Entrevista: Miguel Gizzas


Se cruzar literatura com música já não deve ser fácil, então adicionem o cinema. O nome responsável por este gigantesco passo artístico é Miguel Gizzas que depois do romance musical já começou a percorrer o país com o seu cine concerto de O Dia em Que o Mar Voltou. Fomos falar com o músico para perceber a orgânica de todo este pioneirismo artístico que, para já, só existe em Portugal.

Olá, Miguel, como estás? Obrigado por aceitares fazer esta entrevista. Não deixa de ser curioso o teu trabalho e a sua definição. Portanto, começaríamos por aí: em que consiste um romance musical?
Na prática, um romance musical é um livro. Só que em vez de ser apenas uma história escrita, tem acesso, através de códigos QR e de um telemóvel, a alguns temas musicais. Ideologicamente, um romance musical é algo que faz todo o sentido. A junção de duas artes que até hoje têm vivido separadas. O cinema e o teatro, as outras duas artes narrativas, têm convivido com a música desde sempre. A literatura, por ser um processo mais individual e não de grupo, não tinha até agora a possibilidade de se associar à música. Isso mudou com a evolução da tecnologia nas nossas vidas. E este é o primeiro resultado dessa evolução.

Quando te surgiu a ideia de avançares para um projeto tão arrojado?
Toda a minha evolução tem partido da autocrítica. A ideia de um músico avançar para a escrita surgiu da vontade de criar uma história maior com as histórias individuais das músicas do meu primeiro álbum. A ideia de avançar depois para o cine-concerto nasceu de ter percebido que tinha no livro as músicas e a história, mas de, em cima do palco, ter apenas as músicas. Queria dar a quem me fosse ver a mesma sensação global que tem quem me lê. Foi assim que decidi avançar para este cine-concerto.

Considerando, precisamente, esse arrojo, sentiste que houve aposta na tua ideia e as portas se abriram ou nem por isso?
Em Portugal há muitos espaços culturais abertos à inovação. Quando os programadores se aperceberam do que, de facto, era este cine-concerto, a aceitação foi muito positiva.

Pelo menos algumas terão sido abertas atendendo a alguns nomes de referência que contigo colaboram…
Para grande orgulho meu, tenho grandes nomes do teatro e do cinema a darem a voz à animação do filme. Desde o Ricardo Carriço ao Luis Filipe Borges, passando pelo João Didelet, Sofia Nicholson, André Nunes, António Camelier, Carolina Carvalho… Todos quiseram dar o seu contributo para se associarem à causa solidária que está por trás desta obra.

Neste caso, em particular, e sendo já este o teu segundo romance musical, a história retrata uma hipotética destruição de Lisboa por um novo terramoto. Sendo certo que cientificamente isso poderá acontecer, de que forma cruzaste a parte científica com a artística?
Antes de iniciar a escrita, tive um ano de investigação aturada. Apesar de o romance ser um espaço de imaginação, queria que as pessoas sentissem o que de verdade pode acontecer a Lisboa. Houve muitas coisas que inicialmente imaginei e que acabei por alterar por perceber que não eram possíveis.

Ao vivo, deve ser uma experiência fantástica. Achas que a consegues descrever por palavras?
Muito difícil. A verdade é que a aceitação do público tem sido muito, muito positiva. Os que já tinham lido o livro divertem-se com as comparações da adaptação cinematográfica. Os que não tinham lido saem satisfeitos com o bónus de uma história em cima de um concerto ao vivo. Na verdade, a procura de livros a seguir aos concertos é muito significativa, o que demonstra a bondade deste conceito.

Suponho que deve ser necessário um trabalho de coordenação monumental. De que forma preparaste as apresentações ao vivo?
A melhor forma de responder a isso é: ainda hoje, e já vamos para a quarta apresentação em um mês e meio, estamos a alterar a forma de projetar e coordenar a música com o filme. É um trabalho monstruoso, mas o trabalho não nos assusta. Corremos com a motivação de sermos os primeiros a fazer isto.

De que forma este conceito está aberto a eventuais improvisações nas apresentações?
Eu sou um improvisador. Devo-o a 10 anos a cantar ao vivo, em bares, a entreter o público em mais de 500 atuações. Era difícil não improvisar. Mas aqui tento conter-me, há uma história para contar, o ritmo deve ser entregue a quem está a ouvir e a ver, não o devo impor eu.

Já que falamos de apresentações ao vivo, fala-nos da tua agenda para este ano…
Está extensa. Iniciámos no Estoril, Leiria, Lisboa e Gouveia. Agora vamos para Évora (7/Mar), Lousã (30/Mar), Castelo Branco (6/Abr), Moçambique (6/Mai), Albufeira (10/Mai), Maia (25/Mai) e seguimos por aí fora. São já 18 cine-concertos marcados, com muitas confirmações mais, dentro de pouco tempo.

Mais uma vez obrigado, Miguel Queres acrescentar mais alguma coisa?
O óbvio: temos algo muito novo. Que valorizemos o que é nosso. Para isso convido todos a aproveitarem para ver este cine-concerto, para já só existe em Portugal, assim como a obra é pioneira, também pioneiros serão os que um dia poderão dizer que foram os primeiros a vê-la.

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