Um dos mais
impressionistas nomes do prog rock
francês, Cyrille Verdeaux criou um dos mais ambiciosos projetos dentro do
género: pegar em pinturas impressionistas francesas e musicá-las. A ideia é
genial, não foi fácil de executar mas o resultado final é sensacional. Cyrille
Verdeaux explica-nos como decorreu todo o processo e mostra a sua mágua sobre o
estado a que chegou o mercado musical mundial.
Olá Cyrille.
Muito obrigado por nos concederes esta entrevista. Parabéns pelo teu excelente
trabalho. Quando te surgiu a ideia de fazer um álbum com base no impressionismo?
Durante um festival de música em junho de 2005, dei um
concerto de piano na Embaixada Francesa de Brasília e depois do concerto, o
embaixador veio ter comigo e disse que a minha música era muito
"impressionista", penso que numa referência ao meu gosto por Ravel,
Debussy, Satie e Chopin que transparece nas minhas composições. A sua observação
levou-me a dar mais atenção à escola francesa de pintores impressionistas e
decidi compor uma música inspirada nas suas vidas e no seu trabalho e começar
qualquer coisa.
Sendo francês
e tendo a França uma forte escola impressionista quer pintura quer na música, podemos
dizer que foi um trabalho fácil ou não?
Não foi um trabalho difícil transcrever em música o
sentimento das pinturas. Claro, o facto de compartilhar o mesmo fundo cultural
e nacional torna o processo criativo mais fácil de se manifestar. Talvez esteja
no código genético, quem sabe...
Mas deve ter
sido um longo processo até todas as ideias ficarem no seu lugar certo. Podes
descrever um pouco de todo o processo criativo?
Na verdade, a tarefa mais difícil foi encontrar o
orçamento para contratar os músicos certos, encontrar o lugar certo para gravar,
o produtor certo para me ajudar a misturar as faixas recolhidas em todo o mundo
e a editora certa para a sua distribuição. Por uma série de pequenos milagres,
pude, eventualmente, encontrar tudo e todos que queria para alcançar o projeto.
Só me demorou 8 anos a partir desde primeira nota gravada (2005) até à última
peça mista (2013). Primeiro, escolhi os meus 7 pintores favoritos: Gaughin, Van
Gogh, Monet, Degas, Toulouse Lautrec, Pissarro e Renoir. Depois gravei uma
faixa de piano para cada pintor. Finalmente propus essa faixa a todos os
músicos que eu queria ouvir neste álbum.
Como escolheste
os músicos para este trabalho?
Porque queria lançar um novo álbum de Clearlight para
celebrar o 40º aniversário do meu primeiro lançamento, Clearlight Symphony, perguntei primeiro aos músicos ainda vivos e
que participaram nesse primeiro álbum em 1974. Steve Hillage, Tim Blake e
Didier Malherbe aceitaram e gravaram as suas partes no seu próprio estúdio em
casa. Depois completei a equipa com alguns amigos mais recentes com quem tinha
gostado de tocar: os norte-americanos Vincent Thomas-Penny (guitarra), Craig
Fry (violino), Paul Sears (bateria), Linda Cushma (baixo) e os teclistas
francêses Chris Kovax e Remy Tran. Todos têm um estúdio em casa e também eles poderiam
enviar as suas faixas pela internet para
o coordenador-chefe do projeto, Don Falcone, também conhecido como líder do
grupo Spirit Burning. Don recolheu
no seu computador todas essas dezenas de faixas e quando já lá estavam todas, pude
misturá-las na sua casa de San Francisco com o seu sistema ProTool no mês de dezembro de 2013.
Realmente é
curioso que os membros dos Gong estejam novamente contigo, 40 anos após a tua estreia.
É fantástico! Foi fácil convencê-los a participar de novo?
Foi apenas uma questão de preço e prazo... Eles estavam
todos envolvidos nos seus próprios grupos, System 7 no caso de Steve, Hadouk Trio
no de Didier e Hawkwind para Tim, por isso demorou algum tempo para ter tudo
pronto, mas graças a Deus ficou tudo pronto.
Naturalmente
que a cultura francesa está muito presente aqui, mas este é também um álbum que
nasceu com outros feelings,
nomeadamente brasileiro e norte-americano. De que forma o facto de teres vivido
nestes países as suas culturas influenciaram a existência de Impressionist Symphony?
Não posso dizer que este álbum em particular tenha
sido influenciado por outras culturas. Sou um músico contemporâneo compondo música
francesa sobre pintores franceses que viveram no século XIX. E mesmo se vivo em
Brasília e antes tenha vivido nos EUA, usualmente falo francês com minha esposa
e amigos, como comida francesa (eu cozinho a maioria das vezes), por isso não é
difícil de manter o meu "toque francês" totalmente operacional.
Tens algum
vídeo disponível? Ou tens algo previsto?
Sim, faz todo o sentido fazer um DVD sobre este projeto
com base em pinturas. Tenho tentado encontrar um artista que possa trabalhar
comigo para sincronizar a música e as pinturas, mas até agora não consegui
encontrar um produtor interessado no financiamento de uma obra para um DVD. E ainda
estou à procura… Tenho um amigo que fez um teaser,
mas é tudo até agora. É possível vê-lo no youtube
se escreveres "clearlight teaser 2014". Tenho bastantes vídeos disponíveis
em "Clearlight 888 vídeos" também no youtube. E em www.cdbaby.com encontram todos os meus CDs, para os
interessados em ajudar. Que eu saiba, é o único site
on-line que me paga royalties das
minhas vendas de CD. Mais nenhum faz. Tempos estranhos, não?
Sobre espetáculos
- estás a pensar levar este projeto para palco? Já há alguma coisa definida?
Sabes, eu não tenho agente, nem banda, nem
instrumentos próprios, quase sem dinheiro, por isso não é possível fazer o que
eu gostaria de fazer. Tudo que tenho é o meu repertório musical. Às vezes sinto-me
como um Rolls Royce forçado a ficar na garagem, porque não posso colocar
gasolina no reservatório. Claro que, se pudesse, iria assinar para uma tournée mundial com todos os músicos que
tocaram no álbum! Mas isso custaria tanto dinheiro apenas para formar uma banda
na estrada que eu prefiro não sonhar muito. Já foi um milagre ter conseguido terminar
o projeto de gravação na difícil situação material em que estou, em 2014. Com
todas essas plataformas ilegais de download
de música utilizados pelo público, como podem os músicos viver das suas vendas
de CDs? Para já não tenho uma resposta clara para esta pergunta.
Bem, foi um
prazer conversar contigo. Queres acrescentar mais alguma coisa para os nossos
leitores ou para os teus fãs?
Há tantas coisas a dizer... Sobre música, mas também
sobre o mundo... Para ser honesto, eu preocupo-me com o nosso futuro,
especialmente o aspeto ecológico, por isso desejo a todos boa sorte para
encontrar um lugar seguro e um trabalho seguro nos anos vindouros.
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