Review: Mania (Aires Ferreira)

Mania (Aires Ferreira)
(2012, Necrosymphonic)

O mais intenso e arrojado diseur nacional está de regresso com mais um álbum de spoken word, intitulado Mania, três anos depois de Ruína e com edição da Necrosymphonic. Em 50 minutos distribuídos por 11 temas, Aires Ferreira mostra-se, como sempre, incómodo, provocador, desestabilizador, sarcástico, mordaz, em suma, um autêntico terrorista cultural. As suas letras, ponto forte dos seus álbuns e, naturalmente, também deste, são cortantes, frias, quase desumanas. No entanto, são bizarramente reais e representam histórias que quase nos atreveríamos a dizer que conhecemos da nossa rua ou cidade. Tão reais como a autobiográfica Que Se Foda. São duras. Mas quem disse que este mundo é um doce? São polémicas. Mas desde quando colocar o dedo na ferida é polémico? São doentias. Mas não estará toda a sociedade assim? A música, o campo tradicionalmente menos relevante para o poeta portuense mereceu, neste trabalho, um tratamento mais atento. Equivale isto por dizer que nos parece que em Mania essa área foi mais desenvolvida e teve uma atenção mais cuidada para que as palavras tivessem mais força porque melhor enquadradas. Em momentos, chega a surpreender pela musicalidade conseguida como acontece com Vossa Senhora de Fátima ou Asco, os dois momentos mais brilhantes do álbum. O primeiro, que conta com a participação do mestre Charles Sangnoir, chega a ser verdadeiramente delirante no diálogo criado com Fátima; o segundo, épico tema com a presença de Pestilens, dos Penitência, consegue criar frias e desoladoras paisagens que muito se aproximam do doom metal. Noutros momentos, exploram-se outras sonoridades maioritariamente maquinais ou noisy mas que a espaços evoluem para elementos étnicos (sul-americanas em Rai’s Parta a Vida e árabes em Drogaria, que acumula um dos mais curiosos poemas). Embora liricamente, Aires Ferreira siga o seu caminho e volte a mostrar em Mania toda a sua capacidade criativa, não tendo já que provar nada a ninguém, é no aspeto musical que este trabalho acaba por se revelar uma clara evolução na forma de apresentar a sua arte. Que assim sai mais enriquecida e fortalecida.

Tracklist:
1. Desdenho Inteligente
2. Vossa Senhora de Fátima (com Charles Sangnoir / La Chanson Noire)
3. A Idade do Ferro
4. Não Digo Nada de Jeito?
5. Rai's Parta a Vida
6. Vai-se Andando
7. Fuma Que Isso Passa
8. Drogaria
9. Asco (com Pestilens / Penitência)
10. Que se Foda
11. Revelação (Com Vilkacis / Ars Diavoli) 
 
Internet:
 
Edição: Necrosymphonic (www.necrosymphonic.com)

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