Reviews VN2000: MUTU; DANIEL CATARINO; DETIETI; GOD VILLAIN; JETHRO TULL

 


A Morte do Artista (MUTU)

(2023, Independente)

O tom fúnebre, de aspeto religioso, que cobre A Seita, tema de abertura de A Morte do Artista, álbum de estreia do projeto Mutu (Diogo Martins na voz, Pedro Fernandes nos sintetizadores e guitarra, Nuno Gonçalves nos teclados e João Costeira na bateria), deixa no ar a ideia de se irá partir para um grande disco. E, de facto, assim acontece. O tema seguinte, Terra de Cegos, volta a trazer uma sensação de oração, embora cruzada com uma batida que deixa no ar algo de tradicional, acentuado pelo uso do acordeão. Esta componente de tradicionalismo e de alguma inspiração muçulmana continuará presente, mais ou menos evidente ao longo deste trabalho que também continuará a desafiar o ouvinte pela capacidade de surpreender a cada passo. Essencialmente pela mistura das diversas influências dos seus membros, indo ainda buscar apontamentos psicadélicos e de world music. De uma maneira geral, os temas são bem compostos, carregam fortes imagens emocionais e desenvolvem-se numa espiral de criatividade reflexiva. Uma excelente proposta de estreia, sem dúvida. Aconselhado a quem procura sonoridades envolventes e de forte originalidade. [81%]



 

Megafauna (DANIEL CATARINO)

(2023, Saliva Diva)

Megafauna é o primeiro disco da Trilogia Bioma, onde o artista alentejano migrado no Porto, Daniel Catarino, se propõe a ligar metaforicamente as diferentes formas de vida com as especificidades humanas. O álbum surge dois anos depois do EP Isolamento Voluntário?, e 4 anos após o LP Sangue Quente Sangue Frio. Desde 2018 que Catarino se apresenta ao vivo em power trio, e o formato vê agora a sua sonoridade impressa neste novo registo, com mais rock para reforçar a acutilância das palavras. Aliás, as guitarras bem puxadas da abertura Manequim, deixam logo isso bem evidente. Texturas musicais arrojadas, com um baixo sempre oscilante a colar-se a riffs de guitarra cheios de rock ‘n’ roll (ora disfrutem lá a espetacular Berço de Ouro!). Mas, também espaços para deliciosos coros femininos (cortesia de Angelina Nogueira e Rebecca Moradalizadeh) e para se deixar embalar por guitarras ondulantes e paisagens psicadélicas. Megafauna é rock. Despretensioso e com letras inteligentes e capazes de penetrar bem fundo. Como toda a distorção que este power trio destila. [74%]



 

Serious IV (DETIETI)

(2021, Addicted Label)

A banda de prog rock avant-gard Detieti foi fundada em 2004, em Moscovo. Os seus primeiros álbuns são caraterizados por ecletismo, vibração post-Mr. Bungle, estruturas de colagem e atmosfera geral de um circo louco. Atualmente, a banda tende a ser mais calma, escrevendo músicas mais pensadas, embora muitas das aventuras musicais dos primórdios ainda coexistam com esta nova postura. Serious IV é o quarto álbum da banda, sucessor de Frogressive Punk, e volta a misturar elementos de rock progressivo, jazz e música experimental numa experiência sonora única. Com uma habilidade técnica impressionante, a banda apresenta um álbum repleto de progressões de acordes complexas, bateria dinâmica e linhas de baixo intricadas. As composições são bem construídas, com momentos intensos e introspetivos que levam o ouvinte numa viagem musical envolvente. A adição de sintetizadores e outros instrumentos menos óbvios (como mbira e didgeridoo), adicionam textura e profundidade ao som da banda. Apesar de Serious IV ser um excelente trabalho instrumental, que merece atenção, a falta de vocais pode ser um ponto fraco para alguns ouvintes, tornando algumas faixas um pouco monótonas em determinados momentos. Um disco altamente recomendado para os fãs de rock progressivo e jazz fusion que procuram uma experiência musical desafiadora. [80%]



 

Faith & Dope (GOD VILLAIN)

(2023, Independente)

Faith & Dope é o EP de transição entre o 1º e 2º álbum de God Villain. Um conjunto de cinco temas onde se pode ver a evolução para um som mais refinado e complexo, mas também mais dark e com um feeling de mais sofrimento. Uma aproximação à tirania, diria God Villain. Nós dizemos uma aproximação a vários géneros musicais, mesclados com mestria e sem timidez. De Prince aos Red Hot Chilli Peppers; de David Bowie aos Jane’s Addiction ou aos Nirvana, God Villain pesca um bocadinho em cada um. Depois, no seu trabalho de erguer um gigantesco puzzle, faz surgir algo que se pode considerar de prog pela teatralidade ou de avant-garde pela originalidade. O que não deixa de saltar à vista é a entrega do coletivo a uma obra com o seu quê de demência. O que equivale por dizer, com o seu quê de genialidade. [85%]



 

RökFlöt (JETHRO TULL)

(2023, InsideOut Music)

Os álbuns dos Jethro Tull são sempre muito aguardados, mas não havia necessidade de se apressarem tanto a lançar outro álbum. E o resultado está à vista. The Zealot Gene, datado do início de 2022, foi um disco ao nível do que se espera deste lendário nome. Um pouco gastos pelo tempo, é certo, mas ainda assim, marcante. Pouco mais de um ano depois surge RökFlöt e o som estranho que se ouve logo a abrir, em Voluspo, semelhante a um bocejo ficará marcado por ser isso em que se transformará a audição deste conjunto de temas. Um longo bocejo. Canções muito curtas, sem força, sem garra, sem atitude. E é preciso esperar quase até ao meio de RökFlöt, em Wolf Unchained, para se ouvir algo mais elaborado e interessante. Curiosidade – é o maior tema do álbum! De resto, a flauta está espetacular, como sempre, mas com demasiado protagonismo, sempre em cenários folk, medievais, barrocos ou nórdicos. Uma desilusão e, arriscamos dizer, o pior álbum da impressionante história da banda de Jon Anderson. [72%]

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