Com Transcendental, o terceiro
longa-duração dos The Answer Lies In The Black Void, Martina Horváth e Jason
Köhnen aprofundam a viagem musical que o duo tem vindo a esculpir num
território muito próprio e espiritual e que começou em Forlorn e se
expandiu em Thou Shalt. Munidos de vasta experiência em projetos como
Thy Catafalque, Bong-Ra, Mansur e The Kilimanjaro Darkjazz Ensemble, Martina e
Jason convergem aqui numa linguagem que designam como transcendental metal
assente numa introspeção profunda e espiritualidade latente. À conversa
connosco, abordam a evolução do projeto, o equilíbrio entre forças
contrastantes, o processo criativo e as ambições que norteiam este novo
capítulo.
Olá, pessoal, obrigado
pela disponibilidade! Transcendental é o vosso terceiro longa-duração.
Como acham que este álbum difere musical e espiritualmente de Forlorn e Thou
Shalt?
MARTINA HORVÁTH (MH): Como o TALITBV foi moldado a partir do nosso
outro projeto, Mansur, Forlorn traz melodias e arranjos musicais
de músicas originalmente escritas para o Mansur. Liricamente, inclina-se
mais para metáforas góticas, mas já aborda temas de provações com as quais
temos de lidar ao longo da vida. Thou Shalt também faz parte dessa
jornada de autoinspeção, especificamente influenciada pelo «trabalho com a
sombra» de Carl Jung e pela filosofia dos estoicos, como Séneca
ou Marco Aurélio, só para citar alguns. Musicalmente, permitimo-nos
mergulhar mais fundo nas sombras do doom e no que isso significa para
nós. Transcendental é uma continuação desse mergulho profundo na
dualidade, explorando a sombra e a luz em todo o seu espectro de emoções.
Fazemos o que nos parece natural, sem restrições na nossa criação musical. O
resultado é uma fusão única de doom pesado misturado com um ambiente
elevador, com elementos folk, corais e eletrónicos.
Vindo de projetos como
Bong-Ra e The Kilimanjaro Darkjazz Ensemble, e Thy Catafalque, que legados traz
para este projeto? Como é que as suas origens continuam a influenciar The
Answer Lies In The Black Void?
MH: Thy Catafalque requer uma abordagem diferente quando se trata
desta questão. Como não é o meu projeto, estou aqui para ajudar a dar vida às
ideias de outra pessoa, juntamente com muitos outros músicos. A minha
contribuição musical e artística consiste principalmente nas harmonias vocais
que crio para complementar as melodias existentes, bem como na energia que
trago para as canções. Venho de uma formação musical folclórica e clássica
(coral) húngara, que se reflete tanto nos Thy Catafalque como na minha
própria música. A minha formação musical influência qualquer música em que
estou envolvida, e acredito que isso é natural.
JASON KÖHNEN (JK): É claro que há uma influência de anos a fazer música
que também se infiltra neste projeto. Para mim, não há realmente um legado de
outros projetos que tenham entrado nos TALITBV. É uma bolha criativa em
si mesma. O meu caráter criativo contém diferentes bolhas de projetos musicais,
portanto haverá alguma sobreposição (in)intencional aqui ou ali.
Descreveram o vosso
estilo como transcendental metal. Podem explicar melhor o que isso
significa para vocês e de que forma essa abordagem se manifesta nas novas
músicas?
JK: Significa uma abordagem e experiência mais esotérica e parcialmente
espiritual de fazer música. Esperamos criar música que possa ser uma forma de
escapismo metafísico; a palavra transcendental foi a maneira perfeita de
capturar essa ideia.
O doom metal costuma
gravitar em torno do peso e desespero, mas a vossa música integra folk,
ambiente e eletrónica, criando peso e introspeção. Como equilibram esses
elementos sonoros contrastantes?
JK: Acho que o equilíbrio disso pode ser ouvido no álbum, as músicas contêm
esses elementos
Martina, a tua voz é um
elemento que diferencia a banda, elevando-se acima da estrutura usual do doom. Compõem
conscientemente em torno das linhas vocais, ou elas surgem depois da base
instrumental estar pronta?
MH: Hmm, varia. Às vezes, eu trago uma melodia/harmonia que inspira
o Jason. Outras vezes, o Jason já tem partes, riffs e esboços de músicas
prontos. É um processo muito flexível. Às vezes, também concordamos com a vibe
e a intensidade da música antes do processo criativo.
Recentemente assinaram
com a Lay Bare Recordings para este lançamento. O que vos atraiu na editora e
como é que a colaboração apoiou a vossa visão para Transcendental?
JK: Tivemos algumas negociações com editoras maiores que, infelizmente,
fracassaram no último momento. Por acaso, deparámo-nos com a Lay Bare e
sentimo-nos atraídos pelo ambiente acolhedor e pela ética da editora. É uma
editora que transmite calor e tem um toque pessoal incrível.
Além da intensidade, a
vossa música soa profundamente espiritual e ritualística. Existe alguma
filosofia, literatura ou influência esotérica em particular que alimenta o
vosso processo criativo?
MH: Como mencionado acima, a filosofia e a psicologia têm uma grande
influência sobre nós. O Jason também gosta de mergulhar em buracos ainda
maiores do que a nossa própria psique. Mas, basicamente, qualquer coisa nos pode
influenciar. Um bom filme, um bom livro, um poema ou apenas uma situação
emocional com a qual estamos a lidar.
Os críticos chamaram o
vosso trabalho de «mais próximo da vanguarda do que do doom, mais Sonic
Youth do que Saint Vitus». Vocês aceitam esse rótulo de vanguarda ou ainda se
sentem mais ligados à tradição do doom metal?
JK: Definitivamente, somos os melhores nos dois mundos, e isso é
perfeitamente normal, pois gostamos de todos os estilos de doom, sejam
eles clássicos ou mais modernos.
Com Transcendental,
vocês pretendem levar o doom a territórios pós-doom
inexplorados. Para onde acham que o género está a caminhar e qual o papel que
esperam que o vosso projeto desempenhe nessa evolução?
JK: Acho que é sempre bom expandir os limites de um género, novos elementos
são sempre necessários para o manter criativo e interessante. Esperamos
adicionar um pouco desse transcendentalismo ao género. Sentimos falta da
melancolia no doom moderno, há muito foco na parte pesada através do
exercício de «mostrar músculos», gostaríamos de revisitar a melancolia que
bandas como Type O Negative, Cathedral ou Crowbar colocam
na sua música. O doom não se resume apenas a notas longas e pesadas, vai
mais fundo.
Ao vivo, a banda
expande-se para uma formação de cinco elementos. Como é que a transição do
estúdio para o palco altera a música, especialmente quando se interpreta
material tão atmosférico e complexo?
JK: A equipa ao vivo traduz a música mais ou menos da mesma forma que no
álbum, por isso temos a sorte de trabalhar com músicos excelentes que
compreendem totalmente o que queremos transmitir no palco.
Depois de apoiar a
digressão europeia dos Thy Catafalque em 2024, fazer uma digressão com os
Bong-Ra e embarcar numa mini-digressão a solo no Chile, como é que a
experiência ao vivo moldou a vossa identidade como banda?
MH: Muitos de nós atuamos em palco há 25-30 anos, e alguns de nós já
tínhamos partilhado o palco antes, por isso houve poucas surpresas nesse
aspeto. Quanto à química entre nós, atrevo-me a dizer que, no nosso caso, ela
surgiu muito rapidamente.
Obrigado pelo vosso
tempo. Gostariam de deixar alguma mensagem para os fãs que vão ouvir The Answer
Lies In The Black Void pela primeira vez?
MH: Estamos cientes de que a nossa música não é para todos. Ela exige toda
a sua atenção e uma mente aberta, mas, quando ressoa, mundos inteiros se podem
abrir. Ela é repleta de emoções e força. Com a nossa música, podes experimentar
tanto profundidades quanto alturas, envoltas em vibrações góticas e sombrias, apresentando
fragilidade e peso, escuridão e luz.



Comentários
Enviar um comentário