Entrevista: Comitiva Charlie


Chamam-se Comitiva Charlie, são de Lisboa e da Margem Sul do Tejo, acabam de lançar o seu primeiro álbum de originais e prometem não deixar os amantes portugueses de hard rock desiludidos ou indiferentes. Isto é o que se lê no press release que acompanha o lançamento de Mil Voltas ao Contrário. Mas é, também, o que se sente quando se ouve Mil Voltas ao Contrário. Os Comitiva Charlie São uma das grandes revelações deste ano e, por isso, quisemos conhecer melhor esta arrojada comitiva de inspirados músicos.

Olá pessoal, obrigado pela disponibilidade. Como surgem estes Comitiva Charlie? O que vos motivou a juntar e começar a criar?
Miguel Bugalho [MB]: Olá Via Nocturna. Os Comitiva Charlie nasceram através da junção de alguns dos elementos que constituíam a banda Capital Crime, de tributo a Guns N’ Roses. Após a realização de alguns concertos de tributo, chegámos à conclusão de que pretendíamos um projeto que nos realizasse a nível pessoal e “profissional”, tendo como base os nossos gostos e preferências musicais. O nosso denominador comum é o rock.

Qual é o passado musical dos membros da banda?
Hugo Pinto [HP]: Todos nós já temos um certo background na música que antecedeu os Comitiva Charlie. No meu caso, para além dos Comitiva Charlie e da banda Capital Crime, de tributo a Guns N’ Roses, que o Miguel já referiu, lancei o projeto |UGO|, do qual o Henrique, o Filipe e o Miguel também fizeram parte e que os leitores do Via Nocturna, decerto já conhecerão. E antes disso estive (e ainda estou) envolvido com os Alves Baby. O Miguel também esteve nos Charysma, certo Miguel?
Telmo Estrelado [TE]: Eu sou um relativo novato nestas andanças. Tive algumas bandas com amigos ao longo dos anos, mas nunca nada muito a sério. Como já foi referido estive nos Capital Crime com o resto dos elementos da banda, mas os Comitiva Charlie são o meu primeiro projeto a sério.

Porquê Comitiva Charlie? Há algum significado especial para este nome?
MB: O nome revela a identidade da banda. Por um lado, a palavra “Comitiva”, remete para a parte mais formal e clássica, por outro lado, a palavra “Charlie” revela a nossa faceta mais divertida e descontraída. Ainda por sermos cinco elementos, e a letra “C” ser predominante, deu-nos a ideia de recolher do alfabeto fonético o Charlie, correspondente a “C”. A junção das duas palavras encaixa na perfeição e leva-nos numa viagem em classe executiva, num ambiente descontraído.

Como foi o vosso percurso entre o aparecimento de Comitiva Charlie e o aparecimento de Mil Voltas ao Contrário?
MB: Após decidirmos avançar com o projeto, entrámos num processo criativo. Nada muito planeado. Preferimos deixar-nos levar pelo prazer de tocar e compor, misturado com a inspiração de cada um. Os resultados foram aparecendo naturalmente e estamos muito orgulhosos do resultado final. O álbum criou-se a si próprio e o nome Mil Voltas ao Contrário é um excerto do tema Aos Outros, deixando no ar a ideia de que viajar com Comitiva Charlie, é deixar-nos levar numa panóplia de emoções, com a incógnita no destino final.
HP: Exato! E tendo em conta que sentimos que a nossa música tem algo de novo e refrescante, que estamos a fazer algo que praticamente ninguém faz em Portugal - o chamado hard rock em português - a referência a Mil Voltas ao Contrário será um desejo de querermos inverter algo na música portuguesa ou, efetivamente, é algo que já alcançámos com este primeiro disco? Bem… é uma questão que deixamos no ar para as pessoas responderem por si.

Desde o início que o objetivo era utilizar a língua portuguesa ou essa ideia só apareceu mais tarde?
MB:  É um facto que o tema esteve em cima da mesa. Mas rapidamente chegámos à conclusão que queríamos um projeto de rock, 100% português. A mensagem passa de uma forma muito mais concreta e é isso que pretendemos. Hoje em dia é difícil encontrar uma boa banda de rock, que cante totalmente em Português e nesse sentido, acreditamos que o nosso projeto vem trazer uma lufada de ar fresco ao panorama musical do nosso País.
HP: Aqui posso dar o crédito ao Miguel em especial. Nas primeiras sessões de estúdio em que começámos a montar os esqueletos das primeiras músicas, eu e mais outros elementos da banda, achávamos que as músicas acabariam por ser em inglês. Mas o Miguel apresentou-nos esta ideia de cantar em português. A princípio fiquei apreensivo porque é muito mais difícil fazer música em português do que em inglês. As palavras ganham mais força quando cantadas na tua língua materna. Se dizes “I love you” numa música é algo que não choca nem chateia ninguém. Se dizes “Eu amo-te” a tua audiência - ou tu próprio! - coloca-te automaticamente no lote de bimbalhada e lamechice! (risos) Tens que ter mais cuidado com o que escreves e dizes, cantando na tua língua. Talvez os temas mais rock n’ roll, cantados em português, possam parecer um pouco fora de sítio à primeira audição. Mas aí o problema não é a música, mas o ouvido que a ouve. Durante anos e anos, o pouco rock que temos recebido de bandas portuguesas, é cantado em inglês e talvez nos tenhamos esquecido que é possível fazer e ouvir bom rock cantado em português. E sabes… se queres mudar alguma coisa, se queres fazer o teu próprio caminho, tens que ir em frente e muitas vezes desafiar o que está estabelecido. Assim que percebemos a visão do Miguel, todos embarcámos neste objetivo de cantar em português. Há, inclusive, uma música que chegou a ter letra em inglês e que acabámos por voltar atrás e reescrever toda a letra em português. Isto para dizer que estávamos – e estamos – convictos de que este é o nosso caminho. E hoje em dia, acho que todos podemos admitir que esta é uma das grandes valências da banda.
TE: Tal como o Hugo, eu também tinha algum receio de termos músicas cantadas em português, exatamente por compreender a dificuldade que é escrever na nossa língua, mas confiei na visão do Miguel e, tal como os outros elementos da banda, estou bastante feliz com o resultado.

É curioso que o álbum começa com o início de uma viagem de avião e termina com o tema Se Não Voar. Alguma vez temeram pela aceitação deste disco? Que ele, eventualmente, não pudesse “voar”?
MB:  Esta é uma questão de difícil resposta. Para nós que o criámos, é uma felicidade enorme e uma realização pessoal o lançamento do disco. É óbvio que pretendemos que o nosso trabalho seja conhecido pelo maior número de pessoas, mas nem sempre é fácil entrar no “meio”. No entanto, todas as críticas que vamos recebendo são muito positivas. Muitas pessoas já cantam as músicas connosco, o que é um sinal de que gostam e que ficam na memória. Por enquanto, estamos na fase de descolagem, mas esperamos andar pelas nuvens muito em breve.
HP: (Risos) Nem mais! Acho que posso dizer que nenhum dos membros da banda teme pela não aceitação do disco. Nós vemos a coisa da forma oposta. Nós acreditamos é que o disco possa ser bem aceite! E francamente, isso tem acontecido. Tal como o Miguel, também eu acredito que a arte que fazes tem que ser, em primeiro lugar, para ti próprio. Se este projeto não fosse meu, será que eu ouviria Comitiva Charlie? Consumiria o tipo de música que estamos a fazer? No meu caso, claro que sim! Gosto muito do que estamos a fazer. E, portanto, aqui temos a tal realização pessoal em primeiro lugar. Mas não acaba aqui. Qualquer músico gosta de ser ouvido e respeitado por uma audiência tão grande quanto possível. Mas a grande dificuldade que um músico independente encontra é mesmo conseguir chegar às grandes audiências. É certo que há muitas plataformas para chegar às pessoas nos dias de hoje mas também é verdade que as audiências estão tão dispersas e partidas, que se torna mais difícil lá chegar quando não se é agenciado, quando não se tem aquela pessoa do ramo que faz um telefonema e logo se abrem 10 portas. Penso que aqueles que até agora já nos abriram a porta, já perceberam que a música que fazemos tem potencial para que as pessoas gostem dela. Falta apenas que mais portas se abram, mas vamos continuando com a nossa luta! (risos)

Já agora, que abordagem fazem em termos líricos?
MB: Em termos líricos tentamos abordar vários temas que nos movem enquanto pessoas. Desde mensagens de intervenção e revolta, passando por recordações de infância, momentos de rebeldia, romantismo e convicções. Cada um identificar-se-á a si próprio nas letras e acreditamos que é um grande trunfo do nosso projeto.
HP: Cada música conta a sua própria história. E há de tudo no disco Mil Voltas ao Contrário. As mensagens estão lá e as pessoas só as têm que retirar e tomá-las para si mesmas.
TE: O que eu acho interessante no nosso disco é que, apesar de o Miguel e o Hugo terem escrito as letras de forma a cada uma delas contar a sua própria história, no final acabámos por ter uma narrativa geral, não planeada, bastante interessante. É quase como se se tratasse de uma história de mudança de alguém que se sente preso ou oprimido por algo (como por exemplo nas músicas Vozes Canibais e Perdição) mas que tenta de alguma forma libertar-se (Palco da Vida e Rímel & Baton). Isto quando associado à imagem e à temática dos aviões que usamos no CD torna isto numa espécie de viagem cujo objetivo é a mudança. É verdade que a julgar pela letra da Se Não Voar a viagem pode não ter acabado lá muito bem, mas isso está tudo em aberto.

Em termos musicais, de que forma descreveriam a vossa sonoridade, para quem não vos conhece?
MB: Somos uma banda de rock, que canta em português. É a nossa identidade por definição. Fomos buscar a nossa bagagem musical clássica com adaptações de modernidade. Pretendemos também ter diversidade nos nossos temas e foi com certeza algo que alcançámos. Não queremos ser apenas mais uma banda, mas “a banda” de rock que poderá implementar-se no mercado nacional, como tantas outras que cresceram nos anos 80 e 90.
HP: Penso que três coisas nos definem: 1) Ouvimos todos os discos de rock clássico e daí tirámos influências; 2) Não estamos, porém, presos ao passado e portanto também não nos consideramos revivalistas… o nosso som é moderno; 3) E cantamos em português! Resumindo: tocamos rock em português que, tendo influências no rock clássico, também soa como novo e moderno.

Sei que recorreram a uma campanha de crowdfunding que foi muito bem-sucedida…
MB: A campanha foi um sucesso! Conseguimos ultrapassar o nosso objetivo graças ao apoio de várias dezenas de pessoas que acreditaram em nós. Ficámos muitos orgulhosos e também surpreendidos pela atenção que o nosso projeto mereceu. A campanha permitiu-nos lançar o nosso CD e efetuar os respetivos licenciamentos. Estamos muito gratos a todos os que participaram.
HP: A relação que uma banda cria com as pessoas que colaboram na sua campanha de crowdfunding fica automaticamente muito forte. Achamos que as dezenas e dezenas de pessoas que acreditaram no projeto e colaboraram nele, passaram a fazer parte da música dos Comitiva Charlie. E é por isso que antes de enviarmos a master do CD para a fábrica, decidimos incluir os nomes de todos os nossos apoiantes nos agradecimentos do álbum.

Têm algum vídeo deste álbum?
MB: O nosso single Veneno foi o primeiro a ser lançado em vídeo e conta já com mais de 1.500 visualizações. O tema Palco da Vida também já está disponível em vídeo, com um formato muito curioso, totalmente com animação LEGO. Brevemente iremos lançar os vídeos de mais dois temas do álbum.
HP: Sim, neste momento temos dois videoclips já lançados e teremos muitos mais no futuro. O próximo vídeo será da música Aos Outros e estará disponível nos próximos dias. Fiquem atentos às nossas páginas web. 

A apresentação do álbum decorreu a 9 de setembro, em Lisboa. Como decorreu a festa?
MB: A apresentação oficial do álbum serviu para demonstrar ao vivo o resultado do nosso trabalho, num ambiente intimista, com a comparência, principalmente, das pessoas que nos ajudaram na nossa campanha de crowdfunding. Foi uma experiência muito emotiva e enriquecedora, pois foi a primeira vez que revelámos o produto da nossa criação. Foi um sucesso!
HP: Sim, tocar em ambientes intimistas é sempre muito especial. Foi um dia inesquecível para toda a banda, certamente.
TE: Foi um dia muito especial para a banda. Foi a primeira vez que mostrámos a nossa música a outras pessoas por isso estávamos bastante entusiasmados. Correu tudo lindamente!

E a partir dessa data, o que têm agendado em termos de palco?
MB: No dia 21 de outubro atuámos na Fnac Almada Fórum, para um showcase que apresentou uma adesão de público muito positiva. Foi também aí que nos apercebemos do público a cantar as nossas músicas, transportando-nos para sensações muito gratificantes. De momento, estamos a agendar datas para 2019, tendo já perspetivados concertos em festivais e concursos de bandas. Estamos numa fase embrionária, mas a caminhar a bom passo no processo de divulgação de Comitiva Charlie.

Obrigado! Foi um prazer. Querem acrescentar mais alguma coisa?
MB:  Agradecemos esta oportunidade e a excelente review que o Via Nocturna nos proporcionou. É gratificante que o nosso trabalho seja reconhecido e receba críticas tão positivas. Aproveitamos para divulgar a todos os leitores a nossa página de Facebook e Instagram – Comitiva Charlie, bem como o nosso site oficial www.comitivacharlie.com, para que possam estar a par de todas as novidades.
HP: Continuem o bom trabalho na divulgação da boa música portuguesa, sendo um dos melhores sites de música em Portugal, caros amigos do Via Nocturna. E obrigado por nos abrirem a porta!
TE: Obrigado pela oportunidade e parabéns pelo excelente trabalho!


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