Miguel Santos é o homem responsável pelo projeto A Dream Of Poe. Ele criou esta entidade dedicada ao doom metal e contra ventos e marés tem conseguido levar o seu nome bem longe. The Mirror Of Deliverance é o primeiro álbum longa duração do projeto e teve edição da editora ucraniana ARX Prod. O multi-instrumentista, que também assume funções nos In peccatum, responde a Via Nocturna.
Naturalmente satisfeito pela edição do teu primeiro longa duração. Que expectativas tens para The Mirror Of Deliverance?
As expectativas são sempre muitas, mas confesso que nunca me debrucei muito sobre este assunto. Estou a ser apanhado de surpresa pelas críticas muito positivas que este trabalho tem obtido. Por este facto já ultrapassou as expectativas que havia criado. No fundo eu espero que este trabalho consiga levar o nome e a música de A Dream of Poe cada vez mais longe e que abra novas portas e traga novos desafios a ADOP.
Em anterior entrevista a Via Nocturna tinhas apontado o outono como possibilidade para a edição do álbum. Veio a verificar-se um ligeiro atraso. Esteve relacionado com a procura da editora certa?
Não, não foi este o caso. O trabalho sofreu atrasos devido a compromissos pessoais e profissionais que me impediram de ter o tempo necessário em estúdio para dedicar a A Dream of Poe. Recordo que num determinado momento estive a trabalhar no meu estúdio em 3 projetos diferentes pelo que foi complicado manter a data delineada para A Dream of Poe, e como os clientes estão sempre primeiro…
A ARX Prod. apareceu poucos dias após o lançamento do EP Lady of Shalott. Um dos objetivos deste EP era através do tema Lady of Shalott conseguir obter o interesse de editoras em lançar o álbum de A Dream of Poe. Posso concluir que Lady of Shalott cumpriu os objetivos a que se propôs. O contacto surgiu através do Myspace, meio essencial na divulgação de A Dream of Poe, sendo que foi apenas uma questão de dias até chegarmos a acordo.
Continuas a assumir todos os instrumentos, mas desta feita contaste com dois músicos para os solos. Qual foi o seu grau de participação e de criação?
100%, ou quase! Eu enquanto músico e produtor sou muito aberto às sugestões e ideias dos músicos que trabalham comigo, assim sendo, dei liberdade quase total tanto ao Paulo Bettencourt como ao Nelson Félix. Eles apresentaram as suas sugestões e ideias, a sua versão e interpretação da música através dos solos, eu fui supervisionando o processo, sugerindo algumas mudanças aqui e ali de forma a se aproximar ao que eu ia imaginando ao mesmo tempo que ouvia as versões deles. Foi um processo muito natural e feito no momento, deixando fluir todas as ideias que apareciam, talhando-as depois no que seria o produto final. Por fim acabou por ser um trabalho de grupo que funcionou na perfeição.
Para além dos solos, contaste também com dois vocalistas para os backing vocals. Na tua perspetiva de compositor, que papel relevante acabam por jogar esses apoios vocais?
Na minha opinião foi importante para dar mais diversidade à música, não nos podemos esquecer que na maior parte dos casos os temas são longos e o facto de se criar várias dinâmicas vocais mantêm-nos atentos à música além de tornar o tema mais interessante. Exemplificando temos a Liber XLIX e Chrysopoeia. Na Liber XLIX apesar de ser apenas o João a dar voz a este tema, usaram-se diferentes tipos de vozes de forma a se criar diferentes estados de espírito e fazer saltar cá para fora diversos tipos de emoções e sensações. O João é um Senhor vocalista, extremamente versátil e penso que este tema em especial é espelho disso. Na Chrysopoeia senti a necessidade de optar pelo Paulo Pacheco (atual Letrista e vocalista nos anteriores trabalhos de A Dream of Poe) para os versos, um pequeno interlúdio e para apoio nos refrões. Na minha opinião, a junção entre a voz do Pacheco e do João funcionou perfeitamente criando a dinâmica que procurava.
Para este trabalho acabas por recuperar apenas uma faixa anterior, Lady Of Shalott. Foi mesmo uma forte intenção tua dar um verdadeiro passo em frente?
A Lady of Shalott é um tema que pertence a 100% a este álbum sendo que um dos objetivos desse tema em particular foi o criar interesse e curiosidade à volta do novo álbum de A Dream of Poe. Sem duvidas que a intenção foi dar um passo em frente mostrando assim toda a evolução que A Dream of Poe sofreu, pretendendo agora chegar a cada vez mais público, atingindo novas metas e objetivos. A titulo de exemplo, temas como Laudanum ou Whisper of Osiris foram escritos no inicio de 2007, contudo, apenas viram a luz do dia em 2009. Distam quase 4 anos entre a criação deles e o lançamento de um novo trabalho de originais, neste caso o The Mirror of Deliverance. Houve portanto uma janela de 4 anos em que não houve demonstração da minha evolução como músico e produtor, que no fundo se reflete na evolução de A Dream of Poe. Talvez este interregno tenha sido benéfico pois permitiu-me lançar agora um trabalho muito mais maduro e de orientações mais definidas comparativamente aos trabalhos anteriores.
É também a primeira vez que utilizas o português numa canção, certo? Acho que resultou muitíssimo bem até porque é um poema muito bom. Será para continuar?
A ideia de utilizar o português numa canção já era antiga, contudo só agora avancei com esta ideia. Houve vários fatores que contribuíram para só agora optar por usar a língua portuguesa. Um deles foi o ter um tema que tivesse de facto o sentimento e o encadeamento melódico em que pudéssemos tirar partido de uma vocalização em português. Não gosto de forçar e escrever um tema especificamente para poder cantar em português ou sendo regido por outra especificidade qualquer, pelo que Os Vultos, bem como todos os outros temas, surgiram naturalmente durante o meu processo de criação. Acho que acabou por ser uma coincidência o Paulo Pacheco ter escrito um poema em português e eu ter escrito um tema em que uma letra em português encaixaria na perfeição. Se será para continuar ou não, é uma pergunta que não conseguirei responder, pessoalmente gostei muito do resultado e gostaria de repetir a experiência, mas como disse anteriormente, não gosto de forçar o meu processo criativo, mas se todas as condições citadas anteriormente se voltarem a repetir, não terei qualquer hesitação em optar pela língua portuguesa.
Referes no press release que este álbum teve o apoio da Direção Regional da Juventude e do Governo Regional. De que forma é que esse apoio se processou?
A DRJ através do Governo Regional dos Açores possui alguns programas de apoio financeiro e logístico que estão disponíveis para quem se candidatar a eles mediante a apresentação de projetos diretamente ligados à cultura. Estes projetos são alvos de apreciação e aprovação por parte de técnicos especializados. Neste caso especifico A Dream of Poe candidatou-se a um apoio pontual para financiar parte do lançamento do álbum, sendo o projeto considerado viável e de interesse para os Açores. O apoio permitiu-me pagar alguns custos referentes à edição, promoção e divulgação do The Mirror of Deliverance.
A terminar, vais continuar afastado dos palcos a preparar mais música, ou pensas recrutar um conjunto de músicos para levar The Mirror Of Deliverance para a estrada?
Espero sinceramente que o afastamento dos palcos não dure muito mais. O principal motivo por ter estado afastado dos palcos foi o facto de cá nos Açores o Doom Metal não ter grande aceitação, pelo que desde que dei inicio a este projeto nunca surgiram convites para me apresentar ao vivo, isto apesar de eventos não faltarem. Só através do evento que organizo juntamente com outro músico Açoriano, é que consegui finalmente subir aos palcos. Ainda assim não culpo de todo quem organiza eventos e não aposta no Doom Metal, eu próprio estou no meio da organização de eventos e sei que no contexto açoriano é muito arriscado ter no seu cartaz bandas de subgéneros como o Doom-Metal ou até mesmo o Gothic-Metal. A comunidade metaleira açoriana que se encontra ativa a apoiar as bandas e a ir aos concertos prefere outros tipos de sons mais modernos, que incitem ao mosh, fugindo quase completamente a sons mais lentos e melódicos. Os anos 90 nos Açores, em que proliferavam excelentes bandas de Doom Metal tais como Prophecy of Death, Obscenus, Gnosticism ou mesmo Gods Sin, em que a comunidade metaleira vivia, respirava e quase que idolatrava este subgénero, acabaram quase na sua totalidade, apenas restando desta altura os In Peccatum, dos quais orgulhosamente faço parte desde 2006. Ainda assim espero pelo menos fazer um concerto nos Açores uma vez que não param de surgir pedidos da pequena minoria que ouve e vive o Doom Metal. Estamos também à espera de confirmação para a participação num festival de Doom fora de Portugal, ainda não há nada confirmado a 100% mas é de facto uma possibilidade!
Texto escrito conforme o Acordo Ortográfico - convertido pelo Lince.
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