificadas. Embora existam alguns pontos comuns, todos ouvimos
coisas muito diferentes. E dentro de todas essas diferenças, o rock mais
"purinho" talvez seja onde mais facilmente nos encontramos todos. Por
isso é fácil encontrar influências do rock dos 70's, dos 90's, cenas
mais alternativas, punk.... e até cabaré. Não consigo mesmo definir a
banda sem ser "rock".
Os membros já trazem experiências de outros projetos. De que
forma essa diversidade influenciou o som e a identidade da banda?
Obviamente esse é um
fator determinante no resultado final. Por exemplo, é difícil esquecer que toco
punk ou metal, ou que a Dani é atriz... no processo de criação
ou nos arranjos, inconscientemente, essas experiências aparecem em determinados
momentos. É inevitável, é a nossa vida. Mas acho que são essas vivências
individuais e díspares que moldam definitivamente o nosso som e a nossa identidade.
Talvez quem ouça, não sinta ou não entenda isso, mas nós sentimos. e gostamos.
Noir Déluge
é um título intrigante. O que representa para vocês? Existe um conceito ou
narrativa que une as músicas do álbum?
Noir Déluge é
inspirado na expressão francesa de Luís XV “après moi, le déluge” que significa
"depois de mim, o dilúvio". É um bocado isso, depois de nós, até pode
vir um dilúvio negro. Até lá, continuaremos. Não há propriamente uma narrativa,
ou tão pouco essa preocupação. Abordamos muito a inevitabilidade das mudanças e
a forma pacífica de as encarar e de lidar com elas. A sequência das letras vai
surgindo um pouco como que se de uma carta se tratasse.
Como descreverias a vossa abordagem musical e quais os elementos
que consideram essenciais na vossa sonoridade?
A nossa abordagem é muito
livre, não colocamos barreiras a nada. O facto de existir uma raiz mais rock
não significa que não exploremos outros campos. O facto da Dani ser atriz ou de
o Joca ter uma abordagem muito livre na bateria faz com que muitas vezes uma
malha que o Coutinho criou e que "no papel" estava pensada para soar
a algo... na sala de ensaio torna-se numa coisa completamente diferente. Portanto,
essencial é haver sempre uma guitarra, o resto é invariavelmente um enorme
"vamos ver para onde isto vai".
Vocês assumem-se como uma banda de rock, para revitalizar o rock. Nesse sentido, de onde
surgem influências como a abertura com tons de fado e algumas aproximações ao cabaret?
Sim, cada vez mais nos
parece que existe medo em fazer rock. Há uma tendência para polir tudo e
tornar tudo num "radio friendly". É rock, e a meio percebes
que é mais pop que rock. O rock não tem de ser (mas
devia) "feio, porco e mau".... mas tem de ser, no mínimo, sujo.
Tem de haver algum sentido de underground e, se pensarmos um pouco, o
fado verdadeiro também o tem. O cabaret também o tem. Da mesma forma que
os blues ou o jazz. Acho que todas as influências são positivas,
desde que sejam verdadeiras e não plásticas.
Sendo um projeto novo, como foi o processo de composição e
gravação deste primeiro álbum? Houve desafios inesperados ou momentos de
descoberta no estúdio?
A composição foi
maioritariamente do Coutinho e da Dani. Ele criou as malhas e apresentou-nos as
ideias. Depois, de forma natural, acabámos por desconstruir uma série de
coisas, porque à medida que pegávamos nas músicas, cada um ia incorporando
elementos próprios e ideias. A parte de estúdio foi uma aventura, decidimos
fazer as captações todas nós próprios e, se não tivéssemos o baterista que
temos, acho que teríamos uma amostra do disco que temos. Ele inconscientemente
tem um lado de produtor e isso ajudou muito. Não só por saber operar com o bicho
(programas de gravação e afins), mas também por ter um enorme sentido crítico e
de composição. Momento de descoberta foi mesmo perceber o que a Dani conseguia
fazer com a voz. Ouvi-la nos ensaios era uma coisa, mas em ambiente de estúdio
foi mesmo uma descoberta. Até porque para ela tudo aquilo era uma novidade,
embora já tivesse feito algumas participações.
Como sentes que Noir Déluge se possa
posicionar na cena musical atual? Existe um público-alvo que procurem atingir
ou deixam a música falar por si?
Para mim, essa talvez
seja a pergunta mais difícil e a única resposta que tenho é: não faço a menor
ideia! Nem sei se realmente este disco tem espaço na cena musical atual, mas
muito sinceramente, perdoa-me o francês, mas não me poderia estar a cagar mais
para isso. O público-alvo é qualquer pessoa que se identifique com a música,
qualquer pessoa que sinta que o que estamos a fazer lhe diz alguma coisa. Nem
que seja só bater o pé.
Já agora que falamos em público, como têm sido as reações ao
álbum até agora? Sentem que o público tem captado a essência que quiseram
transmitir?
O disco tem tido reações
positivas, por vezes até de pessoas que não esperávamos. Acho que conseguimos
transmitir o essencial, o ambiente. Agora claro, cada um interpretará isto à
sua maneira. Mas até ao vivo, tenho ficado com a sensação de que as pessoas
percebem o que pretendemos dizer.
Sabemos que já têm tido oportunidade de subir a palco. O que têm
previsto para os próximos tempos?
Sim, já fizemos duas
datas e estamos com mais algumas marcadas. Somos uma banda nova (de almas
velhas), temos consciência que não é fácil "furar" e desatar a tocar
em todo o lado. Vamos trilhando o nosso caminho com calma. Tivemos agora no fim
de abril uma data com Zurrapa, temos mais algumas coisas marcadas e
faladas e vamos andando.
Por fim, que mensagem gostarias de deixar aos vossos fãs e a
quem está agora a descobrir Spiral Sputnik?
Tenho uma péssima relação
com essa expressão dos "fãs"...! Mas ok, para quem nos ouviu
ou viu e achou interessante, a mensagem é de agradecimento e que continuem na
viagem connosco, porque isto ainda não acabou. Para quem está a descobrir, a
mensagem é a mesma, saltem, que há sempre lugar para mais um e vamos embora! Um
grande abraço para vocês da Via Nocturna, muito obrigado e continuem a
remar!!



!!!
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