Nos últimos anos, Telmo Pires foi conquistando
o público e os media pela Europa, sendo o seu nome associado não só a
uma nova voz, mas também a uma nova imagem e postura no Fado contemporâneo.
Depois de Fado Promessa, em 2012 e Ser Fado, em 2015, Através
do Fado é o terceiro álbum gravado e produzido em Portugal. Aqui Telmo
Pires, assume também a responsabilidade de coprodutor, ao lado de Davide
Zaccaria, músico e produtor dos álbuns anteriores. E foi a propósito desta nova
proposta que fomos falar com o Brigantino que cedo rumou à Alemanha e que
descobriu o fado pelas vozes de Amália e Carlos do Carmo.
Olá Telmo e obrigado
pela disponibilidade. Para começar, porque quatro anos entre o último
lançamento, Ser Fado, e este Através do Fado?
O último álbum que lancei (o
segundo produzido cá em Portugal) Ser Fado foi em 2016. Passaram 4
anos e no início de 2019 a ideia nem era fazer um álbum inteiro, mas de lançar
regularmente singles em formato digital. Foi depois no verão que
decidi com a minha editora Alemã trabalhar um novo álbum. Acho que
tudo tem e acontece a seu tempo. A edição dos meus álbuns varia entre três e
quatro anos de intervalo. Tempo para evoluir cada vez mais e amadurecer.
Este teu novo disco traz
uma mistura de temas originais com algumas versões, embora neste campo não te
cinjas exclusivamente ao fado. O que te orienta na altura da escolha das
canções às quais irás dar novas roupagens?
Tudo o que faço e o que acontece é
sempre de uma forma muito orgânica. Muito por intuição. Há sempre temas meus
que quero cantar, fados que adoro... principalmente com novos poemas... como o
tema Não Sou Nascido do Fado com letra de Ana Laíns e Sem Peso
ou Medida de Tiago Torres da Silva. Depois há dois temas que
sempre desejei cantar... e como já aqui referi, tudo tem o seu tempo. Neste
momento, o tempo de prestar homenagem à Maria Guinot com o tema Silêncio
e Tanta Gente e a Carlos do Carmo com o tema Uma Flor de Verde Pinho.
Quanto aos originais,
neste disco tens algumas composições tuas. Sentes-te mais como um compositor ou
como um intérprete?
Por acaso, nunca pensei nas categorias
de "ser uma coisa ou outra". Desde o início do meu percurso, tive
sempre a necessidade de também escrever e compor. Tudo faz parte de mim.
É natural para mim. Mas não me considero poeta, nem compositor. Faço o
que sinto, o que gosto, o que me inspira... faço música… Simplesmente.
A tua forma de
interpretar o fado acaba por ser um pouco diferente. Podemos falar que és um
artista completo e não apenas um fadista?
Não sei bem em que consiste essa
diferença, a qual muita gente se refere. Eu sempre fiz tudo à minha maneira.
Como eu o sinto, como eu vejo as coisas, como as tento transportar. Nunca
tive 'professores' ou 'mestres'. Tudo que sei, tudo o que faço é inato. Cada um
de nós é um original, nunca tentei "copiar" um certo estilo ou uma
certa forma. E nem saberia como (risos).
E achas que tem sido
essa tua postura que te tem granjeado sucesso, essencialmente, além-fronteiras?
Não sei dizer. Não sei como as coisas
seriam se eu fosse diferente... minha postura, atitude, maneira… Posso sim
dizer que nos meus espetáculos o feedback é muito positivo. O público
aplaude-me efusivamente e compra os meus álbuns. Essas atitudes deixam-me
feliz, são o meu “alimento” e dão-me força para continuar. Tenho tido concertos
fora de Portugal porque sou convidado a isso, claro que o meu sonho seria
cantar muito mais no meu país. O facto de não ter um manager que me
represente em Portugal dificulta a possibilidade de atuar mais por cá, local
que escolhi viver desde há 6 anos. O que eu vejo nos outros países é que
a maior parte das pessoas - refiro-me ao público internacional - na maioria,
desconhecem que há homens no Fado. Os profissionais, agentes e promotores (que
90% são masculinos) referem que "homens no fado não vendem". Acho que
está tudo dito.
Nasceste em Bragança e
foste ainda criança para a Alemanha. Por isso, de que forma é que o fado entrou
na tua vida? É apenas quando regressas a Portugal ou ainda antes?
As duas vozes que me levaram a
descobrir o Fado foram as da grande Senhora Dona Amália Rodrigues e
de Carlos do Carmo. Ouvia-as em discos e cassetes que os meus pais
tinham na Alemanha quando era criança. Houve imediatamente uma ligação... não
sei explicar. Mais tarde, na adolescência, cantava eu em bandas de
música na escola e fui descobrindo a poesia e música portuguesa. O que
posso dizer, é que essas duas vozes me influenciaram tanto, que sem elas não
estaria hoje a fazer o que faço.
Este álbum tem outra
particularidade – gravaste ao vivo em estúdio. Porque decidiste tomar essa
opção?
Eu sinto-me mais como um artista de
palco do que de estúdio. Desta vez quis tentar captar a energia que há em
palco, as dinâmicas, a intensidade. Já fiz isso num álbum em 2009 gravado ainda
na Alemanha com uma pianista de Jazz muito conhecida - também gravámos
todos os temas live e foi uma ótima experiência.
De que forma Davide
Zaccaria é importante, não só no teu percurso musical, mas também, e
principalmente, no nível atingido em Através
do Fado?
O Davide Zaccaria além de ser
um grande músico é uma excelente pessoa e também um grande amigo. Foi a
primeira pessoa que me deu a mão em 2010 quando decidi vir viver e
trabalhar em Portugal. Até hoje continua a ser uma das poucas pessoas que me
tem ajudado. Criámos de imediato uma grande e sólida base de confiança e
respeito tanto a nível profissional como pessoal. Neste trabalho assumiu
completamente a responsabilidade pelas gravações e, em todas as minhas
incertezas ele dava a sua sincera opinião e ajudou-me em várias decisões. Além
disso, participou como músico no meu álbum, onde gravou violoncelo em dois
temas: Só o Meu Canto e fez um arranjo de cordas para o tema Uma Flor
de Verde Pinho.
Obrigado, Telmo! Queres
acrescentar mais alguma coisa que não tenha sido abordado nesta entrevista?
Dizer que há um novo single. Um
Fado tradicional Fado Cravo de Alfredo Marceneiro com um
belíssimo poema do Tiago Torres da Silva. Chama-se Sem Peso ou Medida
e lancei com um videoclip feito por mim, já quase no final da quarentena
e foi divulgado no dia 8 de maio. Um grande obrigado da minha parte e até um
dia. Um Abraço.
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