Entrevista: Ladon Heads

 

Formados em 2022, os Ladon Heads têm sido um dos nomes mais entusiasmantes da nova vaga de heavy metal tradicional em Portugal. Herdeiro assumido da escola clássica, mas com personalidade própria e uma energia irreverente, o quarteto tem vindo a construir o seu caminho com passos firmes. Em 2025, o lançamento do álbum de estreia Steel For Fire, pela prestigiada Lost Realm Records, marca um ponto de viragem na ainda curta, mas já muito expressiva história da banda. Para saber mais sobre a evolução, os desafios, a visão artística e o espírito épico que guia a banda, estivemos à conversa com o vocalista e guitarrista Fernando “Infernando” Ferreira.

 

Olá, Fernando, tudo bem? A última vez que conversámos foi em 2023. O que têm feito os Ladon Heads desde essa altura?

Boas, grande Pedro, é um prazer voltar a conversar convosco! Bem, aconteceu muita coisa (risos). Quando conversámos, tínhamos acabado de lançar as duas primeiras demos e estávamos prestes a dar o nosso segundo concerto. Entretanto, andamos a tocar mais uns poucos concertos e acabamos por conseguir também gravar e lançar o primeiro álbum.

 

A banda formou-se em 2022, mas há menção a que os riffs e a vontade vêm de antes. Que papel teve o vosso passado, como o projeto thrash Warizon, na génese dos Ladon Heads?

Eu e o Rui (guitarrista) começamos a tocar guitarra mais ou menos na mesma altura (talvez 2008) e desde que descobrimos que estávamos ambos a dar os primeiros passos, acabamos por nos juntar e a tocar em conjunto com muita frequência. Tentamos sempre criar música, ainda que no início como podes imaginar não saísse grande coisa (risos). Com isto, como éramos mesmo muito verdinhos, acabou por ser um projeto que nunca saiu da cave, por assim dizer. Nunca conseguimos uma lineup completa, nem tocar ao vivo, nem gravar. Mas divertimo-nos bastante que é o mais importante e até tínhamos alguns riffs jeitosos. Usamos alguns deles nas malhas de Ladon Heads inclusive e no solo da Torture, por exemplo, se não estou em erro, foi o primeiro solo que o Rui escreveu para Warizon. Deve ter levado algumas alterações que já não me lembro a 100% como ele tocava aquilo, mas a base era daí. Quando falei com o Samu para fazermos uma banda de heavy metal tradicional, queria mesmo contar com o Rui e o António (que também tocou baixo mais para o fim de Warizon), e eventualmente eles aceitaram testar e estão aqui desde então.

 

O nome Ladon Heads tem um significado mitológico (relacionado com o dragão Ladon). Quanto desse simbolismo está presente na vossa identidade como banda?

O heavy metal mais épico liricamente está muito ligado a temas de batalhas, fantasia e mitologia. Como era deste som que nos queríamos aproximar e como as nossas letras também abordam maioritariamente este tipo de temas, fazia sentido que o nome da banda fosse de certa forma alusivo a isto. Na altura andava a ler bastante sobre mitologia grega e achei que seria fixe ter um nome relacionado com o tema – grande parte dos protagonistas principais da mitologia grega já são nomes de bandas, então acabamos por ir para um menos conhecido. A ideia era ser apenas Ladon, mas já havia e como é um dragão de 100 cabeças, adicionamos o Heads.

 

O álbum Steel For Fire teve lançamento a 17 de outubro de 2025, via Lost Realm Records. Como surgiu essa parceria com a editora e o que significa para vocês esta estreia num longa-duração?

Então, nós gravamos o álbum e perguntamos “e agora?”. Começamos a procurar labels que pudessem ter interesse em lançar e queríamos (caso conseguíssemos) que estivessem dentro do heavy metal tradicional. A Lost Realm fazia parte da lista de labels a quem íamos “mandar o barro à parede”, e não é que colou? (risos) O André gostou bastante do álbum e acabamos por chegar a acordo. Foi maravilhoso porque é uma editora que está bastante bem posicionada no mundo do heavy metal tradicional a nível internacional, tem um catálogo de bandas incrível e trabalha mesmo muito bem a nível de promoção e distribuição. Estamos muito contentes como tudo está a correr.

 

O álbum contém sete novos temas adicionados das vossas demos Master Of Sorcery e Blood Soaked Field remasterizadas. Quando surgiu a decisão de as incluir? Qual o valor que lhes atribuem?

A decisão veio exatamente das primeiras conversas que tive com o André da Lost Realm. Mencionei que tínhamos estas duas malhas que nunca tinham sido lançadas em formato físico e ainda que não estivessem incluídas na história do álbum, poderia ser interessante colocá-las como faixas bónus. Ele gostou bastante da ideia e seguimos. São malhas que ainda são importantes para nós, foi a primeira vez que lançamos algo para o mundo (risos). Ainda que em retrospetiva talvez gostasse de as ter regravado, acho que íamos conseguir uma performance melhor agora. Mas acima de tudo ficamos contentes por também estarem disponíveis em formato físico.

 

O produtor do álbum é o Lex Thunder (também dos Toxikull). Como foi trabalhar com ele e de que forma ele ajudou a moldar o som que vocês queriam?

Foi espetacular, só temos coisas boas a dizer do trabalho do Sr. Trovão. Já tinha sido ele quem produziu as demos e já aí ficamos bastante contentes com o resultado. Ele conseguiu perceber exatamente o som que queríamos e é uma pessoa que comunica mesmo muito bem. Então o processo acabou por ser muito fácil e o resultado exatamente o que procurávamos. A nível de captação de voz também foi incrível ter um dos melhores vocalistas portugueses ao meu lado. Ajudou bastante com ideias de harmonias e até acabou por mandar uns backvocals aqui e ali (risos). Esperamos voltar a trabalhar com ele num próximo lançamento.

 

Em termos de som, nota-se que o álbum tem uma produção mais crua, menos polida. Foi uma escolha artística para manter um espírito old-school?

Sim, 100%. Queríamos que isto soasse a uma produção de uma banda das que adoramos que lançou um álbum perdido algures nos anos 80 (risos). Acho que o objetivo foi atingido, ficou mesmo no ponto (a nosso ver) – não 100% cru a soar a demotape, nem demasiado polido a soar moderno.

 

Sobre as letras, é referido que alinham com o power e épico, mitologia, batalhas, fantasia. Qual foi a motivação para este tipo de temática? Há histórias ou mitos específicos que tenham inspirado letras concretas?

Nós gostamos muito de contar histórias e pessoalmente adoro quando as bandas fazem isso na sua música. É quase como escrever um livro com a soundtrack embutida, sabes? Neste álbum acabamos por contar uma história desde o Prologue até à Born In Steel imaginada por nós. Se alguém que está a ler tiver curiosidade sobre a história, temos uns pequenos posts com a história de cada música nas nossas redes que chamamos The Unveiling Of Steel For Fire. A Master Of Sorcery faz parte do mesmo universo, mas “ainda” não está ligada à história. Caso continuemos com ela em algum dos próximos lançamentos, talvez encontremos maneira de a encaixar. Já a segunda faixa bónus Blood Soaked Fields é baseada numa história da mitologia grega que trata de uma batalha entre as guerreiras Amazons e o deus Dionísio. Foi uma batalha sangrenta onde é relatado que os campos de Thermodon ficaram encharcados de sangue, daí o título super original (risos).

 

Como é o vosso processo de composição e arranjo? E como se desenvolveu esse processo entre demos e álbum?

A composição geralmente é feita de forma algo individual. Os nossos ensaios tendem a ser curtinhos e mais orientados a afinar a setlist do que propriamente a compor. Então até agora o que tem acontecido é: alguém traz uma ideia de música “mais completa” e trabalhamos em conjunto nos arranjos. Até aqui tem sido assim, agora que temos um álbum fora e as malhas que temos já estão bem ensaiadas, talvez começemos a tentar compor mais em conjunto. Mas como o tempo é curto, acho que vai ser inevitável continuar a existir uma boa parte de composição individual que depois é finalizada em conjunto. Na verdade, acho que é um método eficiente, ainda que se possa perder algum input ou ajuste que sairia em conjunto, com as limitações de tempo que temos, acaba por ser uma boa maneira de fazer as coisas na nossa “realidade”.

 

A apresentação deste álbum vai ser feita no dia 28 de novembro no Buraco Pub em Ovar. Como estão a preparar-se para tocar ao vivo com este novo material?

O material não é propriamente novo (risos)! Estamos a tocar estas músicas já há muito tempo, acho que a única que não tínhamos composta na altura do nosso primeiro concerto era a Born In Steel que é a mais recente. E mesmo essa foi estreada curiosamente no Buraco em maio do ano passado num concerto que demos lá com os Lyzzard. Acho que é algo comum nas bandas antes de lançarem o primeiro álbum, as músicas acabam por ser sempre as primeiras a serem compostas e até sair o álbum é isso que há. Dito isto, para quem não nos conhece ou nos vai ver pela primeira vez, as músicas são todas novas, e posso garantir que estão a ser melhor tocadas agora do que há dois anos (risos). Vamos tocar o álbum todo (que também não é muito grande) e talvez haja mais alguma surpresa, só saberá quem for! Acho que vai ser uma grande festa, vamos ter a companhia dos nossos amigos Raven Horse de Viseu e dos Hot Foxx de Aveiro. Convidamos desde já todos os que estiverem a ler isto a estarem presentes, vai ser uma celebração do heavy metal underground português.

 

Quais são os maiores desafios que uma banda de heavy metal tradicional enfrenta hoje em Portugal? E quais são as vantagens de estar inserido num nicho tão dedicado?

Acho honestamente que depende muito das expetativas que se têm e das pessoas que fazem parte da banda. Se o teu objetivo é ser a maior banda de heavy metal de sempre e ser alto rockstar, vais ter desafios muito maiores que os que os Ladon Heads têm. O nosso objetivo é ter uma plataforma para nos expressarmos, fazermos música que gostamos, tocar para pessoas, lançar música nova, ir a novos sítios, conhecer novas pessoas, ter novas experiências e criar memórias duradouras. Dá trabalho e exige sacrifício, mas não posso dizer que tenha sido algo difícil para nós até agora. Dito isto é importante ter os pés assentes na terra e saber que não vais escrever 10 malhas de um dia para o outro, não vais tocá-las na perfeição em 2 ensaios, o teu primeiro álbum não vai ser uma obra-prima divinal e não vais lançar um álbum de meio em meio ano enquanto tens de manter um trabalho full time, ambicionas ter vida social e ter tempo para cuidar do corpo e da cabeça. Não se pode fazer tudo a 300%. No nosso caso isto é um hobby e não deverá passar disso. Agora é um hobby que levamos a sério. Tentamos ensaiar todas as semanas; quando temos concertos, tentamos ensaiar pelo menos 2 vezes na semana anterior. Tentamos ir partilhando ideias de malhas para música nova sempre que possível. Fazemos um esforço para estarmos disponíveis sempre que nos convidam para tocar em algum lugar mesmo com algum sacrifício pessoal ou com necessidade de tirar um dia de férias ou assim. Isto exige algum sacrifício, mas vale a pena porque no fim de contas divertimo-nos a fazer isto e sentimos alguma realização com os pequenos passos que temos dado. Quanto ao contexto português, a verdade é que o heavy metal tradicional (mais especificamente o underground) não é muito popular. Mas há potencial porque as bandas gigantes do género fora do underground como Iron Maiden e Judas Priest tocam em estádios cheios e esgotam arenas. Sinto que o underground deste som também está a crescer (ainda que possa estar enviesado por estar a começar agora e estar constantemente a conhecer novas pessoas aficionadas pelo género). Ainda assim, apesar de não ser um género super popular, as pessoas que fazem parte deste nicho são bastante dedicadas e conhecem as bandas que estão a começar relativamente rápido. Nós temos sido muito bem recebidos pelos fãs do estilo bem como pelas bandas dentro da cena e sentimo-nos muito gratos por isso; tem sido um dos pontos mais especiais desta jornada.

 

Para terminar: têm alguma mensagem para os fãs que ainda não vos ouviram e que podem descobrir Steel For Fire? O que gostariam que os ouvintes retirassem da vossa música?

Queremos acima de tudo agradecer por nos darem uma chance. Esperamos que retirem uma boa meia horinha de diversão e de viagem pelo mundo épico e infernal que descrevemos nas malhas (risos).

 

Por fim, que mensagem gostarias de deixar aos nossos leitores e aos vossos fãs?

Obrigado por terem lido até aqui. Se gostarem de heavy metal e estiverem nas redondezas, apareçam no Buraco Pub em Ovar no próximo dia 28 de novembro, vai haver celebração dos Deuses do Aço juntamente com os Raven Horse e os Hot Foxx. Caso ouçam o álbum e gostem, se quiserem apoiar, ele estará disponível em CD e vinil no site da Lost Realm Records. Muito obrigado por nos receberes novamente, grande Pedro, foi um prazer!

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