Entrevista: Hyubris

Depois de dezasseis longos anos de silêncio discográfico, os Hyubris estão de regresso com Tormentos, um álbum que deixa bem evidente que o posto cimeiro na cena folk metal nacional continua a pertencer-lhes. E que também mantém intacta uma identidade muito própria, agora reforçada por novas dinâmicas, como seja o recurso ao violino e a letras que evocam a tradição poética e mística nacional. Em conversa com a banda, falámos sobre este novo capítulo, o processo criativo, as vivências dos últimos anos e os desafios que ainda se avizinham.


Olá, pessoal, tudo bem? Obrigado pela disponibilidade. Já lá vão 16 anos desde Forja. Como se sentem agora, ao lançar este novo álbum? Há diferenças criativas?

Olá! Estes 16 anos foram de facto um interregno maior do que aquele que esperávamos, mas o que conta é que nunca deixámos de manter a vontade e o objetivo de lançar um novo álbum cujas músicas refletiriam o nosso crescimento tanto a nível pessoal como a nível de composição e sonoridades novas, sem, no entanto, perdermos a nossa identidade enquanto banda de rock/folk/metal e outras (!). As diferenças criativas não serão assim tantas, uma vez que a autoria e processo de construção dos temas se mantêm quase como na origem da formação de Hyubris: no início do ensaio no nosso estúdio, durante o “aquecimento”, surgem por vezes pequenos trechos de poucos segundos de melodias, criadas na hora, que achamos com potencial para se tornarem músicas completas e começamos então a trabalhar nelas! Outras vezes são músicas que foram criadas nas nossas “cabeças”, através de melodias que assobiamos ou cantarolamos e que não nos saem da cabeça até a reproduzirmos no ensaio, ou ainda músicas já compostas individualmente por alguns elementos da banda e que levam por vezes uma nova “roupagem”, mais de acordo com a sonoridade da banda!


Mas, dentro desses 16 anos estiveram oito sem tocar ao vivo, não foi? Ainda assim continuaram a compor? Houve alguma canção que tenha nasceu nesse período e que apareça agora em Tormentos?

Não sabemos se foram de facto 8 anos sem nenhuma atuação ao vivo, mas foram alguns com certeza! Nesse período de tempo nunca deixámos de ter a vontade de tocar ao vivo, mas vários e variados acontecimentos atrasaram um pouco todo(s) o(s) processo(s) relativo(s) a tudo o que envolve a composição, organização de agenda, etc., e que fizeram com que houvesse este compasso de espera. Dentro deste intervalo de tempo, há que salientar e saudar e alegrar-nos com a vinda das nossas crianças, os Mini-Hyubris, se quisermos! Quase todas as músicas do álbum Tormentos nasceram após esse período, tirando uma ou outra que já estaria em desenvolvimento ou até já pronta a editar.


O regresso de Panda ao palco em agosto de 2023 foi um momento emocionante. Como é que o acidente mudou o vosso vínculo como banda/família?

O acidente do Panda deixou-nos a todos profundamente tristes e abatidos, mas a sua força interior é tanta que foi ele próprio a animar-nos! Este trágico acidente veio trazer-nos talvez uma maior reflexão sobre os valores da vida, as suas prioridades e o quanto nos podemos entreajudar para que todas as dificuldades da vida possam ser mais aceitáveis, toleráveis. Cremos que nos aproximou ainda mais enquanto banda/família. Grande Panda!


Este regresso faz-se com um visual cénico (fadas, fogo, malabares) e novas roupagens; que importância visual têm os espetáculos para vocês?

Achamos que o fator visual é uma ferramenta muito importante para dar ainda mais magia e sentimento às nossas músicas, configurando um espetáculo de som e imagem que engrandece as nossas atuações, complementando toda a energia e performance de palco de todos nós, com destaque para a “monstruosidade” de desempenho da Filipa!


Quanto ao novo álbum, de onde surgiu o título Tormentos e qual o seu significado?

O nome acabou por ser consensual. Cada um de nós terá em Tormentos o seu próprio significado, o seu próprio sentido, mas é comum a todos a necessidade de os combater e de se reerguer após esses períodos de tormentos. Não há muito como fugir ao próprio peso e significado da palavra!


Qual o conceito por trás das letras? De que forma a nossa história e os nossos poetas se encaixam nos vossos textos?

As letras deste álbum recriam um tempo vivido pelos elementos da banda. São poemas que recriam sentimentos espontâneos, misticismo, fantasia, mitologias ou até mesmo invocação à história dos nossos antepassados. Os nossos poetas portugueses são de grande inspiração para nós, em álbuns anteriores escolhemos Antero de Quental e Zeca Afonso. Mas neste álbum selecionamos dois poemas de Florbela Espanca, pela nossa admiração pela poetisa e pela forma ímpar e "atormentada" com que Florbela escrevia. Concluindo, podemos encontrar nas letras do álbum... almas atormentadas pela inquietação, superação, nostalgia, sonho, batalhas internas, mas sobretudo a tormenta do amor pela música!!!


As vossas letras, por vezes inspiradas na tradição oral, no simbolismo ou mesmo em autores portugueses (como se sugere em temas como Florbela), influenciam a escolha instrumental e arranjos?

Nem sempre ou quase nunca! É precisamente o contrário: temos as músicas e os arranjos musicais e a maior parte das vezes é a Filipa quem escolhe que poemas e poetas hão de ser homenageados e referidos nos nossos temas. Poder-se-á dar o caso em que uma letra original de um ou mais elementos da banda tenha um conteúdo mais histórico, ou mais folclórico e aí sim, poderá surgir a música depois da letra!


Considerando que alguns dos vossos temas evocam ambiências medievais e até pagãs, procuram alguma fidelidade histórica nos instrumentos usados? Ou o foco está mais na criação de uma estética própria?

Um pouco de ambos. Gostamos de pensar nos instrumentos como uma continuação do nosso corpo e da nossa mente, das nossas emoções e dos nossos sentimentos. A sonoridade final, através da combinação dos vários instrumentos quer de caráter clássico tradicional, quer de carater elétrico, é o que realmente nos importa!


Ao longo da vossa carreira, os Hyubris destacaram-se pela inclusão de instrumentos tradicionais como a flauta, a guitarra portuguesa ou a gaita-de-foles. Em Tormentos, esses elementos continuam a ter forte presença. Sentem ser uma imagem de marca que não poderia ser beliscada?

A família Hyubris foi crescendo em cima do palco e é hoje impensável dispensar a presença desses mesmos instrumentos. Neste álbum e nas últimas atuações ao vivo ainda acrescentamos um instrumento que há muito era desejado na sonoridade da banda: o violino, tocado com mestria por Miguel Berkemeier.


Em termos de palco, planeiam incorporar esses instrumentos tradicionais nas atuações ao vivo, ou haverá uma adaptação mais elétrica e direta das novas faixas?

Sempre que nos for possível, a preferência será estarmos todos em cima do palco (não necessariamente todos ao mesmo tempo ao longo da atuação) e quiçá encontrarmos outro instrumento para embelezar mais alguns temas (o acordeão seria uma maravilha!).


Há alguma colaboração especial em Tormentos, como convidados a nível instrumental, que mereça destaque?

Há aqui alguém que ainda não foi referido, mas que não é apenas um convidado: o Tripa (João), tem-nos acompanhado ao longo destes últimos concertos no baixo, pois o Panda ainda tem mazelas do acidente que não lhe permitem tocar. Um convidado que também é mais que um convidado e que participou neste álbum é o violonista Miguel Berkemeier, que sempre que lhe é possível encanta com o seu violino em cima do palco!


O álbum foi produzido no vosso próprio estúdio, o Rec’Art no Cruxifixo, não foi? Porque decidiram seguir essa via?

Para já, por uma questão de comodidade e prática! Tendo todas as condições necessárias, achámos que seria mais fácil, mais prático (e mais económico também!) trazermos o coprodutor e amigo de longa data Nuno Loureiro até nós do que deslocarmo-nos todos para Lisboa ou Porto, por exemplo. Aqui no Rec’Art, em Crucifixo (Tramagal –Abrantes), estamos em casa e longe das confusões das metrópoles e todo o processo pôde correr bem.


Dos concertos recentes, houve algum momento ou música no qual a reação do público vos tenha surpreendido?

O público que nos acompanha (e o que só nos conhece no próprio dia da atuação) tem sido incrível e continua a surpreender-nos! Os que já nos conhecem, cantam, dançam e divertem-se durante a atuação; já quem não conhece, quem passa por onde estamos a tocar, fica e mantém-se até final do concerto, o que nos dá uma satisfação incrível e que cada vez mais nos dá vontade de continuar e fazer mais e melhor!


Li algures que um fã vos apelidou de “Nightwish com o folk amplificado 100×”. Identificam-se com essa comparação? Como descrevem a evolução da vossa identidade musical?

Cada macaco no seu galho! É com muito gosto que recebemos esta comparação, mas os Nightwish são os Nightwish e têm merecidamente um reconhecimento mundial que é inegável! Nós somos amadores ou semiprofissionais, por assim dizer, e apesar de gostarmos muito do que fazemos, não lhe podemos dedicar o tempo todo senão morreríamos à fome! É muito difícil viver só da música em Portugal, principalmente nestes registos mais roqueiros, mais pesados, e por isso, todos temos de nos dedicar profissionalmente a outras coisas. Quanto à evolução da nossa identidade musical, cremos que estamos mais maduros, mais seguros do que queremos a nível de sonoridades e depois, quem corre por gosto não se cansa!


Depois de Tormentos, quais são os próximos passos? Tours, festivais internacionais, colaborações?

O ideal seria isso tudo, mas sem representação por parte de um agente, ou uma agência, é muito difícil conseguir esses passos, esses objetivos. Mas com determinação e vontade, lá chegaremos! Com a apresentação deste álbum este ano, gostamos de acreditar que para o ano surgirão todos os tipos de convites para essas mesmas festividades e outros!


Para terminar, que mensagem gostariam de transmitir aos vossos fãs e aos nossos leitores nesta altura de um regresso em tão grande nível?

Primeiro que tudo, agradecer-lhes do fundo dos nossos corações todo o apoio que temos recebido ao longo destes anos. É por eles e para eles que continuamos a fazer o que fazemos, com muito gosto e dedicação. E relembrar que a família Hyubris não se limita apenas aos músicos, temos um todo um conjunto de pessoas que se não fosse por elas, os Hyubris provavelmente não estariam tão fortes, ligados. E falamos de todas as pessoas que nos têm ajudado na divulgação do nosso trabalho, na ajuda de muita logística (merchandising, filmagens, etc.) empregue, e a todos eles a nossa maior gratidão! Esperamos vê-los a todos em breve e continuem com o vosso apoio incondicional para que possamos cada vez mais ser melhores e dar-vos música!!! Um grande bem-haja! 

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