Esta entrevista com Luís Possante encerra a jornada
dos Insaniae de forma tão emblemática quanto o próprio álbum Santos Animais. Num regresso
mais simbólico do que físico, o trabalho reflete a essência visceral e introspetiva
da banda, servindo como um marco definitivo e um tributo ao que foi uma década
de música profunda e transformadora. Entre reminiscências e despedidas, esta
conversa é um convite a revisitar um legado singular no panorama do doom
nacional, enquanto se olha para um futuro que mantém viva a chama criativa
através de outros projetos, como os Malignea.
Olá,
Luís, tudo bem? Como tens passado? O álbum Santos
Animais encerra a discografia dos Insaniae dez anos após a banda ter
terminado. O que motivou este regresso e lançamento agora, tantos anos depois?
Olá. Tudo bem, obrigado. Não foi
tanto um regresso, mas mais fechar o último capítulo da carreira de Insaniae.
O álbum estava gravado desde 2013, mas a editora em que estávamos na altura, a label
ucraniana ARX Productions, terminou funções antes que o mesmo fosse
editado. Insaniae chegou ao fim pouco tempo depois e o álbum esteve
guardado todos estes anos até recentemente o ter mostrado ao Gonçalo João da Ethereal
Soundworks que ouviu, gostou e teve a gentileza de fazer a sua edição.
Estamos-lhe muito gratos.
Este
álbum é considerado o último capítulo da banda. Há algum sentimento de
encerramento ao lançarem este disco? Se sim, o que desejam que este trabalho
represente na vossa discografia e para os fãs?
Sim, considero que este álbum
marca não só o final de Insaniae como é o álbum que resume em si mesmo
toda a experiência do que foram mais ou menos dez anos de existência da banda,
de muitos ensaios, muitos concertos, fantásticas sessões de gravação, camaradagem,
uma verdadeira viagem musical de valor único e inestimável. É um álbum terminal
e definitivo, mas é um encerrar com chave de ouro. É o álbum essencial para
quem quiser compreender o que é Insaniae.
A produção do álbum pode ser descrita como uma extensão natural
daquilo que apresentaram em Imperfeições da Mão
Humana. Como vês a evolução da banda desde esse lançamento? Consideras Santos
Animais uma continuação direta ou um desvio artístico?
O Santos
Animais é definitivamente uma continuação. Penso que os três álbuns são uma
continuação uns dos outros, sempre numa curva ascendente, e o Santos Animais
é o pináculo dessa evolução. É um trabalho mais maduro e concreto que os
anteriores e que destila toda a experiência acumulada durante o percurso de Insaniae.
Porque utilizar três línguas distintas (português, francês e
inglês)? Qual foi o critério para decidir em que idioma cada faixa seria
interpretada?
Cada uma das
faixas do álbum tem uma personalidade e sentimento específico. O recurso a
diversos idiomas foi uma forma de acentuar essa identidade própria e
conferir-lhe uma maior autenticidade e variedade. Quanto às razões específicas
para que linguagem utilizar em cada tema isso permanecerá para sempre um
mistério, uma vez que o Diogo nunca partilhou quais os critérios das suas
escolhas quando escreveu as letras. Talvez nem ele próprio saiba. Às vezes as coisas
são o que são e isso é tudo.
Faixas como Insecto Vermelho e Exposição
da Criação destacam-se pela intensidade e profundidade lírica. Como foi o
processo criativo para estas canções, e há algum tema central que seja
transversal ao álbum?
Todas as letras
são da autoria do Diogo, do ponto de vista lírico ele é que é o grande mentor
de Insaniae. Para este álbum as músicas foram construídas primeiro e só
depois de estarem terminadas é que o Diogo escreveu as letras. E foram todas
escritas de uma vez como se de um livro se tratasse e daí haver uma grande
interligação entre elas. As letras são
baseadas nos seus próprios demónios pessoais, nas suas fobias, paranoias e
ansiedades. No fundo esse é o tema central em todas as músicas, não só deste,
mas dos três álbuns: a exposição das múltiplas facetas da mente humana de forma
crua, nua e violenta.
No entanto, o título Santos
Animais sugere uma dualidade entre o sagrado e o bestial. Como surgiu este
conceito e que mensagem querem transmitir com ele?
O título foi
igualmente escolhido pelo Diogo. A ideia foi precisamente essa, a exposição da
dualidade humana e da sua inclinação tanto para o bem como para o mal de forma
extrema. Este conceito sempre esteve
presente e sempre foi explorado de uma forma ou de outra nos álbuns e nas
letras de Insaniae. Não é uma mensagem, mas sim um convite a uma viagem
de exploração pelas múltiplas facetas da mente humana nos seus mais diversos
espectros.
Por outro lado, The Remains aparenta
um caráter experimental distinto do resto do álbum. Qual foi a intenção por
trás desta composição, e em que sentido se diferencia das outras faixas?
The Remains é
uma das minhas faixas favoritas do álbum. É uma das músicas mais complexas que
já fizemos, com diversas partes, harmonias, riffs que ora divergem entre
si ora se interligam. Uma viagem menor dentro da viagem maior que é o próprio
álbum. É como que uma descida ao abismo e depois a sua ascensão e redenção.
Perfeita como término para o álbum e para encerrar o percurso da própria banda.
Sabemos que algumas das vossas influências incluem doom e gótico, e que outros projetos musicais relacionados,
como Dogma e Malignea, compartilham uma estética semelhante. De que forma
sentem esta identidade de Insaniae em comparação com estas outras formações?
Existem
naturalmente elos de ligação entre as três bandas. No entanto Insaniae é
mais visceral e intimista. Todas as letras foram escritas pelo Diogo, é uma
exposição da sua própria mente. E as músicas são mais cruas e brutas, o som
mais puro, sem artifícios nem filtros. Quisemos afastar-nos das sonoridades
mais confortáveis do gothic doom de Dogma e lançarmo-nos para
águas inexploradas e penso que o Santos Animais é testemunho que conseguimos
fazê-lo.
Para terminar, este é mesmo o final dos Insaniae? E quanto aos
outros projetos, há planos futuros que desejem partilhar com os vossos
leitores?
O percurso de Insaniae
está terminado. A banda surgiu quando tinha que surgir, os três álbuns
apareceram na altura certa. Até mesmo o facto do Santos Animais ter sido
finalmente editado tantos anos depois do fim da banda tem uma estranha razão de
ser na ordem natural das coisas. Sim, Insaniae chegou ao fim, mas a sua
existência foi perfeita. O meu projeto neste momento é Malignea. Estamos
a finalizar os novos temas para começarmos a gravar já a partir de dezembro.
Portanto podem contar com um novo álbum de Malignea para 2025.
Obrigado pela entrevista, Luís. Queres deixar alguma mensagem
final?
Eu é que agradeço
o vosso apoio. A mensagem que quero deixar é a que deixo sempre: ouçam bandas
nacionais, vão a concertos, apoiem a cena. Há sempre muito a acontecer e com a
vossa ajuda acontecerão muitas coisas mais. Obrigado!
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