Entrevista: Artnat

 

Após o aclamado álbum de estreia The Mirror Effect (2021), os Artnat regressam com um ambicioso novo trabalho: Artnat Two, um álbum duplo que explora vidas alternativas e universos paralelos através de uma sonoridade progressiva e emotiva. Conversámos com Manuel Cardoso, fundador da banda e referência incontornável do rock progressivo português, sobre a evolução sonora dos Artnat, as inspirações por detrás deste novo projeto, os desafios do processo criativo e a visão sobre o panorama musical atual. Uma viagem profunda ao universo de uma das bandas mais inovadoras do género.

 

Olá, Manuel! Obrigado pela disponibilidade para esta entrevista. Após o lançamento de The Mirror Effect em 2021, os Artnat regressam com o novo álbum duplo, Artnat Two. Como descreverias a evolução sonora da banda desde The Mirror Effect até este novo álbum? Quais foram as principais influências que moldaram este novo trabalho?

Olá e obrigado pelo apoio aos Artnat. A evolução foi tão natural que só foi sentida quando chegámos às misturas finais. Até lá foi sempre o encantamento da composição, dos arranjos e da execução. Resumindo, foi a magia natural de compormos e tocarmos a nossa música! Analisando agora a nossa evolução sentimos um amadurecimento e requinte composicional e de arranjos e uma maior sobriedade de execução instrumental. Também é notória, pelo menos para nós, uma maior e mais profunda emotividade na nossa música. A nível de influências, as nossas musicais são tão variadas que as que vale a pena mencionar são as humanistas. A evolução da sociedade, dos conflitos mundiais e das várias nuances das relações humanas diretas e digitais foram de facto inspiradoras e motivadoras. Musicalmente, toda a boa música alternativa e progressiva obviamente são sempre forças inspiradoras.

 

Artnat Two apresenta uma narrativa complexa, dividida entre vidas alternativas e universos paralelos. Como surgiu a inspiração para este conceito e de que forma procuraste transmiti-lo musicalmente?

As vidas alternativas (CD 1) são como pequenos contos musicais que, partindo de uma base ficcional permitem, mergulhar nas profundezas da alma humana e dos comportamentos das suas “personas”. Comportamentos umas vezes belos, outras angustiantes ou horríveis.  Cada tema é como um sonho, uma possibilidade ou realidade que pode ou não ter sido ou vir a ser real, mas que tem significado neste complexo universo humano. Por isso, cada tema tem um ambiente sonoro e composicional diferente e personalizado. Quanto aos universos paralelos (CD 2) foi um desafio espetacular e empolgante descrever musicalmente cenários tão intensos e diversos como planetas em formação (Track 5), totalmente gélidos (Track 4) ou extremamente belos (Track 2) ou um universo só de máquinas (Track 1).

 

A decisão de separar o álbum em dois discos, um com faixas vocais e outro instrumental, foi intencional desde o início? Qual foi o objetivo?

Houve duas razões para isso. Por um lado, a liberdade de expressão interpretativa e de arranjo que se tem ao compor um tema instrumental. É por si só um universo à parte como os músicos para aí virados sabem. Por outro lado, tínhamos temas suficientes para um CD, tanto cantados como instrumentais e de facto eles tinham já de si sido compostos para descreverem universos diferentes. Não havia razão alguma para os misturar.

 

Esta opção apresentou algum tipo de desafios ou oportunidades durante o processo de composição e gravação?

Sim. Quem ouvir os dois CDs nota que tanto a nível da bateria e baixo como das guitarras e sintetizadores a sonoridade é diferente. Sobretudo na bateria e baixo o som e a mistura têm propositadamente um desenho e sonoridade diferentes no CD instrumental. Foi um desafio, mas também um prazer conseguir essas caraterísticas.

 

Considerando a complexidade temática e musical de Artnat Two, como decorreu o processo de composição e gravação?

Aí nada mudou, pois, temos os nossos processos bem definidos. A única diferença foi uma decisão de trabalharmos com mais calma e abstração do mundo exterior para conseguirmos criar um trabalho suficientemente bom que nos satisfizesse totalmente. A resposta, sobretudo internacional, ao nosso primeiro CD tinha sido excelente e sentimos a responsabilidade, para com nós próprios, de fazer algo tão bom ou ainda melhor.

 

No primeiro CD, há uma faixa intitulada Return To Tantra. Esta música estabelece uma ligação direta com a tua banda anterior, Tantra? Poderias partilhar o significado por trás desta faixa e a sua relação com o legado desse lendário nome?

O Return To Tantra, para mim, é a recriação evolutiva, Século XXI, de um tema que compus para os Tantra e que só foi gravado ao vivo (CD - Live Ritual). O tema era o Ritual e o solo de guitarra e piano e melodia de voz desse tema estão fielmente replicados no meio do tema Return To Tantra (minuto 7 ao 10).  O espírito do tema original foi desenvolvido e transportado para o presente tanto a nível de arranjo e letras como de sonoridade. O tema transporta-nos do estado de angústia ritualista que muitos de nós sentimos ocasionalmente, à necessidade de reação e ação positiva, até à sublimação e libertação das nossas amarras. Tudo isto era Tantra e é também Artnat.

 

Tiveste algumas colaborações externas à banda. Quando sentiste que era necessário algo extra? Foi fácil encontrares os músicos que acabaste por convidar?

Não foi uma questão de necessidade, mas sim de celebração de grandes músicos e amigos que como tal têm muito a dar e assim o fizeram ajudando a este ser um trabalho especial. Foi o caso do Emílio Robalo e do Alexei Tolpygo.

 

Já quanto ao núcleo duro, digamos assim, da banda, verificam-se algumas mudanças, nomeadamente já não estão Gui da Luz nem o André Hencleeday. O que se passou?

O Gui da Luz continua na banda e recomenda-se. É apenas um erro na impressão da capa do CD. O André seguiu o seu caminho e abriu um espaço para a entrada de um novo membro dos Artnat, o João Parreira, excelente teclista que veio enriquecer a nossa sonoridade pois ele sempre foi um fã de rock progressivo e encaixou na perfeição na banda.

 

Embora o álbum tenha sido recentemente lançado, já recebeste algum feedback dos fãs ou da crítica especializada? Como tens sentido a receção inicial deste novo trabalho?

Está tudo a correr muito bem e a ser muito bem recebido internacionalmente. Em Portugal, como de costume, vai com mais calma, mas bem. Portugal é sempre mais lento a acordar para este tipo de música.

 

Com o lançamento de Artnat Two, quais são os próximos passos para os Artnat? Estão previstos concertos, videoclipes ou outros projetos que possas partilhar connosco?

Está a ser preparado um documentário sobre a banda com um videoclip.

 

Após décadas dedicadas ao rock progressivo, tanto com os Tantra como agora com os Artnat, que reflexões fazes sobre a tua jornada musical e a evolução do género em Portugal?

Bem, Portugal como acabei de dizer, atualmente não tem uma cultura de rock progressivo. Os Tantra criaram uma naquela época, mas por falta de continuidade estável (por outras bandas) e de condições para sobrevivência praticamente desapareceu como cultura. O que sobrevive são muitos fãs do estilo que praticamente só se reúnem nos concertos de algumas bandas internacionais. Houve algumas bandas interessantes nos últimos anos, por ex. Forgotten Suns, Lotus Fever e Dream Pawn Shop, mas que infelizmente gradualmente foram desaparecendo. Provavelmente existirão hoje algumas bandas interessantes, mas de que não tenho conhecimento… Fruto da tal falta de uma cultura de rock progressivo que não as traz à luz.

 

Por fim, queres deixar alguma mensagem para os vossos fãs ou para os nossos leitores?

Sim. Que se aventurem e tenham a coragem de mergulhar e ouvir todo o Artnat Two no Bandcamp. E se não gostarem de tudo bem, claro! Mas aposto que algo os vai encantar nele. Sinceramente acredito na beleza selvagem do rock progressivo dos Artnat e do nosso segundo trabalho. Penso que quem gostar de rock progressivo tem muito por onde se sentir em casa na nossa música.

Comentários

  1. Eu sou do Brasil e recentemente conheci a banda eu fiquei encantado pelo trabalho. Eu tenho pretendo escrever no meu blog a respeito e também estou pensando em fazer um programa sobre eles em uma rádio web que eu faço parte. Com certeza será muito estimulante falar sobre a banda.

    ResponderEliminar
  2. Sou Vinício Meirinho do peculiarprog.com que comentou sobre o blog e a rádio acima.

    ResponderEliminar

Enviar um comentário

DISCO DA SEMANA VN2000 #20/2025: Manifesto (CIRKUS PRÜTZ) (Metalville Records)

MÚSICA DA SEMANA VN2000 #20/2025: Queen Of The New World (GREY CZAR) (Argonauta Records)

GRUPO DO MÊS VN2000 #05/2025: Spiral Sputnik (Independente)