Entrevista: Flávio Torres

 

Depois de muitos anos ligado a diversos projetos musicais, Flávio Torres decidiu aventurar-se numa jornada a solo, mostrando uma nova faceta da sua criatividade e paixão pela música. Em 2022, apresentou-nos o seu primeiro álbum em nome próprio, e agora regressa com Cosmo Pop, onde ele, a sua banda e uma série de convidados de renome, onde se incluem José Cid e Cabrita, refletem a maturidade adquirida. Nesta conversa, falou-se sobre esse passo importante na sua carreira, as inspirações por detrás do álbum, o processo de criação e o que podemos esperar do futuro.

 

Olá, Flávio, tudo bem? Obrigado pela disponibilidade. O teu novo álbum traz um título estranho, Cosmo Pop. O que te inspirou a escolher este título?

Este título, vem no seguimento da conceptualidade que o disco traz. O mesmo tem um lado bem espiritual, além de todo um propósito mais pessoal de me expor, pelo querer motivar cada ouvinte a ouvir a sua voz interior, a acreditar em si. Vivemos num momento em que a doença mental, a depressão e ansiedade já não são um tabu e estão cada mais presentes nas diferentes classes e faixas etárias, este disco tem também a responsabilidade de apoiar estas pessoas com uma mensagem de esperança. Cosmo é o simbolismo do termos de olhar para lá deste plano terrestre e procurar uma outra visão e respostas no universo, noutras dimensões. Pop pela diversidade musical que o disco tem e pelo salto desenvergonhado de ser um trabalho que não pertence a rótulos.

 

Este é um disco que apresenta uma fusão de diversos géneros musicais, como rock, pop, folk, trip-hop, blues e world music. Como surgiu a ideia de combinar estas influências no álbum?

Como multi-instrumentista e apaixonado por música, era um disco que há muito queria fazer, um disco que expusesse algumas das minhas influências. E foi isso a que me propus desde o início da escrita deste Cosmo Pop, não ficar limitado a uma só linguagem.

 

Mas a influência das tradições portuguesas também é evidente. Foi fácil trabalhar e encontrar esse equilíbrio entre o local e o global neste trabalho?

Na verdade, foi natural, é necessário perceber que estas canções começaram a ser feitas algures em 2019, para não dizer que o tema Dá-me Mais foi totalmente escrito em 2008. Eu tanto escrevo rock, como metal, pop, folk, ou até música ambiental, eletrónica ou cinematográfica. Para este disco eu escrevi cerca de 60 canções de variadíssimos estilos e neste cancioneiro pessoal tinha uma mão cheia deste género (tradicional) de canções. A Samfado destacou-se pelo simbolismo das nossas tradições, mas também pela união das tradições do povo brasileiro e claro o ex-libris de poder ter a voz da simpática e talentosa Alex Liberalli assim como a guitarra Portuguesa do Edgar Petejo. Penso que é algo que nunca foi feito numa canção, estarem os dois países numa troca de “elogios” em prol da união e da libertação de preconceitos.

 

Grito, o primeiro single do álbum, contou com a participação de José Cid e João Cabrita. Como surgiu esta colaboração e de que forma contribuíram para o resultado final da música?

Após o tema estar praticamente gravado, senti necessidade que existisse um instrumento para alternar com a guitarra nas linhas melódicas, e para um solo, rapidamente visualizei um saxofone. O Cabrita seria o músico certo para estes apontamentos, após ter aceitado o convite muito rapidamente percebeu o conceito e as necessidades deste Grito e fez a sua magia colar na composição perfeitamente. O José Cid já vem de muitos anos atrás, já tínhamos pensado em colaborar algum dia num tema que fizesse sentido, e quando lhe apresentei o tema de imediato aceitou. O processo de gravação foi numa tarde na sua casa onde de forma muito espontânea registámos o seu lado vocal mais roqueiro. Com os seus 84 anos fazer este registo é algo de muito incrível.

 

Já o segundo single foi Vamos, tema que reflete sobre autenticidade e resiliência num mundo onde a aparência muitas vezes se sobrepõe à essência. Qual foi a inspiração por detrás desta canção?

A canção é totalmente inspirada em ambientes sintetizados mais vintage, com a contemporaniedade da batida pop, do baixo pulsante com groove anos 80 e das guitarras stoner rock, a mensagem é direta, portanto “VAMOS” ser nós mesmos neste mundo digital de falsa influência, de falsos pregadores virtuais, dos coachers que apregoam o medo e que limitam esta sociedade a serem quem não devem ser.

 

Para além dos citados José Cid e João Cabrita, o álbum conta com outras colaborações, como Alex Liberalli, Edgar Petejo, João Clemente e Bernardo Barata. De que forma estas parcerias influenciaram o processo criativo e a sonoridade do disco?

Todos eles foram convidados praticamente após o disco estar gravado, depois deste processo fui percebendo melhor quem poderia acrescentar algo e onde. Os convites foram sendo feitos com alguma direção artística, mas sempre com liberdade criativa. E todos eles fizeram um trabalho minucioso com muito amor, ao qual estarei eternamente grato.

 

Sendo responsável pela produção, composição e arranjos de Cosmo Pop, e tocando vários instrumentos, como guitarras, teclados, sarod e pianos, como descreves a experiência de assumir múltiplos papéis na criação do álbum?

Adoro o que faço, compor e o estúdio dá-me muita dor de cabeça e alguma ansiedade, mas sou muito feliz poder ver o puzzle crescer, com a liberdade de poder gravar o instrumento que eu quero à hora que quero, sem limites criativos. Adoro este papel de solidão na criação de um disco.

 

Como descreverias a evolução da tua sonoridade neste álbum, em comparação com os trabalhos anteriores? O que mudou na tua forma de compor e criar?

Para quem não me conhece isto é algo muito diferente dos outros discos, que sempre abraçaram o folk, tradicional, blues, pop. Mas isto foi sempre algo que eu fiz para a gaveta ou noutros projetos passados. A evolução de tudo isto e a preocupação de chegar ao publico com o máximo detalhe e qualidade, levou-me a ter de estudar muito, novas técnicas de produção, gravação e mixagem para que o disco tivesse esta homogeneidade no que toca à identidade sonora de produção mais moderna.

 

O álbum foi masterizado por Antonio D’Amato em Milão. Qual a importância desta colaboração internacional para o projeto?

O Damato foi muito importante é um talentoso artista de áreas mais alternativas da música italiana. Cheguei a ele através de uma plataforma de apoio a músicos e depois de ver o trabalho dele fiquei muito impressionado. Depois de longas conversas e um briefing final ele percebeu sem espinhas o conceito sonoro do trabalho e eu fiquei muito feliz com o resultado final. Foi sem dúvida uma peça importante deste disco. Esta parceria internacional não teve qualquer interesse ou expetativas para algo maior a nível de carreira fora de portas, aconteceu naturalmente. Sabemos que a música pop cantada em português não tem grande abertura lá fora, muito menos de alguém desconhecido como eu. Tudo o que vier será abraçado e agradecido, mas sem qualquer expetativa.

 

Na compra do CD ou vinil de Cosmo Pop, 1 euro reverte para a APPACDM Covilhã, uma associação dedicada ao apoio a pessoas com deficiência mental. O que o motivou a associar-se a esta causa?

Desde o início da conceção do Cosmo Pop senti a necessidade de que este tivesse um caráter social. Assim como a mensagem deste trabalho serve para encorajar e de certa forma motivar, inspirar pessoas a encararem os seus desafios sem medos. Serve também o mesmo para ajudar com o pouco que seja financeiramente uma instituição que desenvolva um trabalho junto de pessoas que sofram de doença e deficiência mental. Fico feliz só por isso, de poder desta forma ajudar.

 

Após o lançamento do álbum, quais são os planos que se seguem, nomeadamente em termos de palco ou outros?

Quero ainda lançar alguns singles com vídeo, estou a preparar um concerto de apresentação e outras datas nalgumas salas no país. Quero muito apresentar este trabalho ao vivo, vai ter uma componente de video super importante que complementa cada canção. Acho que este disco deveria ter a oportunidade de pelo menos chegar às pessoas e estas dizerem se gostam ou não. É um disco que me sugou toda a minha melhor essência e que me deu mesmo muito trabalho a fazer nestes últimos anos. Se existir público para ele terei todo o prazer de o levar onde ele merecer ir. Caso não seja possível, eu não vou parar e outros discos estarão para sair no futuro.

 

Obrigado, Flávio. Que mensagem gostarias de deixar aos vossos ouvintes e aos teus fãs?

Que sejam felizes, todos somos diferentes, tomos cometemos erros, mas vamo-nos esforçar para sempre procurarmos o melhor de nós. Muito Obrigado!

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