Tudo
começou com João Zagalo, mas rapidamente se lhe juntou a voz e a escrita
poética de Filipa Afonso. Neste formato foi lançado Unwords pelo projeto
que até teve uma fase da sua existência sem nome, mas que agora são os Silver
& Scout. As referências aos cavalos de Lone Ranger e de Tonto foram
abordadas nesta entrevista que até acaba por surgir um pouco fora de tempo,
porque nesta altura o projeto já passou a banda e de duo passou a... quinteto.
O mentor inicial de tudo, João Zagalo explicou-nos toda esta evolução.
Olá,
João! Tudo bem? Antes de mais, obrigado por despenderes algum tempo com Via
Nocturna. Para começar, quem são estes Silver & Scout e porquê este
projeto?
Em primeiro lugar, eu é
que agradeço pela atenção dispensada. Atualmente, estes Silver & Scout
são compostos por cinco elementos (com os quais temos estado a dar concertos): Eu (João Zagalo) na guitarra, a Filipa
Afonso nas vozes, o Gonçalo Zagalo no baixo, o Rui Lucena na
bateria e o José Lencastre no saxofone. Este projeto começou de uma
forma muito espontânea, apenas comigo e com a Filipa Afonso. A ideia
inicial era somente a de editar um EP em tempos de pandemia (mais precisamente,
por alturas de abril/maio de 2020, no período inicial do primeiro
confinamento). De resto, no início, a banda não tinha sequer nome, nem era
propriamente uma banda. Tratava-se apenas de um veículo para eu ir gravando sozinho
canções em minha casa, com os instrumentos de que dispunha (guitarras, um baixo
velho e algumas percussões). Com essas bases musicais, convidei a Filipa
Afonso a acrescentar as suas letras e as suas melodias vocais. No início,
era então uma forma de ir trabalhando músicas, com as devidas restrições, em
período de pandemia.
Inicialmente eram um duo. Porquê a opção por
este formato?
O formato de duo surgiu,
em primeiro lugar, por causa dessa impossibilidade de me juntar com mais
músicos durante a fase do confinamento. Assim, eu fazia toda a parte
instrumental, incluindo a criação, os arranjos e a execução e a Filipa ficou
encarregue de toda a parte vocal, incluindo letras e criações de melodias
vocais. Em segundo lugar, deveu-se também a uma certa frustração que eu vinha a
sentir durante o período de gravações do meu EP The Lone Ranger (que
gravei quase totalmente na fase de pré-pandemia, mas que ainda não saiu): uma
vez que o EP era feito com base em colaborações com diversos músicos, alguns
deles residindo noutras cidades, a elaboração do disco tornou-se um processo
muito moroso, dependendo das disponibilidades de agenda de cada um. Às vezes
passava meses entre a gravação de dois temas ou durante a gravação de um só
tema. Reduzir a gravação de um álbum a um formato duo permitiu que o processo criativo
fluisse de um modo muito mais rápido.
De que forma surge este nome inspirado em Lone
Ranger?
O nome surgiu em resposta
direta ao tal EP a solo que eu vinha a gravar, sobre o personagem The Lone
Ranger. A certa altura, os dois projetos acabaram por se confundir um pouco
(nomeadamente, com a canção Remote Jeaulousy, que foi gravada em duas
versões, para o EP do Lone Ranger e para os Silver & Scout).
Como este projeto surgiu como uma continuação natural do EP sobre o Lone
Ranger, enquanto procurávamos nomes para esta banda, acabámos por pegar nos
nomes do Silver (cavalo do Lone Ranger) e de Scout (cavalo de Tonto). Há um
tema no EP do Lone Ranger, chamado Santa Eulália que faz, de resto, uma
referência específica ao Silver e ao Scout. Gostámos da sonoridade e assim
ficou. Muita gente, entretanto, pergunta qual de nós é o Silver e qual é o
Scout, mas não foi a intenção inicial associar esses nomes a uma espécie de
personas.
Em termos musicais e líricos, quais são as
vossas principais influências?
É um pouco difícil
indicar quais as influências musicais diretas no nosso trabalho, pois quando
estamos a compor uma música nunca pensamos, por exemplo: “vamos fazer uma
música ao estilo da PJ Harvey”. Por outro lado, há muitos artistas que
aprecio e que não têm qualquer relação com a nossa música. Nunca conseguiria
escrever um tema à maneira do Nick Drake ou do Stevie Wonder, por
exemplo. Uma velha influência que tenho é o guitarrista Rowland S. Howard,
que talvez se faça sentir em alguns sons de guitarra. Ou Roxy
Music, Bill Callahan, Mazzy Star ou Young Marble Giants.
Mas é muito difícil
estar a apontar influências diretas e serão sempre inconscientes. Relativamente
às influências líricas, enderecei a pergunta à Filipa, pois é ela que escreve
as letras. No que lhe diz respeito, quanto a influências, tratam-se também de influências
inconscientes, que certamente estão presentes nas letras. Todavia, as letras
nascem de uma multidão de influências, não só do âmbito da música, mas da literatura
e até da Filosofia (dada a profissão da Filipa, que está ligada à área da
Filosofia).
De alguma forma, a pandemia influenciou
positiva ou negativamente o aparecimento deste disco?
A pandemia influenciou
positivamente o aparecimento do disco pois provocou uma certa urgência e
vontade de fazer um trabalho como resposta ao confinamento. Provavelmente, se
não tivessem sido impostas todas estas restrições, o disco não teria saído,
pelo menos da forma que saiu. E se saísse seria sempre mais “polido”,
provavelmente trabalhado com mais músicos. Uma vez que estávamos impedidos de
frequentar estúdios e de nos encontrarmos fisicamente com outras pessoas,
acabou por ser uma “justificação” para o álbum ser tão minimal e pouco polido. Por
outro lado, a pandemia afetou negativamente a promoção do disco, pois na altura
em que saiu era bastante complicado dar concertos. Por isso tivemos de esperar
pacientemente. Apenas agora, passado mais de um ano, é que o conseguimos fazer.
Digitalmente o disco saiu o ano passado. Mais
recentemente, foi o lançamento físico. Conseguiram fazer a apresentação ou as
limitações impostas impediram esse momento?
A apresentação ao vivo
foi feita há muito pouco tempo. As limitações impostas pela pandemia impediram
que tivesse sido há mais tempo, mas também foram necessários alguns meses para
conseguirmos fazer a transposição dos temas tal como estão no disco (gravado em
casa, apenas por duas pessoas) para um formato que inclui 5 elementos. Os temas
foram crescendo e sofrendo muitas transformações. Cada elemento que entrou
imprimiu o seu cunho pessoal e os arranjos são agora feitos por todos. Acho
interessante comparar a experiência de ouvir o disco inicial e as novas
versões, ao vivo, que saem bastante
diferentes.
De alguma forma, a pandemia influenciou
positiva ou negativamente o aparecimento deste disco?
Os temas têm nascido
sempre a partir de uma base musical criado por mim. No caso do EP Unwords
eu criei e gravei todas as bases musicais, incluindo arranjos. A partir daí,
mostrei-as à Filipa, que, a partir de poemas que já havia pré escrito (ou seja,
não os escreveu propositamente para os temas) criou as melodias vocais. O EP teve ainda a preciosa ajuda do Fernando
Ramalho, meu companheiro musical nos Blaze & The Stars, que deu
preciosas sugestões de arranjos musicais e vocais e que o produziu. A
sonoridade final do EP também se deve ao seu contributo.
Se te pedisse para comparar este trabalho com
os teus outros projetos, o que me dirias em termos de semelhanças e diferenças?
Em primeiro lugar, há
logo uma grande diferença: é a primeira vez que trabalho com uma voz feminina.
Outra diferença: nos Silver & Scout (no caso do EP Unwords,
nomeadamente) a criação de todas as músicas e da sua estrutura foi feita por
mim. No caso das bandas onde trabalhei anteriormente, os temas eram sempre
feitos através de uma colaboração entre todos os membros da banda, o que
envolve sempre uma cedência de alguma das partes (em muitos casos, a música até
fica melhor). No disco Unwords respondo totalmente por toda a parte da
criação musical. Não me preocupei minimamente com a criação das melodias
vocais, pois a Filipa fê-lo com uma enorme naturalidade. As músicas que têm
sido criadas desde a entrada dos outros elementos já são um pouco diferentes,
pois eles contribuem, naturalmente, nos arranjos e na sua execução.
O que é que estão a planear para promover este
disco? Já há algo definido?
Neste momento, tal como
tem acontecido desde o início, com a banda, tem sido tudo muito espontâneo, ou
seja, não temos grandes planos a médio ou longo prazo. Vamos tentar dar o maior
número possível de concertos. Por outro lado, estamos a finalizar um EP,
gravado nos estúdios do Flak, e no qual participam todos os cinco
elementos dos Silver & Scout. Será certamente um trabalho diferente
do EP Unwords. A data de lançamento do EP é indefinida, mas sairá este
ano, algures depois do verão.
A terminar, João, mais uma vez obrigado e
dou-te a oportunidade de acrescentar algo mais ao que já foi abordado nesta
entrevista?
Queria apenas salientar,
mais uma vez, a importância dos restantes três elementos (para além de mim e da
Filipa), que se juntaram, entretanto, à banda. A presença do Rui Lucena,
do Gonçalo Zagalo e do José Lencastre é bastante importante e
acrescenta uma nova sonoridade, tanto a nível de concertos, como a nível de
composição dos novos temas.
Comentários
Enviar um comentário