Review: Tormentos (HYUBRIS)

 

Tormentos (HYUBRIS)

Independente

Lançamento: 15/maio/2025

 

Há regressos que nos tocam mais do que outros. E o dos Hyubris é, sem sombra de dúvida, um dos mais sentidos, mais esperados, mais emocionantes que a memória recente nos pode oferecer. Passaram dezasseis longos anos desde Forja, mas a chama não se extinguiu e, com Tormentos, os Hyubris renascem de forma avassaladora, sem nunca trair a alma, sem nunca esquecer a sua essência, antes aprofundando ainda mais as suas raízes telúricas, a sua portugalidade bravia, a sua mística pagã. Curiosamente, ou talvez não, enquanto escrevemos estas linhas, somos assolados por uma monstruosa tempestade de trovoada. Lá fora, os céus rugem, os relâmpagos cortam a noite como guitarras em convulsão e a terra treme sob o peso da água. E é difícil não sentir esta fúria natural como um eco físico do que Tormentos representa: uma descarga de energia ancestral, feita de trovão e tradição, de grito e memória. Desde os primeiros acordes percebe-se que este é um disco que transpira identidade, mas que não se fecha nela. Ao longo de todo o trabalho, há um equilíbrio exemplar entre a matriz folk, com raízes nas melodias celtas, nos cantares tradicionais e nas danças medievais, e a intensidade do metal moderno, ora pesado e downtuned, ora elegante e progressivo. Um cruzamento de caminhos onde se tocam, sem estranheza, Madredeus, Trovante e Moonspell. A instrumentação é, em si, uma celebração das possibilidades sonoras da portugalidade. A guitarra portuguesa surge lado a lado com riffs densos e arrastados. As gaitas de foles e flautas dançam sobre bases rítmicas tribais, enquanto teclados criam atmosferas etéreas. O violino, presença recorrente, impõe-se como voz própria, conduzindo emoções e aprofundando texturas. Tudo é orgânico, mas meticulosamente construído. Nada soa forçado, tudo pulsa com verdade. Também a voz assume um papel multifacetado: há lugar para o canto tradicional, para o operático, para o spoken word, para o sussurro encantatório e para o grito rasgado. Como se cada palavra viesse do ventre da terra. E as letras… essas são um dos pontos mais altos de Tormentos. A tradição oral, o cancioneiro popular e o imaginário mitológico português entrelaçam-se de forma sublime. Mas é a poesia de Florbela Espanca, evocada com sensibilidade em dois momentos particularmente tocantes, que confere uma profundidade lírica rara e uma carga emocional arrebatadora. É a alma feminina, sofrida e intensa da poetisa alentejana a encontrar eco na voz dos Hyubris, numa simbiose perfeita entre palavra e música. Mas o mais notável é a coerência com que tudo se liga. Apesar da riqueza instrumental e da diversidade de registos, nunca há dispersão. Há uma linha condutora firme, uma alma comum que sustenta todo o disco. Este é, em última análise, um álbum com o peso do tempo, a sabedoria da tradição e a magia da criação. Um disco feito com o coração na mão, sem concessões, mas com generosidade. Tal como a trovoada que agora ruge lá fora, Tormentos é um chamamento à terra, à alma e ao sangue. Obrigado, Hyubris! Que esta tormenta nos continue a abençoar! [95%]

 

Highlights

Sonho, Malmequer, Avalon, Florbela, Celtiberos, Salácia

 

Tracklist

1.      Zeus

2.      Avalon

3.      Florbela

4.      Malmequer

5.      Celtiberos  

6.      Tormentos

7.      Sonho  

8.      Pedras ao Mar

9.      Salácia

10.  Morro Negro 

 

Line-up

Filipa Mota – vocais, flauta

João Rodrigues – teclados

Jorge Cardoso – guitarras

Lulla – bateria

Panda – baixo, guitarra portuguesa

Paulo Gerónimo – gaita de foles

Nor – gaita de foles

Tripa – baixo (5)

Miguel Berkemeir – violino

 

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