Uma banda
do Cazaquistão não é nada vulgar, mas os Holy Dragons são uma autêntica lenda
viva do seu país, fruto do seu historial e de inúmeras gravações. O ano de 2012
fechou com o conceptual Zerstorer,
onde a banda estreia um novo vocalista e avança para letras em inglês. A mente
por detrás deste projeto, o guitarrista e teclista Jurgen Thunderson concedeu a
Via Nocturna uma entrevista bem-disposta e cheia de críticas.
Viva, obrigado por perderes algum do teu tempo a responder a Via Nocturna. Novo álbum, nova editora, tudo vai bem para os
Holy Dragons?
Salvé! Saudações a todos os leitores de Via Nocturna e estamos à espera de perguntas
interessantes! Temos um
sentimento muito positivo, ao trabalhar com a
Pitch Black Records. Na realidade tudo é
muito diferente da experiência de trabalho com a
editora anterior, que fez muito pouco feito pela banda e pelos seus lançamentos. Na verdade, as coisas foram de mal a pior,
por isso mesmo decidimos
rejeitar voltar a trabalhar com a editora anterior apostando na distribuição virtual para os nossos discos. Mas, felizmente, com uma abordagem séria e correcta, o tradicional sistema de
trabalho com uma editora ainda funciona muito bem, dando a uma banda muito mais
possibilidades e vantagens no campo da informação quando comparado com a promoção
diretamente feita pela banda, ignorando as estruturas editoriais. Temos o nosso próprio exemplo!
Os Holy Dragosn não são uma banda muito
conhecida em Portugal. Podes descrever a música que praticam e as vossas principais
influências?
Na verdade, tentamos
combinar tudo o que havia de melhor na música de metal nos anos 80/90.
Quero dizer velocidade, melodia e técnica. Ao mesmo tempo, combinando tudo mas não fazendo uma música muito específica - para um
círculo muito restrito de fãs com
alguma tendência de subcultura, o que é um erro muito comum em algumas bandas, baseado em
algumas influências posteriores. Há hoje em dia
um monte de bandas que realmente estão a
fazer a mesma coisa, tocando uma espécie de metal
80-90, embora estejam a fazer isso um
pouco superficialmente. Como por exemplo: "Nós não vamos tocar desta forma porque vai ser
muito complicado. Nós vamos tocar
desta forma porque vai ser muito rápido
etc... ". Mas não penses que, com essa abordagem irão ser valorizados. E também não é uma boa maneira de
trabalhar atualmente.
Sendo uma banda do Cazaquistão, podes
contar-nos como é a cena rock/metal
no teu país?
A situação aqui não é muito boa,
para ser honesto. Apesar do fato de haver
muitas bandas por aqui, a
maioria são muito jovens e acabam por
não formar uma comunidade nem uma camada cultural. Não há editoras, nem
revistas sobre metal (quero dizer as locais, é claro), nem clubes especializados em música rock. A maior parte das nossas bandas consideram-se como rivais diretos, mesmo que toquem música totalmente diferente.
Assim, em vez de cooperação há que
tentar colocar um raio nas outras rodas à menor possibilidade. Naturalmente, a formação de um som
reconhecível de escola não é possível em tais condições. Falando de música metal no mundo,
temos uma imagem clara quando dizemos, por exemplo, "o som da
Califórnia" ou "escola alemã de metal"
e assim por diante. Podes
facilmente distinguir uma banda de metal
finlandesa de uma alemã
ou uma alemã de uma italiana. Aqui todos
tentam copiar os projetos do "top-10" que estão feitos apenas para ganhar dinheiro. Podes perceber que nestas condições o resultado do underground é
totalmente insano, na maioria dos casos. Eu
não quero parecer uma dor mal-humorada
no pescoço, mas não existem processos positivos por
aqui. E bandas como Forpost, Triumvirat, Vist, que poderiam ter formado um rosto de cena metal local, desmoronaram-se há 20 anos atrás.
Assim sendo não deve ser fácil para os
Holy Dragons. Como é o vosso dia-a-dia?
Se for dia de espetáculo, então a banda transforma-se em homens de segurança, (risos)! Vamos
para o palco como se tivéssemos acabado de sair de um Jacuzzi com um cocktail nas mãos, mostrando-nos como estrelas de rock que acabaram de acordar e foram chutar o próprio traseiro (risos)! E
depois vem a afterparty,
que não é sobre gajas e álcool, mas é sobre como mover
algumas toneladas de equipamentos do lugar "X" para os lugares
"Y" e "Z", sem
perder nem partir
nada no caminho de volta. Se tivermos tais concertos regularmente, podemos poupar algum
dinheiro no ginásio e também esquecer para que é que as armas de fogo foram inventadas uma vez que se cospem balas quando alguém
está a bloquear o
caminho, quando se está a carregar o pesado amplificador para o 4
º andar do prédio.
Neste álbum estreiam um novo vocalista.
Como foi o processo de adaptação do Ian quer à banda quer aos temas
novos e mais antigos?
Honestamente todas as
gravações dos vocais foram virtuais. O progresso técnico
permite não estar no mesmo
estúdio para fazer este tipo
de trabalho. Ian Breeg vive numa
cidade russa chamada Tula, a
cerca de 4000 quilómetros
da cidade onde moro. Naturalmente tivemos desentendimentos e todos os tipos de pequenas avarias
técnicas. Além disso, o processo de gravações dos vocais
foi mais lento de como seria
se trabalhássemos juntos em
estúdio. Mas o
que podemos dizer? Fizemos assim!
Os Holy Dragons têm uma grande experiência e vários álbuns gravados. Como analisas a evolução da banda em Zerstorer?
Eu considero este álbum muito importante na evolução da
banda, uma vez que continua a tradição de Black
Moon Rising, álbum que considero a base da banda, continuando todas as
tendências que foram feitas nesse álbum e levando-as a um novo nível. Aqui rejeitamos as auto-restrições no processo de escrita. Zerstorer é um passo em frente relativamente a Black Moon Rising. Uma das razões é porque tem letras em inglês, o que
torna compreensível o conteúdo do álbum em todo o mundo. Falando muito francamente, neste álbum tornei um sonho meu realidade, gravando um tema de 14 minutos. Muita gente está cética, mas se fizeres breakdowns
rítmicos como os Dream Theater toda a gente vai ser
muito tolerante com o riff maçador e chato, que é repetido 250
vezes por música. Muito provavelmente até vão gostar! Mas se seguires
as tradições rítmicas de um disco de
rock-n-roll-poderoso, a tentativa de
fazer uma grande canção conceptual é
normalmente rotulada como
"monstruosa".
Eu não entendo de onde vêm tais
barreiras na perceção que algumas pessoas têm da música. De qualquer forma, eu não gosto de tais
barreiras e entendo a necessidade de quebrá-las,
mesmo se vou ter solavancos na minha própria cabeça, quebrando essas
"barreiras mentais".
Como tem sido o feedback
do novo álbum? Satisfeito
com a apreciação global de Zerstorer?
Há uma grande quantidade
de pessoas que ficaram muito
felizes quando este álbum finalmente saiu!
Temos tido um feedback muito positivo, que
mostrou que estávamos certos na
nossa abordagem a um álbum conceptual
como Zerstorer. Ao mesmo tempo, temos
um número de criticas absolutamente sem sentido
- recontar fatos sobre a banda que qualquer pessoa pode obter no Google em 0,03 segundos e reflexões
idiotas sobre o nosso país e o que pode sair do país como tal
em termos de valor musical. Eu não entendo o sentido de tais análises. Se uma pessoa ouviu o álbum
teria pelo muito sobre o que escrever,
como o álbum ter um suficiente conteúdo não-padrão, a rejeição
intencional de normas convencionais. Mas se uma pessoa não ouviu, então ocupa o espaço de informação com copy/paste e suposições selvagens (risos)! Pode ser que seja um problema comum hoje em
dia, não só da nossa banda, mas também de muitas outras
nas condições de abundância de recursos na internet, dedicados à música metal.
Zerstorer é um álbum muito longo
com a curiosidade de ter vários temas com diferentes partes dentro deles e nomes diferentes para a
mesma faixa. Por quê?
Em Zerstorer tocamos um tema muito sério, o tema da Guerra Fria e da
sobrevivência da humanidade à beira de um conflito nuclear. Esta situação já se
arrasta há anos e todo mundo parece
não perceber isso! Não estou
muito seguro se alguma banda rock teve álbuns com um conceito semelhante. Pelo menos
um vulgar álbum conceptual tem a história de um bom ou mau gajo que foi espancado na escola, em
seguida, foi deixado pela namorada, saiu de casa, começou a usar heroína (risos) e depois ele morreu ou ficou
curado das drogas. Ou um outro conceito como
guerras intermináveis de deuses antigos, nos quais
ninguém acredita... Nós
não gostamos nem do primeiro nem do segundo tipo
de conceitos. Muito do aqui
está veio da
infância. Este medo de "esperar pelo
o final". Quando, nós, sendo crianças dissemos
que o "apocalipse nuclear"
é inevitável e que isso é apenas uma questão de
tempo. Quando nós, sendo crianças éramos ensinadas como sobreviver no
epicentro de uma explosão nuclear e o que fazer no caso de radiação nuclear.
Ainda me lembro de um dos meus dias de infância, quando de repente toda a
energia elétrica e de rádio e TV acabaram.
De repente, a cidade ficou muito quieta... e pôde-se
ouvir o barulho de dezenas de aviões pesados em algum lugar sobre as nuvens. Pessoas que esperavam por algo e tinham a sensação de estar condenados, uma vez que
não tinham nenhuma informação do que estava a acontecer. Como se viu depois, foi o dia em
que a URSS introduziu tropas no Afeganistão. O apocalipse
nunca aconteceu, mas todos foram
crescendo com esta ideia, nesta
atmosfera. E esses sentimentos foram refletidas no álbum. Alice Cooper tinha um
monstro debaixo da cama na sua
infância. Uma aranha gigante! Eu tinha uma nuvem de cogumelo nuclear debaixo da
minha (risos). O que dizes a respeito da divisão das faixas. Eu só queria fazer o álbum parecer perto
dos discos de vinil. Quando ouves
um disco de vinil, não saltas
da segunda pista para a número
5 e a seguir para a 7. Tudo
está na ordem correta. Na nossa era digital qualquer pessoa pode ouvir a faixa 6 e
depois ir para faixa 2 e nada muda. Eu não queria que todos esses pequenos
interlúdios fossem perdidos nesta
situação ou que não soassem onde eu queria que estivessem.
Por outras palavras, não quisemos fazer um
álbum no modo shuffle.
Existe alguma ligação entre este álbum e a vossa demo de 2010?
A partir do momento de
sua gravação, a banda estava à procura de um
vocalista depois da saída de Komarov, que era o vocalista há cerca de 8 anos. Foi um momento
muito difícil, tentámos muita gente e ninguém conseguia lidar
com o material. A maior parte dos candidatos também copiou a forma vocal de Komarov e não soava muito bem. Decidimos seguir em
frente e um amigo nosso que não
era cantor profissional fez todos os
vocais na demo. Ele apenas é um fã de heavy metal da velha escola como Samson, Demon ou Grim Reaper. Devido
ao seu trabalho e alcance vocal fomos
capazes de mostrar todas as melodias que compunham as linhas vocais. Mas a
reação aos vocais por parte dos críticos e do público foi muito sem espírito,
então decidimos procurar um vocalista
profissional.
Podes descrever como funciona o processo de escrita nos Holy Dragons?
É sempre
diferente, mas acima de tudo, começa com riffs
de guitarra. Em seguida, vêm as linhas
vocais, a estrutura e tudo o resto. O "momento da
verdade" é a conceção de como vai ser a
música. A música também tem alguma informação emocional e contextual definida e não é muito bom ouvir um vocal em que a linha emocional das letras não coincide com a linha
emocional da música. Embora,
às vezes, essas coisas sejam feitas com algum propósito definido. E,
por vezes, este método funciona! Por exemplo, as bandas
alemãs gostavam de ter letras sérias, falar
sobre o apocalipse e colocá-las numa alegre melodia
(risos)! Temos o mesmo tipo de música, chama-se The Last
Day Of Life.
O processo mais longo e
mais difícil foi a gravação da voz. Pode ser devido à essência virtual do trabalho. Trabalhar com Breeg é
uma atividade realmente stressante nestas
condições (risos), mas conseguirmos
terminar este álbum foi uma
verdadeira vitória!
Já estão a levar Zerstorer para o palco? Como está a vossa agenda para os próximos
tempos?
Metade destas canções do álbum está incluída no nosso show ao vivo. O álbum inteiro não para permitir algum espaço para as outras
músicas (risos). Falando a sério, aqui não temos muitos espetáculos ao vivo e ir
para a Europa requer um investidor. É um problema real para nós. Mas no que diz respeito a trabalhar num espetáculo ao vivo, acumulamos uma grande
vontade de trabalhar no palco e fazer o nosso
melhor! Portanto, se alguém conta com a nossa participação vai ganhar,
tendo em conta a capacidade de trabalho e
dedicação. Ainda assim, observo que o
mercado de tournées
hoje em dia está superlotado.
A terminar, queres dizer algo mais aos
nossos leitores?
Bem, só quero dizer a
todos os teus leitores e público do metal em Portugal que gostaria de fazer
esta reunião com os Holy Dragons
não a primeira e a última vez,
mas mais e mais vezes e fazer boa
música para todos os nossos ouvintes em todo o lado! Mantenham
o espírito do metal nos vossos corações!
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