Reviews VN2000: TUOMAS ROUNAKARI; DAVIDE ZACCARIA; DONOVAN PLANT AND THE LEAFS; A JIGSAW; VÍCTOR TORPEDO
Bear Awakener (TUOMAS ROUNAKARI)
(2022, Independente)
Tuomas Rounakari é violinista, compositor e etnomusicólogo
especializado em música ritualística dos povos fino-úgricos e árticos. Na sua
formação superior, fez trabalho de campo entre o povo Khanty na Sibéria e é um
especialista em lamentos da Carélia. Por isso, no seu projeto Shamanviolin
toca melodias de canções xamânicas siberianas no violino, acompanhando o ritmo
dos tambores xamânicos com sinos de tornozelo. Mas, Tuomas Rounakari
também foi violinista dos Korpiklaani entre 2012 e 2021 com os quais
gravou quatro álbuns de estúdio [Manala (2012), Noita (2015), Kulkija
(2018) e Jylhä (2021)]. Em Bear Awakener aparece numa forma
diferenciada. Assina em nome próprio e apresenta composições minimalistas instrumentais, de folk e world music, mantendo sempre os rituais
xamânicos. Bear Awakener, no entanto, traz uma forte sensação de
natureza, de liberdade selvagem. E de uma pureza musical estonteante. A pureza
de quem faz música pela música, que cria arte a partir das suas experiências e
dos seus estudos. Bear Awakener está nos antípodas dos Korpiklaani,
foi construído a pensar no isolamento e não nas massas, foi desenhado pela
natureza. A sensibilidade do músico finlandês faz o resto. [75%]
Crianças Pela Paz (DAVID ZACCARIA)
(2023, Independente)
Mais que um trabalho musical, Crianças Pela
Paz é um projeto social de magistral importância. Foi idealizado por Davide
Zaccaria (que aqui toca violoncelo e guitarra) e consiste em convidar
crianças refugiadas a viver em Portugal (oriundas de países como o Sudão,
Síria, Ucrânia, Iraque e Irão), às quais se juntam crianças da Escola de
Jazz do Barreiro e da Casa Pia. E são estas crianças que surgem em
duetos com cantores portugueses ou de língua oficial portuguesa. O resultado é
este disco composto por 14 temas onde essas crianças compartilham o sonho de
cantar em paz com nomes como Jorge Fernando, Maria João, Tatanka,
Dulce Pontes, Paulo de Carvalho, Anjos ou Carlos
Alberto Moniz. Tudo canções que fazem parte do nosso imaginário, umas mais
recentes, outras mais antigas, mas todas elas com arranjos renovados e vozes
suaves, mas muito marcadas por duras histórias de vida. Crianças Pela Paz
fecha com Terra Prometida, um tema inédito, composto por Davide
Zaccaria e Tiago Torres da Silva onde participam todos os cantores e
todas as crianças. Um verdadeiro hino à lá USA For Africa. As
receitas provenientes das vendas deste CD, reverterão em 1/3 para bolsas de
estudo de música e 2/3 para Instituições Humanitárias. [80%]
Night Feel Good (DONOVAN PLANT AND THE LEAFS)
(2023, Angels
Blossom Records)
Donovan Plant fundou os The Leafs em 2018, depois do
seu regresso às atividades musicais ter acontecido em 2011. Nesse período
lançou dois álbuns a solo e agora, já com o acompanhamento referido, volta às
gravações com Night Feel Good, um EP de três temas. Com influências de
nomes na linha de Huey Lewis And The News, John Cougar Mellencamp
ou Tom Petty And The Heartbreakers, Night Feel Good assenta em
ritmos repetitivos de bases acústicas, sobre os quais são construídas as
restantes linhas instrumentais. Três temas é manifestamente pouco, mas este EP
revela-se pouco atrativo, com canções pouco convincentes e um vocalista em má
forma. A atender por esta amostra, se calhar, Donovan Plant deveria
regressar ao seu trabalho de detetive particular. [70%]
Like The Wolf Uncut (A JIGSAW)
(2010, Rewind Music)
Continuamos a nossa visita retrospetiva a
alguns álbuns dos a Jigsaw, banda conimbricense que parece saída do
Texas. E depois de termos passado em revista o EP Rooftop Joe, recuemos
até 2010. O, na altura ainda trio, tinha lançado um ano antes o álbum Like
The Wolf, sendo que esta versão denominada Like The Wolf Uncut foi
uma segunda edição, trazendo uma capa com uma cor diferente e dois temas
adicionais – Dreams & Feathers e Down The Willow’s Bed. Como
sempre, para além da música, cada álbum dos a Jigsaw traz uma forte
componente conceptual. Neste caso, o conceito é o das ilusões que nos roubam o
espaço. Quando o lobo deixa de ser uma figura ameaçadora e passa a ser um mero
ser vivo, torna-se o sinal da ilusão que acabou. Mas o que não acaba é a ilusão
de ouvir um conjunto de músicas envoltas em tons de um tradicionalismo sulista.
É que estes arranjos desenhados com guitarra acústica, violino, harmónica e
bandolim, ajudados pelos duetos vocais, fazem parte não de uma ilusão, mas de
uma realidade construída numa qualidade bem distintiva. [94%]
Víctor Torpedo Plays Kenneth Anger Scorpio Rising + Mix Mash (VÍCTOR TORPEDO)
(2023, Lux Records)
Mais um mês, mais um álbum do músico
conimbricense Víctor Torpedo. E, desta vez, presta homenagem a Kenneth
Anger, cineasta underground falecido em maio deste ano e conhecido
de realizar filmes experimentais sem tentativa de alcançar sucesso comercial.
No fundo, um pouco como o próprio multi-instrumentista. E se os filmes de Anger
frequentemente misturavam esse experimentalismo com surrealismo e ocultismo,
também isso se verifica neste Scorpio Rising (curiosamente, nome de um
dos filmes do realizador, datado de 1964) + Mix Mash. Duas partes de um
disco instrumental, com enorme exploração sonora nos temas da primeira parte,
nomeadamente em Narcissus ou algo mais elaborado, numa linha dark
country como em Sex Detective e Wild America. Dos oito temas
da segunda metade, há a curiosidade dos títulos em quatro (One, Two,
Three e Four). Todavia as melodias mais diretas acabam por nunca
atingir o nível da primeira parte. [71%]
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