Atravessando dimensões sonoras que oscilam entre a introspeção e
a grandiosidade, os Lucid Dream regressam com A Peaceful Death, um trabalho que marca um novo ciclo na
jornada musical do projeto italiano. Após a conclusão da trilogia iniciada com The
Eleventh Illusion, Simone Terigi mergulha num registo mais íntimo,
combinando melodias envolventes e letras filosóficas. O mentor deste projeto
esteve à conversa com Via Nocturna, tendo-nos falado da génese deste trabalho e
da visão por detrás da sua criação.
Olá, Simone, obrigado pela tua disponibilidade. O que tens feito
desde a última vez que falámos, em 2021?
Olá, Pedro! Sim,
já passaram alguns anos! Na verdade, comecei a escrever as canções para A
Peaceful Death pouco depois do lançamento de The Great Dance Of The
Spirit, mas depois houve vários atrasos. Também estava muito ocupado a
trabalhar no meu projeto The Secret Path Of The Intervals e, como as
gravações foram feitas no mesmo estúdio, o prazo foi esticado. Depois, em
conjunto com a atriz Beatrice Schiaffino, dei vida a uma parte do
projeto como uma performance teatral e, como podem imaginar, isso exigiu muito
tempo e energia! E como se isso não bastasse, dois discos rígidos e o
computador do estúdio de gravação avariaram - mas, felizmente, não perdemos
todo o trabalho! Por isso, sim, tem sido uma luta, mas no final, conseguimos
completar o novo álbum!
A Peaceful Death é o teu novo álbum e marca o primeiro
lançamento depois de concluírem a trilogia com The Great Dance Of The Spirit.
De que forma é que este novo álbum representa um afastamento ou uma continuação
dos temas explorados nessa trilogia?
A Peaceful Death
marca um novo capítulo na discografia dos Lucid Dream. O nosso álbum de
estreia foi Visions From Cosmos 11 (que foi reeditado numa edição
remisturada e remasterizada para o seu 10º aniversário), seguido pela trilogia
de The Eleventh Illusion, Otherworldly e The Great Dance Of The
Spirit. A oitava musical reflete uma grande lei cósmica que, de forma
simples, nos mostra que em todas as viagens há momentos em que o impulso
inicial enfraquece. Na oitava musical, isso acontece entre E/F e B/C, onde a
progressão ascendente das frequências abranda - onde, para o dizer claramente,
falta a tecla preta no piano. Olhando para a discografia de Lucid Dream,
noto que ela segue esta tendência natural. Visions From Cosmos 11 foi um
C inicial poderoso, cheio de energia. The Eleventh Illusion continuou
este impulso, introduzindo nuances que mais tarde seriam revisitadas (D). Otherworldly
foi outro surto de energia (E). The Great Dance Of The Spirit
corresponde a F na escala - o momento de declínio da intensidade - e, de facto,
na sua segunda metade, apresenta canções mais suaves. Aproveitei esse momento
de pausa para reunir todas as energias dos álbuns anteriores e refletir sobre
tudo o que tinha criado até então. No entanto, também olhei para a frente e
para cima, consciente de continuar a viagem, fechando o álbum com Wakan
Tanka, um mantra para o Grande Espírito. O quinto álbum, por outro lado,
representa G, um passo fundamental para equilibrar os mundos interior e
exterior. E foi assim que nasceu A Peaceful Death.
Comparado com The Great Dance Of The Spirit, A Peaceful Death
parece refletir uma abordagem artística mais íntima. Foi vossa intenção desde o
início seguir este caminho ou simplesmente aconteceu?
Como estava a
dizer, tudo aconteceu naturalmente, mas fico contente por ver que estou a
seguir o caminho das leis universais. Senti a necessidade de criar um álbum
como este - íntimo, emocional, melódico, introspetivo - mantendo a energia que
sempre caraterizou a música dos Lucid Dream.
O título, A Peaceful Death, é intrigante. Podes explicar o seu
significado e de que forma reflete a mensagem ou o conceito geral do álbum?
A atmosfera pode
parecer relaxada, mas muitas vezes contrasta com os temas explorados nas
letras. É deste oximoro que vem o título do álbum, A Peaceful Death.
Este tema torna-se o fio condutor de todo o trabalho - nas letras, na música e
no trabalho artístico. Na guilhotina retratada na parte de trás do CD,
encontra-se a frase: “No Mind No Fear”. Se quisermos explorar as profundezas do
nosso ser, temos de dar um xeque-mate à mente superficial.
Depois de teres
trabalhado com produtores externos em projetos anteriores, para este álbum
regressaste à autoprodução. O que motivou esta decisão e como afetou o processo
criativo?
Esta decisão não
afetou em nada o processo criativo. Infelizmente, a indústria da música está a
passar por dificuldades - todos nós sabemos isso. Todos tentam sobreviver à sua
maneira, mas se trabalhar com uma editora discográfica significa apenas
entregar um produto acabado e concordar apenas com questões de assessoria de
imprensa, então posso fazer isso sozinho… Esta abordagem não representa
qualquer risco financeiro para a editora, pelo que não sentem necessidade de
lucrar com um trabalho em que não investiram. Nunca tive a oportunidade de
assinar um contrato justo para ambas as partes, por isso decidi voltar a
autoproduzir - afinal, sempre fui eu que paguei tudo!
O álbum tem
contribuições de músicos notáveis como Roberto Tiranti, Karl Faraci e Luca
Scherani e alguns outros convidados. Como é que estas colaborações
influenciaram o som e a direção de A Peaceful Death?
Todos eles são
músicos extraordinários. Com o seu talento e criatividade, foram capazes de
pintar a música que escrevi com as suas próprias tonalidades únicas e pessoais.
Com músicos diferentes, o resultado teria sido naturalmente diferente, porque
cada pessoa é única e insubstituível. Estou verdadeiramente feliz por os ter
tido como meus colaboradores e cocriadores.
Com o lançamento dos singles a 22 de novembro e a 21 de
dezembro, que antecederam o lançamento do álbum, como é que os fãs reagiram ao
novo material?
Os singles
foram bem recebidos, recebi muitos comentários positivos e os fãs estavam a
aguardar ansiosamente o lançamento do álbum. Como já referi, já passaram alguns
anos desde o último lançamento e, finalmente, surgiu um novo trabalho! Li
algumas críticas que, apesar de apreciarem a qualidade do álbum, esperavam que
este fosse mais heavy metal. Mas digo-vos isto: a música que componho
reflete o percurso da minha vida. Felizmente, não é sempre a mesma - reflete o
meu crescimento pessoal e as minhas experiências de vida. Se a minha música
continua a ser diversificada, isso significa que ainda estou numa viagem, à
procura de algo... vivo.
A Peaceful Death foi gravado no Tabasco Studio e no 7M Studio,
com mistura no Tabasco Studio e masterização no Domination Studio por Simone
Mularoni. Como é que estes ambientes e colaborações moldaram o som final do
álbum?
Foi uma grande
colaboração de forças. O 7M Studio é o meu estúdio pessoal, onde gravei
diretamente as guitarras elétricas. Depois, fui para o Tabasco Studio,
do Nicola Sannino, para fazer o reamping. O Nicola e eu
trabalhamos juntos há muitos anos - ele é um amigo e um excelente engenheiro de
som. No Tabasco Studio gravei tudo o resto: as guitarras acústicas, as
vozes de Karl Faraci, a secção de cordas e a bateria. Roberto Tiranti
gravou o baixo e as suas vozes no seu próprio estúdio, enquanto Luca
Scherani e eu gravámos os teclados juntos no CAM, a escola de música
onde ambos ensinamos. E não é tudo! Wheel Of Karma foi gravado no
estúdio do meu amigo Pier Gonella (Mastercastle, Necrodeath).
Ele é um guitarrista fantástico e uma ótima pessoa. Depois de tudo misturado no
Tabasco Studio, enviei as faixas para Simone Mularoni para a
masterização final. Para além de ser um guitarrista fantástico (DGM), é
também um excelente engenheiro de som - equilibrou todos os sons, dando-lhes a
forma final que se ouve.
O álbum está afinado em 432Hz, um sistema de afinação que alguns
acreditam ter propriedades curativas. O que te levou a escolher esta afinação?
Que efeito acreditas que possa ter na música e no ouvinte?
Obrigado por essa
pergunta - fico feliz em esclarecer a minha posição sobre o assunto. Eu acho
que tocar em 432Hz é mais interessante do que afinar meio tom abaixo de 440Hz.
Este é, de facto, o terceiro álbum que gravo desta forma. Gosto de fazer
experiências e quis baixar ligeiramente a afinação para conseguir mais
profundidade no som. Acho a afinação de 432Hz mais profunda e mais rica em
comparação com a afinação standard meio tom abaixo, apesar de esta
última ser mais baixa. No entanto, não acredito que os 432Hz tenham
propriedades milagrosas, como alguns afirmam - ou pelo menos, nunca as
percecionei. É preciso também lembrar que a nossa divisão da oitava em doze
semitons (o sistema temperado) é uma aproximação e não segue os harmónicos
naturais com absoluta precisão. Portanto, quem diz que só ouve música “pura” em
432Hz está enganado desde o início. Além disso, os ajustes variam consoante o
instrumento. Em última análise, o que mais importa é a intenção. Se virmos os
432Hz como um veículo mais poderoso para o som, temos também de considerar a
mensagem que esse som transporta. Pode ser vazio ou mesmo uma fonte de
negatividade, espalhando o mesmo aos seus ouvintes. Devemos esforçar-nos por
ser autênticos, conscientes de nós próprios e não mecânicos. Dessa forma,
podemos selar emoções e impressões profundas no som, que ressoarão subtilmente
no mundo interior do ouvinte. Como artistas, temos uma profunda
responsabilidade - criar um mundo melhor. Um antigo tratado de pintura chinês
diz: 意在笔先-"A
intenção vem antes do pincel.”
O artwork apresenta fotografia de Laura Bianchi e pinturas de
Thalita Tonon. Como é que estes elementos visuais complementam a música e os
temas do álbum?
Laura Bianchi
também contribuiu para os dois álbuns anteriores. Trabalhar com ela é
maravilhoso - ela é muito sensível, e nós conectamo-nos instantaneamente. Thalita
é uma pintora extraordinária. Além de criar o artwork para os dois
singles, ela também desenhou todas as imagens para os novos lyric videos
no computador. Ela também pintou um conjunto completo de cartas de tarot
baseadas em intervalos musicais, que eu vou imprimir em breve e disponibilizar
no site www.secretintervals.com. Adoro
fundir diferentes artes - pintura, fotografia, música, poesia, representação...
Refletindo sobre o teu percurso musical desde o início dos Lucid
Dream em 2009, como é que sentes que o som e a visão artística do projeto
evoluíram até aos A Peaceful Death?
Posso dizer que a
evolução musical é diretamente proporcional ao nosso crescimento pessoal,
experiências e busca de conhecimento. Espero que nunca pare, até ao meu último
momento... Que o Grande Espírito me dê a força, a inspiração e o impulso para
continuar a tocar e a criar música - uma e outra vez.
Após o lançamento de A Peaceful Death, quais são os planos dos
Lucid Dream para digressões ou projetos futuros?
Eu já estou a
trabalhar num novo álbum, e espero apresentar A Peaceful Death ao vivo! Também
estou a desenvolver The Secret Path Of The Intervals como um projeto
teatral com Beatrice Schiaffino. Após o sucesso da sua primeira
apresentação, espero que surjam mais oportunidades para trazer este conceito
artístico visionário para o palco - o que eu chamaria de uma “Representação de
Arte Objetiva”.
Obrigado, mais uma vez, Simone. Queres enviar alguma mensagem
aos teus fãs ou aos nossos leitores?
Antes de mais,
obrigado, Pedro, e Via Nocturna 2000, pelo importante trabalho que fazem
e por me darem a oportunidade de partilhar os meus pensamentos aqui. A todos os
amantes da música: deem uma oportunidade a A Peaceful Death - ouçam-no!
Tenho a certeza que vos vai dar muitas emoções. Até breve, meus amigos - um
grande abraço para todos vós!
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