Entrevista: Dogma

 


Se Reditum já tinha deixado boas impressões, a confirmação surge com Mallevs Maleficarvm. O segundo disco dos Dogma é magnífico e mais uma prova não só da vitalidade da cena nacional, mas também, e principalmente, da sua criatividade. Para nos falar desta intensa obra que junta doom metal, gothic e tradicionalismo, três dos elementos dos Dogma juntaram-se para nos responder. Foram eles o guitarrista Luís Possante e os vocalistas Gonçalo Nascimento e Isabel Cristina.

 

Olá, pessoal, tudo bem? Antes de mais, deixem-me dar-vos os parabéns por este sensacional álbum! Foi um trabalho de três anos, desde a edição de Reditum?

LUÍS POSSANTE (LP): Olá, muito obrigado. Na verdade, até mais que isso, visto que algumas das músicas que apresentamos agora no Malleus Meleficarum já tinham começado a ser construídas mesmo ainda antes de termos gravado o Reditum.

 

Todo o conceito é realmente espetacular. Como foi que surgiram poemas tão profundos e músicas tão bem trabalhadas? A questão lírica ficou, como habitualmente, entregue ao Gonçalo?

GONÇALO NASCIMENTO (GN): Nem toda, o Velho do Mar é da autoria do Luis Possante e o tema que dá nome ao álbum, Malleus Maleficarum, é composto por excertos do livro escolhidos por mim e pelo nosso antigo guitarrista João Marques.

LP: Logo desde que nos voltámos a juntar em 2014 começaram a surgir muitas ideias para novos temas. Esses temas já não tiveram lugar no Reditum, que mesmo sem eles já é um álbum bastante longo, e tivemos todo esse tempo para os preparar devidamente para serem incluídos agora no Malleus. O facto de termos tocado alguns dos temas ao vivo também nos ajudou a perceber o que resultava melhor ou pior, uma vez que pretendíamos que este novo álbum tivesse uma faceta mais agressiva.

ISABEL CRISTINA (IC): Eu adoro a poética do Gonçalo, um verdadeiro dom. Mas também acho que este projeto funciona bem porque estamos todos em sintonia, o que por vezes não é fácil. A conceção dos temas surge naturalmente e este álbum reflete bem essa harmonia.

 

E sempre em Português, o que é de louvar. E afinal, prova-se que a nossa língua encaixa bem no metal, não concordam?

GN: Eu acho que a nossa língua encaixa bem no metal ou em qualquer outro género musical universal. Para nós é natural a utilização do português, outras bandas também o fazem e apresentam trabalhos bastante interessantes. Pretendemos continuar a trabalhar no idioma que melhor dominamos, o nosso.

IC: Tecnicamente encaixar poesia em português na métrica das músicas é mais desafiante, mas já o faço desde sempre pelo que acabou por se tornar descomplicado. E a nossa interpretação dessa poesia transborda sentimento que alcança mesmo os que não dominam o nosso dialeto.

 

Musicalmente também se nota o recurso a elementos mais folclóricos. Foi feita alguma pesquisa ao cancioneiro tradicional nesse sentido?

LP: Não foi nada que tivesse sido planeado. Cada música tem a sua própria identidade e algumas delas como o Velho do Mar refletem, sem dúvida, um lado mais folclórico e tradicional. Limitámo-nos a seguir o que a própria música pedia e acrescentar os elementos necessários que a complementassem e que achámos que concretizavam as ideias que tínhamos em mente.

 

Mas, quando partiram para a composição de Malleus Maleficarum, que objetivos e metas traçaram?

GN: Fomos compondo novos temas naturalmente, já tínhamos o primeiro álbum gravado e queríamos levar mais para os nossos concertos. Os temas do Reditum estavam bem ensaiados, o que nos permitiu aproveitar os ensaios (sim nós somos uma banda que ensaia muito) para criar composições que mais tarde iriam fazer parte de um álbum novo. Quando já estavam cinco ou seis temas consolidados, resolvemos apontar a gravação para o início de 2020.

 

Um disco que é construído com uma formação ligeiramente diferente em relação no anterior trabalho, nomeadamente com a mudança de baterista. Como foi esse processo de mudança?

GN: Não foi só o baterista, o guitarrista que nos acompanhou em todos os concertos também abandonou o projeto. Não é fácil conciliar a vida pessoal e profissional com a atividade da banda. Para fazermos um trabalho que consideramos credível é necessário tempo para nos dedicarmos a ele, respeitamos por isso as opções de quem teve de nos deixar e recebemos com agrado os novos elementos que permitem que o projeto continue.

 

Já agora, pelo que pude ver, têm um segundo guitarrista, no caso João Pedro Ribeiro. Ele que chegou a participar no disco como convidado. Assim, já é definitivamente um membro da banda?

GN: Sim, o João já participou na gravação e é neste momento um dos elementos dos Dogma.

 

Quando sentiram que havia necessidade de um segundo guitarrista? 

GN: Sempre tivemos um segundo guitarrista em palco, apesar do Luís Possante ter gravado sozinho as guitarras do Reditum, em palco era necessária a presença de outro guitarrista, de forma ao som poder ser reproduzido de uma forma fiel à gravação.

 

Entretanto, para além do João Pedro, houve espaço para outro convidado. Queres apresentá-lo e explicar de que forma se proporcionou esta participação do violoncelo?

IC: O jovem por trás do violoncelo é o Henrique Sousa que aceitou este desafio, apesar de as suas referências musicais serem um pouco diferentes. Ele é enteado da minha amiga de infância Susana. Fomos apresentados e fiquei a saber do seu gosto e aptidão para este instrumento, que eu adoro, o qual veio abrilhantar alguns dos nossos temas com a sua participação.

 

Os Dogma já por cá tinham andado nos anos 90. O que foi que na altura não correu tão bem?

GN: Não diria que não correu bem, gravar uma demo nos anos 90 não era assim tão fácil, conseguir dar concertos em locais apelativos também não e conseguimos fazê-lo. Entretanto saí da banda em 98 e ainda gravaram mais dois EPs, acho que foi uma carreira bem longa mediante as condições dessa época.

 

E já agora, como foi também o processo de adaptação a esta nova realidade causada pelo coronavírus? Sei que vos atrapalhou um bocado…

GN: A nós e a todas as bandas. No nosso caso tínhamos um bom planeamento a nível de concertos para lançamento e divulgação do novo álbum, ainda conseguimos fazer a sua apresentação ao vivo, não nos podemos queixar. Não seria justo termos razões de queixa assistindo às consequências que esta situação cria à nossa volta, o nosso problema é um mal menor.

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