Hugo
Pinto e André Sousa são músicos que têm estado bastante ativos em diferentes
projetos, sendo os mais próximos de nós |UGO| (com os dois elementos) e
Comitiva Charlie (apenas com Hugo Pinto). Entre eles, ou melhor, até mesmo
antes de um deles, existem os Alves Baby, em formato trio, que se estrearam há
10 anos atrás com Rissol Aquecido, ao qual se seguiu
o álbum deste ano Bonito Serviço. E para nos falar desta nova aventura
discográfica falámos com dois dos elementos: Hugo Pinto e André Sousa.
Olá, Hugo e André!
Obrigado pela disponibilidade! Bem podemos dizer – que bonito serviço vocês têm
aqui… (risos)
HUGO PINTO (HP): É verdade!
(risos) Está um bonito serviço, está! Falando mais a sério, é para nós um
grande prazer olhar para este disco finalizado, que conta tantas histórias para
nós e fecha com chave de ouro um belo e largo período de tempo em que
estivemos, ao longo dos anos, a trabalhar em estúdio nestas ideias musicais.
Para nós, ter lançado este disco é uma sensação duplamente boa: podemos voltar
a esse tempo criativo em que estávamos os três em estúdio, a partilhar e a
desenvolver ideias e, por outro lado, podemos finalmente partilhar com o
público a nossa música neste longa-duração. Um “bonito serviço” a todos os
níveis, portanto! (risos).
ANDRÉ SOUSA
(AS): Já para não falar que podemos deixar de ouvir aquelas demos
gravadas com o telemóvel e passar a ouvir as músicas com a qualidade que
merecem (e sem aqueles pregos e asneiras que as demos costumam
ter...)!
Sabendo que a primeira
gravação dos Alves Baby já foi há uma década, na altura Rissol Aquecido, pergunto se a
banda esteve parada e foi reativada agora ou nunca chegou a parar?
HP: Alves Baby
nunca esteve totalmente parado. É certo que passaram bastantes anos entre o
lançamento de Rissol Aquecido e deste Bonito Serviço, mas tal
deveu-se a outros projetos musicais (e não só) que fomos desenvolvendo ao longo
destes anos. Houve temporadas grandes em que estivemos sem trabalhar nestas músicas,
mas sabíamos da qualidade e relevância do que estávamos a fazer e, por esse
motivo, sabíamos que havíamos de lançar estas músicas na altura devida para
todos os elementos. E essa altura foi esta.
AS – Sim, Alves
nunca está parado, nós até gostamos de pensar em Alves como uma entidade, e não
como uma banda ou projeto musical, e nesse sentido, Alves pode até descansar um
pouco, mas nunca para!
No caso do Hugo, neste
intervalo andaste pelos |UGO| (aqui também com o André) e Comitiva Charlie. De
que forma é que estes três projetos se cruzam?
HP: Sim, é verdade.
Lancei o projeto |UGO| em 2015 e, depois, os Comitiva Charlie em
2018. Mas há aqui uma história curiosa que vale a pena partilhar. É que os Alves
Baby até surgiram no intervalo das sessões de estúdio para o álbum do
projeto |UGO|. Estando no estúdio a trabalhar nas músicas de |UGO|
e apetecendo-nos espairecer e tocar algo novo e refrescante nas pausas das
sessões de gravação, começámos a construir as bases para o que viria a ser
aquele primeiro EP, Rissol Aquecido, dos Alves Baby. E embora o
projeto |UGO| até tenha começado a ser trabalhado previamente, o EP de Alves
Baby viria a ser lançado primeiro. Isto porque o projeto |UGO| tinha
uma envergadura maior, com tantos artistas convidados e, naturalmente, acabou
por demorar mais algum tempo a ser lançado.
AS: Na verdade essa
é para mim uma parte muito importante da história de Alves Baby, a
maneira pouco (ou nada) planeada como as coisas aconteceram. Estávamos num
espaço criativo, tanto espaço físico como mental, e as coisas simplesmente
começaram a sair dos amplificadores e da bateria, e colavam de forma natural,
nunca houve demasiadas dúvidas ou corte e costura das músicas de Alves.
Para quem vos conhece dos
outros projetos, que pontos de contacto ou de afastamento há entre eles?
HP: Falando
concretamente do projeto |UGO| e dos Comitiva Charlie, acho que Alves
Baby é algo muito diferente. O projeto |UGO|, tendo uma matriz
assente no rock, embora de uma forma muito eclética, bem à semelhança
dos meus gostos musicais, foi algo muito singular e único e nem considero que
se trate, propriamente, de uma “banda”. Foi mais fazer as músicas que eu queria
e convidar amigos músicos que admiro para se juntarem ao projeto. É quase um
álbum a solo. Já Comitiva Charlie é uma música mais “de banda” e é rock
simples e clássico, cantado em português. Algo que, infelizmente, cada vez é
mais difícil de encontrar por cá. E que merece continuar a ser feito. Quanto a Alves
Baby, e ao contrário dos outros projetos, o foco não é tanto a música em
formato de canção, mas mais a música em formato de experiência sensorial. De
viagem musical. E, portanto, temos um modus operandi muito diferente,
orgânico e fluído. Qualquer coisa pode se transformar numa música. Como
qualquer saída que fazemos diariamente de casa se pode transformar numa viagem
idílica.
AS: Já para não
falar que em Alves estão presentes as influências de três pessoas distintas,
mas que depois dão origem a algo que está sempre a oscilar entre a homogeneidade
e a heterogeneidade. Ou seja, temos sempre uma pitada do hard rock do
Hugo, do pop/brit-rock do Bruno, e do meu post-rock/metal, mas de
certa forma eles não competem pelo espaço, vivem em harmonia.
Um dos aspetos
interessantes de Alves Baby são as escolhas para nomes. Desde logo o nome da
banda. Como é que surge Alves Baby?
HP: A história é
divertida. Estávamos todos num bar, com mais alguns amigos, e um amigo da
banda, o Tiago Silva, falava-me de uma banda desenhada chamada Al’s Baby.
No meio de todo o barulho que havia no bar, o baixista, Bruno, não ouviu bem o
nome da banda desenhada e perguntou: “O quê? Alves Baby?”. E pronto, foi o
suficiente para termos um nome escolhido para a banda, depois de algumas
risadas.
AS: Sim, o Bruno é
um poço sem fundo de nomes de categoria superior. Se depender dos nomes que ele
traz para cima da mesa, temos mais 3 álbuns garantidos!
Depois, os títulos dos
trabalhos – Rissol
Aquecido e Bonito Serviço (isto para já nem ir aos títulos das
músicas!). Têm algum segundo sentido escondido?
HP: Sim, claro. Alves
Baby é uma banda que está carregada de significados vários em tudo o que
faz. Nomeadamente nos nomes das músicas. Alguns até podem parecer inusitados,
mas têm sempre um significado oculto, uma inside-joke sobre algo
referente à banda ou ao mundo em que vivemos. Em alguns casos gostamos de
desvendar o porquê de certos nomes. Noutros casos, não queremos deixar a
papinha toda feita para o ouvinte e convidamo-lo a descobrir por si mesmo.
AS: Algumas músicas
até ganham significados diferentes por causa dos nomes. O caso que mais
acarinhamos é a Uruguai, do primeiro EP, que já era Uruguai antes
de ser uma música completa. E depois na fase de pós-produção descobrimos o Pepe
Mujica, que era Presidente do Uruguai, e a sua postura para com a vida, a sua
filosofia da felicidade humana que acabou por entrar na versão final da música
graças a um dos discursos mais corajosos que já foram feitos, acabou por dar um
significado à música que nunca nos tinha passado pela cabeça.
Voltando aos títulos
estranhos, Granada
de Água Benta foi o mais recente single/vídeo, depois de Sarrafo, já
lançado há um ano. Porquê a escolha destes temas?
HP: Simplesmente porque achámos que eram músicas que poderiam
representar bem a nossa música e que, em termos imagéticos, funcionariam bem em
videoclip. Que é algo de que gostamos. Também é verdade que não
“pensamos em demasia” as escolhas que fazemos. Não há grandes conflitos no seio
desta banda. Surge uma ideia e rapidamente é abraçada pelos outros. Sarrafo
era, na nossa opinião, um bom cartão de visita para o convite à viagem musical
que queríamos fazer ao ouvinte. E Granada de Água Benta era um tema mais
direto e em que queríamos abanar os nossos seguidores. Causar um impacto. Uma
explosão. Mas com coisas bonitas e bentas.
A pandemia influenciou
este regresso ou nem teve nada a ver?
HP: Sim e não.
Tínhamos as músicas pensadas há muito. Sabíamos que as queríamos lançar.
Independentemente do que quer que viesse a acontecer. Contudo, também é verdade
que a pandemia pode ter proporcionado um boost em termos de foco na
gravação e produção das músicas.
AS: Sim, acima de
tudo foi uma questão de foco, porque o trabalho já estava todo feito, era só
mesmo uma questão de criar um plano de ataque para gravar e pouco mais. Talvez
o “comboio” da pandemia tenha sido um empurrão para fazer esse plano de ataque
e colocá-lo em prática, mas não considero que seja um “álbum da pandemia”.
Considerando que o
trabalho anterior já tem 10 anos, estes temas são recentes ou têm alguns que
tenham sido criados ao longo deste período?
HP: Há temas bem
recentes, que só foram feitos no último ano, como Granada de Água Benta
ou Carapau de Corrida. Mas também há algumas músicas que foram feitas ao
longo dos últimos anos.
Em termos de gravação,
como correram as coisas?
HP: Talvez o André
seja a pessoa mais certa para responder a esta questão, pois foi ele que
coordenou e produziu todo o disco. Eu e ele falávamos diariamente sobre a
evolução das músicas, sobre coisas a corrigir e a alterar. Mas acho que como já
nos conhecemos há muitos anos, sabemos comunicar perfeitamente um com o outro e
acho que todo o processo de gravação do disco, embora trabalhoso, foi algo que
correu bastante bem e de forma serena.
AS: Sim, o processo
de gravação em Alves é sempre uma coisa muito objetiva, porque na verdade a
história já está toda pensada, é só mesmo colocar no papel (e limpar a
ocasional gralha)! (risos). A wall of sound, chamemos-lhe assim, é
sempre definida em estúdio com os três, e depois as gravações são pura e
simplesmente replicar de forma “limpa” aquilo que já temos nas demos.
Quanto a produção, normalmente é nesta fase que pensamos nos samples,
nos adornos que queremos adicionar às músicas, os sons orgânicos ou mecânicos,
que ajudam a contar a histórias mas não “são” a história. Mas até esta fase acaba por acontecer de
forma muito natural e quase sem esforço.
E quanto a palco? O que
têm planeado?
HP: Para já, não
temos planos para apresentar o disco ao vivo. Queremos, isso sim, que as pessoas
nos oiçam, nos entendam, nos conheçam, agora que o disco está finalizado.
Depois disso, logo veremos.
AS: Sim, a
prioridade era mesmo “deitar cá para fora”, o que não invalida que não
estejamos abertos a concertos. Mas na verdade estamos com projetos distintos
que neste momento estão mais alinhados com os palcos, e também temos de saber
gerir estes calendários todos!
Muito obrigado! As maiores
felicidades! Querem acrescentar mais alguma coisa?
HP: Obrigado, nós!
Pelo interesse e oportunidade. Para nós é sempre um prazer falar da nossa
música. Um abraço aos leitores do Via Nocturna, que tão bom trabalho tem
vindo a fazer pela música portuguesa!
AS: Um grande
obrigado ao Via Nocturna pelo convite para falarmos um pouco sobre isto
que nos faz tão felizes, e deixamos também o nosso convite aos leitores para
que emprestem os seus ouvidos ao nosso Bonito Serviço, e que façam deste
álbum uma coisa que é nossa, mas também é deles!
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