Trovoada (O GAJO)
Rastilho Records/Lusitanian Music
Lançamento: 28/março/2025
Quando, em
2017, João Morais deixava os rockers Gazua em stand by,
mergulhava profundamente nas águas do folk com uma viola campaniça e
lançava Longe do Chão, certamente estaria (ele e todos quantos os vinham
acompanhando) longe de imaginar o crescimento que o seu projeto O Gajo
alcançaria. E se também dúvidas haveria, na altura, sobre que futuro para um
projeto assente na campaniça, João Morais, a sua criatividade, as suas
conexões e os álbuns seguintes se encarregariam de as desvanecer. Os trabalhos
foram-se sucedendo, as fronteiras foram sendo derrubadas, a expansividade do
seu som foi sendo, cada vez mais, uma marca única e muito própria. Até que
chegamos a 2025 e, pela primeira vez, um álbum de O Gajo é mais que um
músico e seus convidados – é um verdadeiro trabalho de uma banda que abre
muitas outras portas, aquelas que já tinham sido entreabertas ao longo dos
últimos oito anos e outras que, eventualmente, ainda se encontravam totalmente
encerradas. Agora, em Trovoada, título deste novo registo, a campaniça
deve estar muito feliz pelas parcerias estabelecidas com outros criadores de
sonoridades que com ela perfeitamente se conjugam. Falamos de bouzouki português,
percussões, baixo, sanfona, cavaquinho, flauta, gaita de foles e adufe. Mas a
grande novidade são os temas cantados. É certo que Náufragos, do álbum Não
Lugar, já era cantado, na altura por Kátia Leonardo, mas agora é
diferente. São seis temas cantados pelo próprio João Morais (e mais três
vocalizados, mas sem letras e um outro com recurso a spoken word e
vocalizos), que trazem à ribalta a beleza e profundidade dos seus poemas (que,
sinceramente, já tínhamos saudades!) Musicalmente, Trovoada é do mais
genial que tem sido feito na música portuguesa: recupera o folk
proveniente de diversas regiões, abraça o exotismo mourisco e as raízes
africanas, explora os fundamentos da canção de intervenção, na senda do que Zeca
e José Mário Branco fizeram, arrisca coros a capella, injeta um
viciante groove trazido pelas percussões e baixo. Este é, claramente, um
gigantesco passo em frente artisticamente falando, embora sem nunca cortar o
cordão umbilical, ou seja, mantendo sempre o destaque à sua campaniça. Aliás,
nesse aspeto, Baile de Búfalos, que funciona quase como uma introdução, Barca
do Inferno, Piratas do Tietê e Povo da Fenda, são os temas
que mais tocam no passado e, ainda assim, sendo capazes de se reinventar. Outro
aspeto relevante é a redução do tempo médio de duração das canções. Nada contra
temas longos, mas, em Trovoada, percebe-se uma maior objetividade e uma
muito maior definição do contexto musical. E, num álbum que assenta as suas
bases na tradição e na ancestralidade, é de louvar e enaltecer a sua capacidade
inovadora e que conquista de novos espaços e dimensões artísticas e musicais. E
assim, como quem atravessa um caminho de terra batida que aos poucos se
transforma em estrada larga e fértil, Trovoada é um marco. E O Gajo,
com a sua viola campaniça ao peito e o coração em expansão, navegou do íntimo
para o coletivo, do experimental para o essencial, do silêncio das cordas para
a voz que agora canta — e que ecoa. E se em 2017 estávamos longe do chão, em
2025, estamos mais perto do céu. [93%]
Highlights
Pedra Sobre
Pedra, Filhos do Vendaval, Mar de Gente, Povo da Fenda, Carregando a Cruz,
Velho Tocador
1. Baile de
Búfalos
2. Pedra Sobre
Pedra
3. Filhos
do Vendaval
4. Flores
Silvestres
5.
Marabunta
6. Mar de Gente
7. Piratas
do Tietê
8. Povo da
Fenda
9. Barca do
Inferno
10.
Carregando a Cruz
11. Velho
Tocador
Line-up
O
Gajo – viola campaniça, bouzouki português, vocais
Isaac
Achega – percussão
Francesco
Valente – baixo
João
Martins – sanfona, cavaquinho, flauta
Diana
Ferreira – gaita de foles, adufe
Internet
Edição
CD: Rastilho Records
Vinil/Digital: Lusitanian Music

Comentários
Enviar um comentário