Entrevista: Rick Montalvor

 


Depois de um interregno de quase sete anos desde The Highway of Regret, Rick Montalvor está de regresso com um novo trabalho que mergulha ainda mais fundo nos abismos do dark country blues que sempre o definiram. Skinless, é este novo álbum e marca uma celebração simbólica de uma década desde o seu primeiro concerto a solo. Menos centrado no imaginário do asfalto e mais imerso em atmosferas densas, Skinless revela um músico mais maduro, mas igualmente fiel ao seu universo muito próprio, onde o som e a imagem caminham lado a lado.

 

Olá, Rick, tudo bem? Obrigado pela disponibilidade para falarmos do teu regresso com Skinless, quase sete anos desde The Highway Of Regret. Que motivações e circunstâncias te levaram de volta ao estúdio e à criação deste novo disco?

Olá, Pedro! Tudo bem? Obrigado, eu pelo convite. Este ano, mais especificamente em maio, completaram-se 10 anos desde o meu primeiro concerto a solo, no lendário e extinto Sabotage, a convite do Fast Eddie Nelson. Eu queria assinalar a data de uma forma especial e no final de outubro reuni-me com a minha agência a Band·it para falarmos sobre isso.  A ideia de assinalar o 10º aniversário com um novo álbum foi um desafio que partiu da Band·it.

 

O teu som continua firmemente enraizado no dark country blues, mas sente-se aqui uma maior densidade atmosférica e introspetiva. Que novas abordagens exploraste neste disco, tanto a nível de composição como de produção?

Eu creio que neste disco me afastei um pouco do ambiente do asfalto (que era uma atmosfera predominante no conceito do disco anterior) e aproximei-me mais de guitarras cheias de reverb e tremolo. Neste disco não existe um único slide guitar; senti-me mais seduzido por riffs repetitivos que criassem uma espécie de mantra hipnótico.

 

O título do álbum, Skinless, sugere exposição, vulnerabilidade. De que forma este conceito se reflete nas letras e no ambiente geral do disco?

É o medo de nos sentirmos despidos e desprotegidos quando decidimos abandonar um comportamento que nos é confortável, mas tóxico, em busca de uma libertação.  O conceito do disco é inspirado na Ecdise, o processo em que as cobras se libertam da sua velha pele, cheia de marcas de cicatrizes e velhos parasitas e isso está refletido em todas as letras das canções do disco.

 

Há no álbum vários momentos em que se escutam narrações, declarações ou diálogos. Qual foi o teu objetivo ao incluí-los? São elementos ficcionais ou refletem experiências reais?

São elementos ficcionais, interpretados por mim e pelo talentosíssimo ator Richard Johnson. São sempre narrações que refletem experiências reais. Algumas minhas e outras, de pessoas que conheci e achei que as suas histórias mereciam ser contadas.

 

A componente cinematográfica está bastante presente na tua música e na tua estética. Enquanto cineasta amador, como trabalhaste, neste novo disco, essa ligação entre imagem e som?

É difícil explicar o que surge primeiro. Há casos (como o Ticking Clock) em que tinha já uma imagem muda que me assaltava incessantemente e o desafio era criar-lhe uma banda sonora que lhe fizesse jus. Houve outros casos que enquanto a música se escrevia, surgiam automaticamente na minha mente imagens que iam criando uma narrativa. O desafio é no final, ambas encontrarem-se.

 

Psychotic Carousel foi o primeiro avanço do novo álbum e veio acompanhado de um vídeo bastante imersivo. Que história quiseste contar com este tema e de que forma o vídeo complementa essa narrativa?

O Psychotic Carousel é uma analogia sobre a nossa fugaz passagem pelo mundo. O vídeo retrata a vida de uma mulher que vive num carrossel psicótico e sombrio, onde a alegria e a esperança são apenas ilusões passageiras. Um loop caricato de aproximadamente 80 voltas até que tudo acaba.

 

O tema The End Of The Road conta com uma voz feminina convidada. Quem é a intérprete e de que forma surgiu essa colaboração? Que importância tem esta presença na dinâmica e no simbolismo da faixa?

A intérprete é a magnífica Carolina Bernardo que a meu ver, com a sua dramática interpretação, transportou a canção para outro universo, bem como as participações da Mariana Rosa no Lap Steel e do Joaquim de Brito no Piano. A Carolina chegou a mim por intermédio do Produtor, Fred Gracias. Esta canção, contrariamente às outras, já tinha sido escrita em 2015, mas devido a não caber na narrativa do The Highway of Regret, não chegara a ser gravada. É uma canção desde sempre imaginada como um dueto e várias cantoras lhe deram voz. Emily Marques, Marie Lumiére, Catarina da Silva Henriques e por fim a Nancy Knox. Pela indisponibilidade das demais, acabou por ser sugerida a Carolina que, durante a gravação, quando chegou ao refrão desfez-me em lágrimas e o resto é história…

 

Como foi o processo de gravação no Bandido Sessions Studio e que papel desempenhou o Fred Garcias enquanto produtor, engenheiro de mistura e masterização?

No Bandido Sessions Studio, fomos acompanhados pela Daniela Contreiras e pelo Rogério Gé para além do Fred Gracias. Este disco, contrariamente ao primeiro, foi gravado contando com os músicos que me acompanham ao vivo, o Bruno Simões na bateria e o Jorge Pimentel no baixo. Isso trouxe uma energia de camaradagem muito importante para o resultado final. O Fred é um super profissional e para além de todo o talento como músico, engenheiro e produtor é um ser humano como poucos. De uma generosidade rara, acaba por ser muito fácil trabalhar com ele.

 

Desde 2018 tens vindo a construir um universo musical muito próprio, mas também bastante visual. Como tem evoluído a tua forma de criar e expressar esse universo ao longo dos anos?

É uma ótima pergunta, Pedro. Acho que sou apaixonado por cinema, por histórias bonitas, por coisas bonitas, ainda que por vezes muito tristes. Estou sempre atento a uma boa história para contar.

 

A apresentação do álbum aconteceu no dia 22 de maio no Tokyo, em Lisboa. Como correu a noite? Que outras datas tens já agendadas para levares Skinless ao palco?

O Tokyo, com o seu enorme led wall que preenche toda a parede de fundo do palco, ofereceu-nos as condições perfeitas para a apresentação do disco e o Esdras e o Filipe (técnicos de som e luz residentes), garantiram que o casamento entre o filme e a música funcionasse como um bailado. Tivemos o privilégio de ter os Rec Syndrome (RecSyndrome.bandcamp.com) que são uma banda incrível de Barcelona a aquecer a sala e no nosso set, as participações de duas convidadas muito especiais, a Carolina Bernardo em The EndOof The Road e a Catarina Silva Henriques primeiro no coro fantasmagórico em Psychotic Carousel e depois a na bateria, (o seu habitat natural) em I Didn’t Hear The Bell encerrando a noite em grande. Depois do Tokyo, viajámos até ao Bafo de Baco no Algarve onde partilhámos o palco com os Damn Sessions (Damn Sessions.bandcamp.com) e de seguida fomos à cidade Invicta ao mítico Barracuda ficando a abertura das hostilidades a cargo dos Ghosts Of Port Royal (GhostsOfPortRoyal.bandcamp.com) encerrando no Porto esta mini Skinless Tour. De momento estamos em pré-produção de um novo teledisco, que começará a ser rodado no fim de julho e deverá ser apresentado ao público em novembro numa grande festa no Music Box numa data ainda em aberto.

 

Por fim, que expectativas tens para este novo capítulo da tua carreira e que caminhos gostarias de explorar depois de Skinless?

Gostava muito de voltar a estar presente em mais festivais e de poder levar esta experiência a públicos mais diversos. Espero ainda encontrar energia para gravar pelo menos mais dois álbuns. Quero muito explorar uma mistura entre o dark blues e o psicadelismo contando a história do meu avô, um fervoroso anti fascista que viveu no Alentejo dos anos 30 e que teve que fugir para Lisboa, terminando os seus dias vivendo clandestinamente numa cave ao estilo Anne Frank. Também quero muito fazer um álbum 99% acústico em take direto com o meu irmão de outra mãe, o Vasco Duarte.

 

Obrigado, Rick, que mensagem gostarias de transmitir aos teus fãs e aos nossos leitores?

Obrigado, eu, a ti, Pedro e à Via Nocturna, por esta oportunidade. Obrigado a todos os que apreciam o que faço, por estarem sempre presentes e atentos ao meu trabalho. Só convosco isto faz sentido. Vocês enchem-me o coração. Deus vos abençoe.

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